O tema das Sefirot é um dos alicerces da Cabalá. As Sefirot são as emanações por meio das quais D’us Infinito, ou Ein Sof, criou, sustenta e interage com nosso mundo, finito. Os textos místicos judaicos costumam descrever as Sefirot como a Árvore da Vida, ou Etz Chaim, em hebraico. A Árvore da Vida é um diagrama de dez componentes, sendo que cada um deles representa uma das Sefirot.

Três das dez Sefirot são intelectuais e sete, emocionais. As emanações intelectuais são Chochmá (Sabedoria), Biná (Compreensão) e Da’at (Conhecimento). Há ainda uma décima-primeira Sefirá, Keter (Coroa), que detém a posição mais elevada na Árvore da Vida e simboliza a conexão mais profunda com D’us. No entanto, se Keter for contabilizada entre as dez Sefirot, tem-se que omitir Da’at, uma vez que a tradição cabalista determina que as Sefirot sejam dez, e não 11.

Na Etz Chaim, Árvore da Vida, abaixo das três Sefirot intelectuais, vêm as sete emocionais: Chessed (Amor), Guevurá (Força), Tiferet (Beleza), Netzach (Vitória), Hod (Glória), Yessod (Fundamento) e Malchut (Realeza).

Em sua totalidade, as dez Sefirot correspondem aos Dez Pronunciamentos Divinos, por meio dos quais D’us criou o mundo, e aos Dez Mandamentos, que constituem o núcleo das 613 Mitzvot da Torá. As sete Sefirot emocionais se correlacionam com os sete dias da semana – cada um dos quais é essencialmente caracterizado por uma Sefirá diferente.

As primeiras seis Sefirot emocionais

A primeira Sefirá emocional é Chessed (também conhecida como Guedulá, “grandeza”) – que é expressa por atos de amor, bondade e generosidade. A Sefirá de Chessed é a força da expansão, caracterizada pela doação espontânea, e corresponde ao primeiro dia da semana judaica – o domingo. Como, de acordo com a Torá, um novo dia se inicia ao cair da noite (V. Gênesis 1:5), a semana judaica se inicia ao anoitecer do sábado (após o Shabat) e termina ao anoitecer do domingo. A Torá nos ensina que no primeiro dia da Criação D’us disse: “Haja luz! e houve luz” (Gênesis 1:3). A luz, em todas as suas formas, simboliza a bondade e a benevolência de D’us, refletindo as qualidades de Chessed. Assim sendo, o domingo, primeiro dia da semana judaica, incorpora a energia e os atributos da primeira Sefirá emocional.

A segunda Sefirá emocional, Guevurá (ou Din, “julgamento”), é a força oposta e equilibradora de Chessed. A disciplina, o julgamento e a restrição são manifestações de Guevurá. Chessed doa, ao passo que Guevurá retém. Chessed é bondade e Guevurá é justiça. Segundo os ensinamentos cabalísticos, a segunda-feira, segundo dia da semana judaica, é associada à Guevurá. A Torá ensina que no segundo dia da Criação, D’us separou as águas, criando uma separação entre as águas acima do firmamento e as águas abaixo do mesmo, refletindo as qualidades de Guevurá.

A terceira Sefirá da emoção, Tiferet, se traduz como “beleza” e atua como uma força harmonizadora, constituindo um caminho intermediário entre as energias opostas de Chessed e Guevurá. Tiferet personifica o equilíbrio, a compaixão e a paz. D’us criou a vegetação, as plantas que produzem sementes e as árvores frutíferas no terceiro dia da Criação, que corresponde ao terceiro dia na semana judaica. O surgimento de uma vida equilibrada e harmoniosa no terceiro dia da Criação faz eco às qualidades inerentes a Tiferet.

Netzach, a quarta Sefirá emocional, traduz-se por “vitória” ou “eternidade”. Representa as qualidades de perseverança e determinação necessárias para superar os desafios. D’us criou o Sol, a Lua e as estrelas no quarto dia da Criação. A longevidade das estrelas, a energia gerada pelo Sol e os padrões consistentes dos corpos celestes criados no quarto dia espelham as qualidades de Netzach.

Hod, a quinta Sefirá da emoção, é traduzida como “glória” ou “esplendor” e serve para contrabalançar Netzach, de modo semelhante à ação de Guevurá como contrapeso para Chessed. Netzach denota vitória, imposição e supremacia, ao passo que Hod significa submissão, aceitação e humildade. No quinto dia da Criação, D’us criou as aves e os peixes. A existência e comportamentos típicos dessas criaturas, que se submetem às leis da Natureza, espelham as qualidades de Hod. Ademais, a estonteante diversidade de pássaros e peixes, com suas inúmeras cores e formatos, exibe de forma magnífica o esplendor da Criação.

A sexta Sefirá da emoção, Yessod, se traduz como “fundamento”. Tem uma função central na Árvore da Vida pois direciona a energia Divina das Sefirot que a precedem, para a Sefirá final, Malchut – que corresponde à existência física.

O sexto dia da Criação é muito significativo pois foi quando D’us criou os animais terrestres e o ser humano. De forma análoga à função de Yessod como fundamento e conduíte para a energia Divina em direção ao mundo, a criação do homem detém um lugar fundamental no projeto Divino para o reino material. Os seres humanos servem de ponte entre os mundos espiritual e material e, por meio de suas ações, intenções e conexões, eles canalizam e manifestam a energia Divina no mundo, de forma semelhante ao papel de Yessod no sistema das Sefirot.

Malchut é a décima e última Sefirá da Árvore da Vida. Entre as sete Sefirot emocionais, constitui a sétima. A palavra Malchut, em hebraico, se traduz como “reino” ou “realeza”. Malchut é singular entre todas as Sefirot pelo fato de ser passiva: não produz luz ou energia. Mas, por outro lado, absorve o total das influências coletivas das demais Sefirot – todas elas ativas – sintetizando-as e as manifestando em nosso mundo.  

A Sefirá de Malchut

Malchut, a mais baixa dentre todas as Sefirot na Árvore da Vida, é associada ao mundo físico. Todas as Sefirot que a precedem são abstratas, representando o planejamento ou a fase energética da ação Divina. Malchut, por sua vez, constitui a fase da execução na qual o abstrato se materializa. A beleza da natureza, os detalhes complexos e minuciosos da vida e a própria existência do universo são manifestações de Malchut. Fazendo-se uma analogia: se as outras nove Sefirot representam as ideias e emoções que precedem a criação de um objeto de arte, Malchut seria a obra já completa – algo que pode ser visto, tocado e diretamente vivenciado.  Se as demais nove Sefirot nos ajudam a entender os atributos Divinos, a Sefirá de Malchut ilustra de que forma esses atributos se materializam e influenciam nossa vida. Malchut é o reino em que a Vontade Divina, com todas as suas miríades de potenciais e energias, torna-se tangível e efetivada.

A Sefirá de Malchut é intimamente relacionada à Shechiná – a Presença Divina neste mundo. A raiz da palavra Shechiná é formada por três letras hebraicas – Shin (ש), Khaf (כ), e Nun (נ) – e tem o sentido de habitar ou residir. E simboliza a imanência Divina: a maneira como a Presença Divina é diretamente sentida e vivenciada no mundo. A Sefirá de Malchut e a Shechiná são conceitos interconectados na Cabalá: Malchut é o momento crucial em que as energias Divinas abstratas se transformam em experiências tangíveis, formando o conduíte para que possamos vivenciar a Presença Divina – ou seja, a Shechiná – neste nosso mundo. Através de Malchut, a Shechiná Se manifesta na Terra, notadamente em lugares sagrados como na Terra de Israel e, ainda mais, na cidade sagrada de Jerusalém e no Beit HaMikdash – o Templo Sagrado.

Malchut e o sétimo dia da semana

Malchut, a sétima Sefirá da emoção, corresponde ao sétimo dia da semana judaica – Shabat Kodesh, o sagrado Shabat. O fato dessa Sefirá ser passiva – uma característica singular de Malchut – esclarece a linguagem metafórica na Torá ao descrever os sete dias da Criação. A Torá afirma:  “E D’us terminou no sétimo dia toda a obra que fizera e Ele descansou no 7o dia” (Gênesis 2:2). Não há como contestar o fato de que a Torá emprega uma linguagem figurativa ao descrever a Criação, pois um D’us Infinito e Onipotente não despende qualquer esforço nem tampouco necessita descansar. Além do mais, os conceitos de tempo e espaço, interrelacionados segundo a Teoria da Relatividade de Einstein, aplicam-se apenas ao mundo físico – e não a D’us Infinito, que antecede e transcende toda a Criação, tendo criado todo o Universo ex nihilo – do nada. Para os habitantes da Terra, um dia significa um dia solar – a duração necessária para que o planeta Terra complete uma rotação sobre seu eixo relativa ao Sol. Mesmo uma interpretação literal da Torá revela que os sete dias da Criação não poderiam ter sido dias terrestres. Como a Torá relata que D’us criou o Sol e os demais corpos celestes apenas no quarto dia da Criação, é evidente que os primeiros três dias, por anteceder a existência do Sol, não podiam ter sido dias solares. E como a Torá não menciona uma diferença na duração dos dias que antecedem a criação do Sol e os que se seguiram, fica evidente que os Sete Dias da Criação não foram dias solares de 24 horas cada.

A Torá usa uma linguagem figurativa para descrever o processo da Criação pois, como ensina o Talmud, “A Torá se expressa na linguagem do homem” para permitir que qualquer pessoa possa estudá-la. Se a Torá tivesse descrito a Criação na linguagem cabalista do Zohar ou da forma como o fazem os cosmólogos, poucas pessoas a entenderiam. A Torá é repleta de metáforas – ainda que isso represente o risco de que muitos a entendam literalmente, o que facilmente pode levar a blasfêmias ou ao ridículo. A Criação, que constitui um dos maiores mistérios da Torá, não foi um processo no qual D’us trabalhou durante seis dias de 24 horas e, então, decidiu descansar. A metáfora do trabalho Divino durante seis dias criando o mundo e, então, descansando no sétimo simboliza a construção do Universo através das sete Sefirot emocionais. Seis delas são ativas, correspondendo à descrição da Torá acerca do “trabalho Divino”, ao passo que a sétima, Malchut, é passiva, numa referência metafórica ao “descanso Divino”.

O fato de Malchut ser a Sefirá predominante no Shabat nos fornece uma explicação acerca do fato de o sétimo dia da semana judaica ser designado como um dia de descanso. Única Sefirá passiva, Malchut recebe as luzes Divinas das Sefirot que a precedem, todas elas ativas. De modo semelhante, o Shabat, dia do descanso e receptividade, ou acolhimento, serve como um receptáculo para as bênçãos geradas durante os seis dias de trabalho que o precedem. 

É importante ressaltar que a Mitzvá de descansar no Shabat não implica em ociosidade, trivialidades ou em passar o dia inteiro dormindo. De fato, muitos de nossos Sábios optavam por ficar despertos durante todo o Shabat – noite e dia – para maximizar cada momento desse dia sagrado. Descansar no Shabat significa se abster de 39 categorias de trabalho (melachot) e suas subcategorias, como detalha o Talmud – base da Lei Judaica – e se dedicar à oração, ao estudo da Torá e a prazeres físicos imbuídos de espiritualidade. Uma das várias formas em que o Shabat reflete a Sefirá de Malchut é por meio da harmonização dos reinos físico e espiritual. A Torá nos ordena desfrutar de deleites físicos – desde que permitidos pela Lei Judaica – nesse dia sagrado pelo fato de o Shabat os infundir com santidade, espelhando o papel da Sefirá de Malchut como nexo entre o mundo físico e o Divino.

Como explicamos acima, os ensinamentos cabalísticos associam a Shechiná – Presença Divina na Terra – com Malchut, representando a imanência Divina em contraste com Sua transcendência. Apesar de sua ocorrência semanal, a santidade do Shabat ultrapassa a de todas as festas sagradas do Judaísmo – até mesmo Yom Kipur. A suprema santidade do Shabat se deve à revelação sem paralelo da Shechiná que ocorre semanalmente, no sétimo dia da semana judaica. O Shabat representa para o tempo o mesmo que o Beit Hamikdash, Templo Sagrado de Jerusalém, representa para o espaço: uma elevada expressão da Presença Divina no mundo físico.

Malchut: veículo para as bênçãos Divinas

Zeir Anpin, ou “pequena face” em aramaico, é um termo usado na Árvore da Vida da Cabalá para representar as seis Sefirot emocionais ativas: Chessed, Guevurá, Tiferet, Netzach, Hod e Yessod. A Cabalá nos ensina que Zeir Anpin é o elemento masculino na Criação. A sétima Sefirá emocional, Malchut, canaliza a energia Divina que recebe de Zeir Anpin para o mundo físico. Malchut constitui o elemento feminino na Criação. A interação entre Zeir Anpin e Malchut, geralmente examinada através das lentes do relacionamento homem-mulher, nos ajuda a entender a dinâmica dos mundos físico e espiritual.

O relacionamento entre Zeir Anpin e Malchut é uma das explicações cabalísticas para o ensinamento talmúdico de que o Shabat é a origem de todas as bênçãos para os seis dias da semana que o seguem. A ideia de que um dia de descanso é o dia que mais consequências traz na semana parece ser paradoxal. Mas o fato de Malchut ser uma Sefirá passiva – pois não cria luz nem energia – não significa que não tenha influência. Malchut exerce um papel crucial na estrutura e dinâmica das Sefirot, já que absorve e amalgama os poderes das Sefirot precedentes – todas elas ativas – para então manifestá-las em nosso mundo. 

O relacionamento entre Zeir Anpin e Malchut – entre os seis dias seculares da semana e o sagrado Shabat – é semelhante ao solo que recebe sementes e as alimenta de modo a produzirem algo muito maior e mais complexo. Assim como o solo, ainda que receptivo, é crucial para o desabrochar das plantas, também Malchut, apesar de passiva, é essencial para manifestar a energia Divina no mundo. O entendimento desse processo de receber, amalgamar e gerar mais do que o que foi absorvido é vital para se entender a Sefirá de Malchut e, portanto, o propósito essencial do Shabat.

Malchut é como um receptáculo vazio que recebe e contém energias Divinas das demais Sefirot. Segundo a Cabalá, esse vazio é um pré-requisito para receber as bênçãos Divinas. Assim como um copo vazio possui maior capacidade de receber líquido, o fato de a Sefirá de Malchut não possuir luz e energia próprias é o que permite que elaabsorva, integre e manifeste as energias das Sefirot que a antecedem. Portanto, o vazio de Malchut, que corresponde ao fato de Shabat ser o dia de descanso, é proposital e indispensável. Esse conceito contraintuitivo desafia a sabedoria convencional de que a passividade é negativa. O estudo das Sefirot emocionais revela que em determinadas circunstâncias e ocasiões, o vazio é essencial, constituindo um catalizador necessário para a produção da vida e bênçãos.

A natureza passiva da Sefirá de Malchut, refletida na cessação de trabalho no sagrado dia de Shabat, exemplifica um ensinamento central no Judaísmo: humildade e receptividade são essenciais para a geração de vida e de todos os tipos de crescimento, inclusive o intelectual e espiritual. Como diz a Torá, Moshé Rabenu, o maior profeta e líder na história judaica, era o mais humilde dos homens de todos os tempos. Tanto o Talmud quanto a Cabalá, que representam, respectivamente, as facetas exotérica e esotérica da Torá, ensinam que o despojo de desejos egoístas e autocentrados torna-nos receptáculos abertos às bênçãos e à influência Divina, e espelham a maneira pela qual Malchut recebe e expressa as energias das Sefirot que a precedem.

