Donald Trump, após uma impressionante recuperação política e uma vitória incontestável, assumirá a Casa Branca a 20 de janeiro de 2025, em meio a desafios à liderança global de Washington e com o Oriente Médio, mais uma vez, num espaço prioritário na agenda externa dos EUA. E, de início, a vitória republicana significa reforço de apoios a Israel, tentativas de retomada dos Acordos de Abraão e intensificação de combate a um antissemitismo em alta, por exemplo, em universidades norte-americanas.
“Houve obviamente alívio e satisfação em Jerusalém com a divulgação dos resultados eleitorais, a partir da percepção de que Jerusalém terá um percurso mais fácil com a presidência de Trump do que teria com a de Kamala Harris”, escreveu Herb Keinon, colunista do site Jpost, um dos mais importantes de Israel, cinco dias após a votação nos Estados Unidos.
Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel, esteve entre os primeiros a telefonar e parabenizar Trump pela vitória, segundo comunicado do gabinete israelense. O presidente Isaac Herzog, em meio à derrota democrata, descreveu o republicano eleito como “um campeão da paz e da cooperação”, e como “um grande amigo de Israel”.
Em mais uma das reações israelenses à vitória de Trump, o canal de TV 12 divulgou pesquisa segundo a qual 67% dos entrevistados se diziam “satisfeitos” com a vitória republicana.
Em seu primeiro mandato, entre 2017 e 2021, Donald Trump protagonizou momentos históricos nas relações bilaterais. Transferiu a embaixada norte-americana de Tel Aviv para Jerusalém e reconheceu a soberania israelense sobre as Colinas do Golã.
Em novembro de 2020, a Casa Branca se transformou em palco da assinatura dos históricos Acordos de Abraão, com a normalização de relações diplomáticas de Israel com Emirados Árabes Unidos e Bahrein, dois importantes aliados da Arábia Saudita. Pouco tempo depois, Marrocos e Sudão também aderiram à caravana da diplomacia, elevando, em poucas semanas, de dois para seis o número de países árabes a reconhecerem o direito à existência do Estado Judeu. Até então, apenas Egito, em 1979, e Jordânia, em 1994, haviam caminhado nessa direção.
Apesar do intenso apoio da administração Joe Biden a Israel desde o ataque terrorista do Hamas a Israel, a 7 de outubro de 2023, houve momentos de atritos e tensões entre o governo israelense e a presidência democrata. A expectativa agora é de um diálogo mais fluído, devido ao relacionamento pessoal entre Trump e Netanyahu, ainda que não seja de se descartar momentos de tensão no diálogo.
Sem entrar em detalhes, Trump disse, ao longo da campanha, esperar que Israel vença “o mais rápido possível” a guerra contra Hamas. Também declarou pretender retomar a política de “pressão máxima” sobre o regime iraniano, apoiada sobretudo em sanções econômicas às ambições atômicas de Teerã. Em 2018, Trump retirou os EUA do acordo nuclear assinado três anos antes entre potências globais e Teerã.
Sinais oriundos da campanha de Trump e dos primeiros dias pós-vitória apontam na formação de um governo apoiado em assessores com fortes credenciais pró-Israel e também na expectativa de retomada dos Acordos de Abraão, que, às vésperas da tragédia do 7 de outubro de 2023, caminhavam para embasar um reconhecimento histórico de Israel pela Arábia Saudita, líder do mundo árabe e do mundo muçulmano.
Irã e seus aliados, como Hamas, Hezbollah, Houthis do Iêmen e milícias iraquianas, buscam sabotar o avanço dos Acordos de Abraão, pois a iniciativa carrega como um de seus pilares a construção de um Oriente Médio com menos beligerância e mais apoiado em integração econômica. A monarquia saudita, liderada pelo príncipe herdeiro, Mohammed bin Salman, aposta nessa estratégia reformista, a fim de construir um novo modelo econômico doméstico e, a exemplo dos vizinhos Bahrein e Emirados Árabes Unidos, diminuir a dependência do petróleo e desenvolver novas frentes, como tecnologia, turismo, finanças, entre outras.
Trump terá pela frente o desafio de retomar os Acordos de Abraão após meses de uma tragédia imposta pelo regime iraniano e seus aliados, com os ataques terroristas, como os de 7 de outubro de 2023, pelo Hamas, ou os bombardeios, contra o norte de Israel, feitos pelo Hezbollah desde 8 de outubro daquele ano. A lista carrega ainda drones enviados por grupos baseados no Iêmen, Síria ou Iraque.
Uma das expressões usadas por integrantes da equipe trumpista é “paz pela força”, a ser usada no Oriente Médio e em outros rincões do planeta. A lógica do presidente Trump: para os EUA manterem liderança global, precisam recuperar dinamismo econômico, o que viria, no plano doméstico, por meio, por exemplo, de cortes de impostos. Tais reduções, no entanto, reduziriam receitas governamentais, a serem compensadas, entre outros mecanismos, por diminuição de gastos militares no exterior, seja no apoio à Ucrânia, no Oriente Médio ou na ajuda enviada a Taiwan. Mas, na visão trumpista, diminuição de envolvimento em conflitos externos não reduziria o poderio bélico dos EUA, a maior máquina militar do planeta, mas contribuiria para estancar drenagem de recursos importantes para modernização da economia do país. Seria, portanto, a aplicação do slogan “America First”.
No que se refere ao cenário médio-oriental, Trump sinaliza que buscará a retomada dos Acordos de Abraão, com objetivo de conseguir o reconhecimento de Israel pela Arábia Saudita e, assim contribuir decisivamente para uma região com menos beligerância e mais integração econômica e tecnológica. Em 2017, escolheu território saudita como parada inicial em sua visita inaugural ao exterior, desembarcando em Israel logo em seguida. O roteiro já descortinava as ambições diplomáticas do presidente republicano.
Preparando-se para o retorno à Casa Branca, Trump monta uma equipe composta por assessores linha dura na questão iraniana, também chamados de “falcões”, como Pete Hegseth, convidado para ser secretário de Defesa. O senador Marco Rubio recebeu convite para conduzir a diplomacia dos EUA e, oriundo dos setores mais à direita do Partido Republicano, se posiciona há tempos a favor de uma abordagem de forte pressão política e econômica sobre o Irã e suas ambições nucleares.
Na lista da nova equipe em montagem, aparece também Mike Huckabee, ex-governador de Arkansas, para ser embaixador em Israel. Escreveu Trump no comunicado sobre o novo enviado diplomático: “Ele ama Israel e o povo de Israel e da mesma forma, o povo de Israel o ama. Mike vai trabalhar incansavelmente para trazer paz ao Oriente Médio”.
Steven Witkoff, empresário e amigo de longa data do presidente eleito, será enviado especial ao Oriente Médio, enquanto a deputada Elise Stefanik foi indicada para representar os EUA junto à ONU. Declarou a parlamentar: “O trabalho que temos pela frente é imenso porque vemos o antissemitismo disparar, junto com quatro anos de liderança catastroficamente fraca dos EUA, que enfraqueceu significativamente nossa segurança nacional e diminuiu nossa posição aos olhos de aliados e adversários”.
Stefanik também ganhou projeção global ao confrontar, de maneira incisiva em sessões parlamentares, líderes de universidades norte-americanas sobre as manifestações e ações antissemitas ocorridas em alguns campi nos últimos meses. A deputada critica ainda abertamente a forma como as Nações Unidas tratam Israel, ao se transformarem muitas vezes em ferramentas para implementação de políticas anti-israelenses.
Jaime Spitzcovsky colaborador da Folha de S.Paulo, foi correspondente do jornal em Moscou e em Pequim.