Um homem bom e justo, um dos principais banqueiros do Brasil, um grande filantropo que serviu de inspiração para toda uma geração.
No dia 15 de junho de 2014 a comunidade judaica de São Paulo perdeu um dos seus principais pilares, fundador de importantes instituições; o mundo das finanças perdeu uma importante personalidade e o mundo da benemerência judaica e não judaica perdeu uma alma nobre, um homem generoso, sempre disposto a apoiar as causas dignas e a atender os que necessitassem de sua ajuda. Moise deixa uma grande lacuna ou, como diria Rabi Nachman de Bratislav, “uma Cadeira Vazia”.
Nascido em Beirute, Líbano, Moise era o quinto dos oito filhos de Jacob E. e Esther Safra. Seu pai nasceu em Alepo, em 1891, na Síria, então parte do Império Otomano. Ali vivia uma florescente e estável comunidade judaica, com instituições culturais, educacionais e religiosas sólidas, integrada economicamente à sociedade síria. Nos anos de 1920, Jacob E. foi enviado a Beirute, onde se estabeleceu. Casou-se com sua prima Esther e tiveram oito filhos: Elie, Eveline, Edmond, Arlette, Moise, Huguette, Gaby e Joseph. Na cidade onde constituiu família, Jacob E. foi um grande benemérito e um dos líderes comunitários, exemplo seguido pelos seus descendentes, que se espalharam pelo mundo.
Na década de 1950, como consequência do cenário político no Líbano decorrente da independência do Estado de Israel, a família Safra deixou o país rumo à Itália. Essa não foi a última parada do clã, que começou a se espalhar pelo mundo. Em 1954, três filhos de Jacob E., Edmond, Moise e Joseph, escolheram o Brasil para recomeçar a vida, constituir família e erguer um dos grupos empresariais mais sólidos do País, com ênfase no setor bancário. No início, Moise trabalhou no ramo de importações e exportações, mas, em 1957, a família Safra formou uma financeira que viria a se tornar o Banco Safra e fundou a Filobel, uma das maiores indústrias têxteis do país.
Em 1969, Moise casou-se com Chella Cohen e teve cinco filhos: Jacob, Azuri, Edmundo, Esther e Olga. Apesar dos inúmeros negócios, obrigações sociais e comunitárias, Moise e Chella sempre dedicaram tempo à sua família, a seus filhos, genros, noras e netos. Eles sempre foram sua prioridade.
Em 1998, ele fundou um Family Office, M. Safra & Co., com sede em Nova York e São Paulo, independente do império bancário familiar. Em 2006, Moise vendeu sua parte ao irmão Joseph e começou a diversificar seus interesses comerciais.
Em 2012, Moise comprou o prédio comercial Plantantion Place, em Londres, e, em 2013, em parceria com a gigante chinesa Zhang Xin, adquiriu 40% de participação no edifício General Motors, em Manhattan, Nova York.
Atuação comunitária
O nome Safra está inserido na história da comunidade judaica paulista em suas mais diversas manifestações – educação, assistência social, saúde, cultura. Com seus irmãos Edmond e Joseph, Moise foi, em 1959, um dos fundadores da Congregação Beneficente Sefardi Paulista, conhecida como Beit Yaacov. A primeira Sinagoga da Beit Yaacov está localizada na rua Bela Cintra. Como presidente da instituição durante anos, acompanhou de perto o seu desenvolvimento e fortalecimento, a fundação de novas sinagogas, como a sinagoga do Guarujá, a Beit Yaacov Veiga Filho, bem como o crescimento do Netzah, seu movimento juvenil. Foi também um dos fundadores da Escola Beit Yaacov.
Não havia projeto comunitário de que não participasse, junto com sua esposa Chella, não apenas em São Paulo e Rio de Janeiro, mas em todo o Brasil e no exterior. Em Nova York, Miami ou Israel, Moise não limitou sua atividade filantrópica às comunidades judaicas.
Chella e Moise Safra estão entre os principais mantenedores do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Em 2010, a instituição inaugurou um sofisticado auditório com seu nome. O casal esteve envolvido na reforma da unidade neonatal do Hospital São Paulo, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), para a ampliação de sua estrutura e instalação de novos equipamentos.
Conhecido por fazer doações regulares no Brasil e no exterior, Moise jamais esqueceu suas raízes familiares na Síria, apesar de nunca ter vivido no país. Em homenagem ao seu passado, destinou recursos para a construção de um centro comunitário para judeus oriundos da Síria em Nova York. Com previsão de inauguração no final de 2014, o projeto será nomeado Centro Comunitário Moise Safra.
Foram muitas as outras obras em que o casal esteve envolvido além das mencionadas. Durante a Mishmará, os rabinos afirmaram que é difícil enumerar os inúmeros atos de bondade que Moise realizou durante sua vida.
O rabino Efraim Laniado disse que quando a pessoa termina sua missão na Terra, D’us manda os anjos ao mundo para ouvir o que dizem sobre a pessoa. E não houve quem não falasse belas coisas sobre Moise. Lembrou-se, também, de uma ocasião quando ele lhe telefonou para dizer que chegara ao seu conhecimento que alguns judeus no Rio passavam necessidade e ele queria enviar ajuda aos mesmos. Já o rabino David Y. Weitman disse: “No mundo atual, onde os perigos do sucesso são óbvios, tais como egocentrismo, perda de autenticidade e sensibilidade, Moise Safra conseguiu manter intactos os valores milenares judaicos aprendidos com seu pai, Jacob E. Safra. Grande filantropo e mecenas ele atendia a todos com seu coração generoso. Ele estava ciente de que D’us o contemplara com riqueza para que ele pudesse ajudar os outros em sua volta, e fazer do mundo um lugar melhor”.
Todos os que o conheciam sabiam que Moise era um homem que não se contentava apenas em doar, mas sabia ouvir, sentia empatia pelo sofrimento alheio e, junto com sua esposa, se envolvia nos problemas das pessoas, sempre encorajando os necessitados e procurando soluções. Ele costumava visitar doentes no hospital, fossem eles amigos ou apenas conhecidos. Ajudava jovens com poucas condições financeiras a estudar e a se casar.
Azuri, seu filho, relatou em um discurso emocionado em nome de toda família na cerimônia da Mishmará, como seu pai lhe ensinara, quando ele era ainda uma criança de apenas 8 anos, que quando queremos ajudar alguém, devemos nos antecipar em atender suas necessidades. Ele lembrou que, numa ocasião, quando saíam juntos da sinagoga, viram uma senhora humilde que havia chegado a São Paulo, vinda do Norte, e estava perdida. Tinha nas mãos um pedaço de papel com o número do telefone de um parente. Mas ela não sabia usar um orelhão. Sem fichas para usar o telefone, Moise deu-se o trabalho de ir até um bar e comprou uma ficha, ligou para o número que a senhora tinha e mandou chamar seu parente. Então, o filho lhe perguntou por que se dera todo aquele trabalho para uma pessoa humilde e desconhecida. Ao que Moise lhe respondeu que era fácil fazer favores para um rei, mas o difícil era ajudar uma pessoa simples...
Moise foi um homem que sempre se manteve fiel às leis e tradições judaicas, sendo mesmo a personificação do mais importante mandamento do judaísmo: a prática de atos de bondade, generosidade e caridade. Rabi Moshe ben Maimon, Maimônides, o maior filósofo judeu e um dos principais legisladores da Lei Judaica, escreve que há oito níveis de Tzedaká – cada um maior do que o outro. O nível mais alto de todos – o insuperável e de maior valor – é ajudar alguém que esteja passando por dificuldades financeiras, para que ele possa se restabelecer e não mais ter que depender dos outros. Esse grau de Tzedaká se manifesta de diferentes formas: emprestar dinheiro ao necessitado, convidá-lo a participar de algum negócio ou ajudá-lo a encontrar trabalho. Moise cumpriu esse e os demais graus superiores do mandamento e o fez da melhor forma possível – com o máximo de discrição – preservando a dignidade das outras pessoas.
Ensinam os nossos sábios que todo ato de bondade que um ser humano realiza cria um anjo para si e que todos os anjos criados acompanham sua alma quando ele sai da dimensão terrestre e adentra o Mundo Superior. Não há dúvida de que uma enorme legião de anjos recebeu Moise Safra no dia em que ele retornou sua alma ao Criador. Todas as bênçãos das quais ele usufruiu na Terra foram apenas um vislumbre das recompensas eternas e imensuráveis que o aguardam no Mundo da Verdade.
Manifestações
Para Cláudio Lottenberg, presidente do Hospital Albert Einstein, “Moise era uma pessoa dotada de uma sensibilidade instintiva, para quem a palavra amor era um exercício do cotidiano. Ele conseguia conciliar a visão de um empresário com a de um humanista. É uma perda muito grande. Moise era um grande doador do Einstein e eu o considerava meu conselheiro. Muitas vezes conversei com ele sobre questões do Hospital e ele nos apoiava em todas as nossas obras”.
“Moise Safra deixa um legado importante para o sistema financeiro nacional e internacional”, disse Roberto Setubal, presidente do Itaú Unibanco.
Para Lázaro de Mello Brandão, presidente do Conselho de Administração do Bradesco, “Moise foi um dos mais respeitados nomes do mundo das finanças nacional e internacional. Acreditou e investiu no Brasil, representando a melhor tradição do setor bancário brasileiro”.
“Pessoas do mundo inteiro têm feito declarações sobre seu papel no setor financeiro, sobre suas contribuições. Amigos mais próximos compartilham lembranças e atributos pessoais que fizeram dele uma pessoa maravilhosa. Nesse momento, só posso pensar nele como meu irmão querido, com o qual compartilhei durante toda a vida momentos felizes, sucessos e dores. É muito difícil descrever o sentimento de perder um irmão. A perda de meu irmão Moise deixa um vazio em meu coração”. Joseph Safra
Por ocasião do seu 75o aniversário, sua esposa, filhos, noras, genros e netos lhe fizeram uma linda homenagem, em que disseram:
“Moise Safra, um grande homem, um grande marido, pai e avô está sempre em nosso coração. Obrigado por fazer parte de nossas vidas. Sua história é um exemplo para todos nós. Você é um mestre na arte de viver, suas palavras são sempre sábias e carinhosas, seu lema é honestidade e sensatez, sua compaixão com o próximo sempre nos emocionou. Você sempre usou justiça e respeito em suas decisões, seu olhar sempre verdadeiro e amoroso, seu sorriso contagiante iluminado, a vida inteira nos ensinou e cativou com seu jeito humilde e grandioso de ser. Este é o seu legado”.