Lechá Dodi e a Sefirá de Malchut

Lechá Dodi é um poema litúrgico recitado pelas comunidades judaicas mundo afora durante o serviço de Cabalat Shabat (o recebimento do Shabat). Composto por um proeminente cabalista e poeta do século 16, o Rabino Shlomo Halevi Alkabetz, que vivia na mística cidade de Tzfat (Safed), em Israel, o Lechá Dodi é rico em simbolismo cabalista. O poema encapsula duas bases fundamentais do Judaísmo: a santidade do Shabat, que representa Malchut na dimensão de tempo, e o caráter sagrado de Jerusalém, simbolizando Malchut no espaço.

Jerusalém, epicentro espiritual do mundo, é o local onde os reinos celestial e terrestre se cruzam. Esta Cidade Sagrada é a morada terrestre da Shechiná e, portanto, o local onde a Sefirá de Malchut é mais presente na Terra.

Lechá Dodi termina com as palavras “Boí Calá, Shabat Malketá”, que se traduz por “Vem, ó Noiva, Vem ó Rainha do Shabat”. A metáfora do Shabat ser uma Rainha alude à Sefirá de Malchut (à sua realeza). O poema descreve metaforicamente o Shabat como uma rainha e não como um rei, pois, como vimos acima, Malchut é uma Sefirá feminina associada à Shechiná, palavra hebraica usada para denotar a Presença Divina na Terra.

A Amidá de Shabat e a Realeza Divina

A oração da Amidá é o pilar central da liturgia judaica. No Shabat, rezamos a Amidá quatro vezes – durante Arvit (a oração da noite), Shacharit (a oração matinal), Mussaf (a oração adicional) e Minchá (a oração da tarde). 

Apesar de que cada uma das Amidot de Shabat tenha seu conteúdo único, todas elas enfatizam a santidade do dia. E, diferentemente da versão tradicional da Amidá que recitamos nos dias da semana, a Amidá de Shabat não inclui pedidos pessoais ou comunitários – nossas preocupações diárias e nossas necessidades. Pelo contrário, reflete a natureza passiva e tranquila do dia do descanso – um dia em que não pensamos nas preocupações, problemas e aflições, mas sim, na paz, no contentamento e nas coisas boas da vida. As orações da Amidá de Shabat incorporam, de forma sucinta, os temas que discutimos acima. Por exemplo, na Amidá recitada na oração vespertina do Shabat declaramos: “Aqueles que guardam o Shabat e o chamam um deleite hão de se alegrar em Teu reino (Malchutechá)”, em clara referência à Sefirá de Malchut (“reino” ou “realeza”).

Essa oração da Amidá também enfatiza o Shabat como o dia mais querido da semana, por representar a conclusão da Criação. Com nosso entendimento da essencialidade de Malchut para a continuada existência do mundo – de forma análoga ao  indispensável papel do solo para as plantas, necessário para a vida na Terra, fica evidenciada a razão para que o Shabat seja o dia mais sagrado do calendário judaico.

A Mitzvá de Shabat é tão central para o Judaísmo que constitui o único ritual incluído nos Asseret HaDibrot – as Dez Declarações Divinas – popularmente conhecidas como os Dez Mandamentos.

O Kidush do Shabat e a Sefirá de Malchut  

O Kidush do Shabat – a santificação do Shabat sobre o vinho – é um mandamento da Torá altamente místico e que alude à Sefirá de Malchut.

Como explicamos acima, Malchut é considerada um receptáculo; um copo vazio que recebe e contém as emanações das demais Sefirot. O cálice de Kidush cheio de vinho pode ser entendido como uma representação simbólica desse conceito, sendo que o vinho representa Zeir Anpin – as seis Sefirot emocionais ativas – e o cálice simboliza Malchut, o receptáculo que o recebe e contém.

