A Associação Cultural Israelita de Brasília (Acib) É o centro cultural, social e religioso das estimadas 120 a 150 famílias judias que vivem em Brasília.

"Brasília é a capital do Brasil e deve ter uma representatividade judaica à sua altura", afirma o carioca Samuel Goldner, presidente da (Acib).

Palestras, encontros, almoços, além das festas judaicas e cerimônias semanais de Cabalat Shabat são conduzidos na instituição.

Uma grande menorá identifica a entrada da Acib. No entanto, quem passa pela Entrequadra não enxerga nada além do símbolo judaico. É que o prédio da Acib foi construído num grande terreno rebaixado, um verdadeiro "buraco". A idéia
era construir uma sinagoga no andar térreo. Não é raro o visitante desavisado chegar corretamente ao endereço, mas simplesmente não encontrar a
Acib e dar meia-volta. Além disso, para se chegar ao prédio é preciso descer uma íngreme escadaria, um obstáculo a mais para os idosos. A casa tem um amplo salão, onde é realizada a maioria dos eventos, além de algumas salas, entre as quais uma sinagoga provisória, onde o jovem paulistano Daniel Fligentaub conduz regularmente as cerimônias de Cabalat Shabat. Aos 22 anos, este estudante de Direito é também o professor de Bar Mitzvá e coordenador da Chevra Kadisha. De forma esporádica, o rabino Yossef Simonowits, do Beit Lubavitch do Rio de Janeiro, realiza um Shabat na Acib, que dispõe também de uma mikvê (da qual Fligentaub é o mashguiach, ou seja, o supervisor). "É bastante difícil viver numa cidade onde não há um rabino para se consultar ou com quem estudar", observa o rapaz. Atrás da casa da Acib há um espaço de terra batida, de cor avermelhada, onde a sucá é montada à sua época e que serve de estacionamento ao longo do ano. De fato, espaço não é problema para a única instituição judaica de Brasília, há quase quatro décadas ainda inacabada. O que é falta é o interesse em investir na instituição.


O também carioca Samuel Szerman é o diretor cultural da Acib e uma das suas mais importantes vozes. Ele também lamenta a falta de investimentos para as melhorias necessárias e o baixo engajamento comunitário. Quanto aos projetos, é categórico: "Que projetos? Com quem? Com que dinheiro?",
desabafa. "Ninguém se preocupa conosco. Nem mesmo muitos daqui", completa. As resposta pessimistas, no entanto, não representam o verdadeiro espírito batalhador de Szerman, um incansável profissional de Relações Públicas aposentado, que é um dos pilares da comunicação da comunidade.

Histórico

Embora o Distrito Federal tenha uma comunidade judaica relativamente pequena, os judeus sempre estiveram vinculados, de alguma forma, à região, mesmo antes da construção de Brasília. Já em 1953, era criada a Comissão de Localização, cujo objetivo era delimitar a área do então estado de Goiás, onde seria construído o futuro Distrito Federal. