Centro da vida judaica da ilha de Djerba, a alguns quilômetros da costa da Tunísia, El Ghriba é a sinagoga mais antiga desse país e provavelmente de toda a África. Hoje, os 1.100 judeus que vivem na localidade são praticamente tudo o que resta da outrora numerosa e próspera comunidade tunisiana.

Os judeus de Djerba têm uma história rica em lendas e tradições. Os primeiros, de acordo com uma das narrativas, chegaram à ilha durante o reinado de Salomão, em Israel. Conta-se ainda que, ao fugirem de Jerusalém devido à invasão e destruição – da cidade e do Primeiro Templo Sagrado pelos exércitos de Nabucodonosor II, em 586 a.E.C., alguns Cohanim (sacerdotes) levaram consigo uma pedra do Templo arrasado. Após uma longa viagem, estabeleceram-se em Djerba e lá ergueram uma casa de orações e estudos cuja pedra fundamental foi o precioso resquício. A sinagoga El Ghriba está situada nesse mesmo local e, até hoje, acendem-se velas no chão do edifício, sobre uma pedra que provém do Templo Sagrado de Jerusalém.

No início do século 20, Nahum Slouschz, escritor e arqueólogo israelense que visitou Djerba, descreveu a sinagoga como um “prédio quadrado, bastante sóbrio”, totalmente reformado e ampliado na década de 1860 ou 1870. Foram feitas novas melhorias no século seguinte, nos anos 1920 e 1930.

Em termos arquitetônicos, El Ghriba reflete o estilo das construções tunisianas com exterior simples e muros revestidos de cal branca. O interior da sinagoga tem um aspecto mourisco, com paredes recobertas de azulejos brancos e azul-turquesa, pintados à mão. No fundo do recinto, encontra-se o Hechal ou Aron Hakodesh (Arca Sagrada), que, voltado na direção de Jerusalém (Nordeste), abriga os Rolos da Torá. Um dos costumes é colocar pequenos papéis com pedidos dirigidos ao Todo Poderoso nas fendas das portas do Hechal. Fora do edifício, há um amplo pátio no qual, nos anos 1950, foi construído um novo albergue (oukala), para acomodar os judeus vindos de outros lugares.

Embora seja expressiva a presença judaica na ilha, a comunidade local, a segunda maior em atividade no mundo árabe, tem cerca de 1.100 pessoas. A maioria das sinagogas não está em funcionamento. De fato, El Ghriba não é mais usada para orações semanais e só volta a lotar em Lag BaOmer, quando milhares de pessoas, judeus ou não, participam de uma festividade de quatro dias. A tradição começou provavelmente no início do século 19 ou até antes.

Nessa ocasião, no 33º dia da Contagem do Omer, as comunidades judaicas de todo o mundo, não apenas a de Djerba, homenageiam o Rabi Shimon bar Yochai (o Rashbi) no aniversário da morte dele. Um dos maiores Sábios talmúdicos e místicos, Rabi Shimon bar Yochai é autor do Zohar, a obra fundamental da Cabalá. No dia de seu falecimento, o Rashbi revelou a seus discípulos profundos ensinamentos místicos e pediu-lhes que comemorassem a data como uma ocasião de alegria.

Todos os anos, milhares de judeus, sobretudo da França e de Israel, reúnem-se para Lag BaOmer em Djerba, onde um dos costumes, durante a festividade, é enfeitar a “grande Menorá” de El Ghriba com lenços de seda. Em seguida, os fiéis levam a Menorá pelas ruas da ilha até as outras sinagogas. O desfile, semelhante aos realizados durante os casamentos judaicos na localidade, destina-se a celebrar a aliança mística do Povo de Israel com D’us.

Em 11 de abril de 2002, um atentado terrorista abalou a comunidade de Djerba, bem como o mundo judaico. Um ramo da Al-Qaeda na Tunísia assumiu a responsabilidade pelo ato de violência. Desde então, as autoridades do país priorizam a segurança na ilha para torná-la mais segura.

No entanto, em 9 de maio de 2023, um guarda naval tunisiano de um centro marítimo da cidade de Aghir, em Djerba, cometeu outro atentado. De acordo com o Ministério do Interior do país, o terrorista primeiro usou sua arma para assassinar um colega, de cuja munição se apoderou. Em seguida, dirigiu-se a El Ghriba, local das festividades de Lag BaOmer, e abriu fogo contra a multidão. Com isso, matou dois judeus franco-israelenses e um policial. As forças de segurança então atiraram, eliminando o terrorista.

A sinagoga El Ghriba sempre foi motivo de orgulho para a comunidade judaica da Tunísia, incluindo aqueles de seus membros que vivem fora desse país. O governo tunisiano reconhece a importância turística de Lag BaOmer e procura separá-lo de sua política em relação a Israel, com o qual não mantém relações diplomáticas.

Apesar das preocupações com segurança resultantes dos ataques terroristas recentes, milhares de judeus ainda viajavam para Djerba uma vez por ano para participar de Lag BaOmer. Contudo, desde 7 de outubro de 2023, quando milhares de terroristas do Hamas invadiram o sul de Israel a partir de Gaza, mataram cerca de 1.200 pessoas e fizeram mais de 250 reféns, há protestos violentos na Tunísia, de maioria muçulmana, contra o Estado e o Povo Judeu. Em vista disso, o evento na ilha atraiu menos turistas judeus este ano.

Esses ataques, justamente em um país que abriga uma das maiores comunidades judaicas remanescentes no Norte da África, ocorrem em um contexto de avanço acelerado do antissemitismo em todo o mundo. Mais grave ainda, representam um preocupante retrocesso de uma rara coexistência entre judeus e muçulmanos em um país árabe que não mantém relações com Israel. Na comunidade judaica tunisiana, a maior parte da qual vive na ilha de Djerba, muitos já repensam seu futuro na região.