A recitação do Kidush no Shabat constitui uma expressão de Malchut. Essa Sefirá simboliza a transformação do potencial em realidade. Ao enunciar as palavras do Kidush, traduzimos a santidade espiritual do Shabat de um domínio teórico para nosso mundo tangível. Efetivamente, muitas autoridades em Halachá, o conjunto das Leis Judaicas, afirmam que a recitação do Kidush nas noites de Shabat constitui o cumprimento do mandamento de Zachor (lembrar-se do Shabat – um dos Dez Mandamentos).

Malchut e o Mundo Vindouro – o Sétimo Milênio

O calendário judaico se iniciou há 5784 anos. A Cabalá nos ensina que assim como uma semana é composta por sete dias, também o mundo como o conhecemos existirá durante sete mil anos – cada milênio correspondendo a um dia da semana. O primeiro milênio do calendário judaico, correspondendo ao primeiro dia da semana, foi caracterizado pela primeira Sefirá emocional – Chessed. O segundo milênio foi associado à Guevurá; o terceiro à Tiferet, o quarto à Netzach e o quinto à Hod.

O mundo está atualmente no sexto milênio – Yessod – e, em pouco mais do que dois séculos, entrará no sétimo milênio, associado ao sétimo dia da semana, o Shabat, e, consequentemente, à Sefirá de Malchut.

Ainda que somente D’us possa decidir a data da vinda do Mashiach, há uma tradição que diz que o sétimo milênio será a Era Messiânica – um período marcado pela paz universal, abundância e uma elevada conscientização sobre o Divino. De modo análogo à maneira como o Shabat – o sétimo dia da semana – é um dia de tranquilidade, deleite e elevação espiritual, o sétimo milênio será uma era utópica em que não haverá sofrimento nem discórdia, mas sim, paz, júbilo e abundância para todos os habitantes da Terra. De fato, quando recitamos o Birkat HaMazon (a Bênção após as Refeições) no Shabat, incluímos o seguinte pedido: “Que o Misericordioso nos deixe herdar o dia em que será Shabat e descanso para todo o sempre”. A santidade, prazer e paz do Shabat são, portanto, o prenúncio – o vislumbre – da Era Messiânica.

O Shabat simboliza a santidade do tempo por ser quando há a maior revelação da Shechiná. Como a Era Messiânica será um Shabat que durará um milênio, essa era será caracterizada pela presença revelada de D’us. O profeta Isaías profetizou que na Era Messiânica “...a Terra estará repleta do conhecimento do Eterno, como as águas cobrem o mar” (Isaías 11:9).

Uma das características da Era Messiânica é o fato de que o mundo inteiro aceitará o Reinado de D’us e toda a humanidade reconhecerá a unicidade de D’us e de Seu Nome. Assim como o sétimo dia da semana, o Shabat, é seu ponto culminante, o sétimo milênio representará o ápice da História.

Uma das missões do Povo Judeu é guiar o mundo em direção ao Eterno Shabat. E é por essa razão que concluímos todas as nossas orações – do anoitecer, da manhã e da tarde – com a oração Alenu LeShabeach, que é repleta de referências à Malchut – o Reino Divino – na qual proclamamos, referindo-nos à Era Messiânica: “Porque o Eterno reinará para todo o sempre (Êxodo 15:18). E como está dito: E o Eterno será Rei sobre toda a terra; naquele dia, o Eterno será um e Seu Nome, um” (Zechariá 14:9).

Bibliografia

Kaplan, Rabbi Aryeh, Inner Space - Introduction to Kabbalah, Meditation and Prophecy. Moznaim Publishing Corporation

Steinsaltz, Rabbi Adin, The Thirteen Petalled Rose: A Discourse on the Essence of Jewish Existence and Belief. Basic Books