Um projeto para refletir a intensa vivência comunitária e religiosa de uma coletividade. Com essa perspectiva, concebemos o livro -Sinagogas do Brasil-, recentemente publicado pelo Instituto Cultural Safra e resultado de um trabalho de cerca de quatro anos.

Os números da iniciativa revelam sua amplitude: ao longo de 200 páginas, há imagens de 100 sinagogas, feitas pelo fotógrafo Niels Andreas. Foram percorridos mais de 30 mil quilômetros, cruzando o território nacional, de Manaus a Porto Alegre. Registraram-se mais de 20 mil fotos. Num desafiador trabalho de edição que contou com a valiosa e fundamental participação da equipe do Instituto Cultural Safra, selecionamos as principais imagens, com o intuito de oferecer um amplo panorama fotográfico e jornalístico da sinagoga, instituição central da vida comunitária. Ela, ao longo da milenar história de nosso povo, "transformou-se numa fortaleza capaz de se erguer nos mais distantes rincões do planeta, com o objetivo de proteger, estimular e consolidar a fé e valores judaicos". Tal descrição faz parte do meu texto de introdução. Além de glossário, o livro oferece ainda um denso artigo intitulado "A Sinagoga - Um Espaço de Continuidade", escrito por Mônica Unikel-Fasja. O texto, originalmente publicado na obra "Sinagogas de México", foi gentilmente cedido pela Fundación Activa, AC, do México.

A idéia de produzir um mosaico de imagens de nossas sinagogas surgiu pouco tempo depois de Niels Andreas e eu realizarmos uma viagem pelo Oriente Médio.

Em 1998, trabalhávamos na Folha de S. Paulo e fomos enviados a Israel e países vizinhos para produzir um suplemento especial dos 50 anos de independência do Estado judeu. Após voltarmos do intenso périplo jornalístico, começamos a rascunhar novos projetos de trabalho conjunto. Rapidamente, "Sinagogas do Brasil" tornou-se nossa prioridade, e fomos acolhidos pelo Instituto Cultural Safra, que propiciou as condições para viabilizar a ambiciosa iniciativa.

Com o fundamental auxílio de instituições como a Confederação Israelita do Brasil (Conib) e as federações israelitas espalhadas pelos estados brasileiros, conseguimos elaborar uma lista de sinagogas. Contabilizamos, ao todo, mais de 110 sinagogas, praticamente metade delas em São Paulo, cidade com maior concentração de população judaica do país. Partimos depois para o árduo trabalho de agendar as visitas e produzir as imagens.

Confirmamos, no cenário brasileiro, uma tradição histórica: não existe um estilo arquitetônico único para as sinagogas. Elas refletem o momento vivido por uma determinada comunidade, como as características geográficas e culturais do meio onde ela se insere combinadas com tradições carregadas por aquela coletividade na Diáspora. Por exemplo, no Rio de Janeiro, sinagogas combinam a necessidade de conviver com o calor típico da cidade com tradições provenientes da longínqua Europa oriental. Do alto da sua experiência fotografando mais de uma centena de sinagogas, opina Niels Andreas: "Nenhuma sinagoga é igual à outra, embora elas sejam compostas sempre pelos mesmos elementos, como rolos da Torá, menorot, entre outros".

Além de se propor a mostrar um ponto focal de nossa vida comunitária, o projeto "Sinagogas do Brasil" carregou a intenção de colaborar com a preservação da memória da comunidade judaica. "Acho que ajudamos a registrar e a guardar um momento de nossa vida no Brasil, colocando em imagens e, portanto, imortalizando, do ponto de vista do registro histórico, um cenário onde se desenvolve parte significativa do dia-a-dia dos judeus em nosso país", afirma Niels Andreas.

O livro, concebido como uma iniciativa de descrição jornalística, não mergulha em análises arquitetônicas ou na história de cada uma das sinagogas. Seus textos buscam explicar, em rápidas pinceladas, a origem e a função da sinagoga, assim como um pouco de sua trajetória no Brasil, relatando momentos dessa parte da vida comunitária, como a fundação da primeira sinagoga das Américas, a "Kahal Zur Israel", em Recife, no ano de 1637.

Optamos também por evitar imagens de pessoas. Decidimos que o foco do trabalho se concentraria na sinagoga, em seus elementos e em seus detalhes. Esperamos, depois de um extenso trabalho, poder propiciar aos leitores uma enriquecedora viagem por uma instituição que nos acolhe, inspira e acompanha há tanto tempo: nossas sinagogas.

- O jornalista Jaime Spitzcovsky é editor do site www.primapagina.com.br. Foi editor internacional e correspondente em Moscou e em Pequim.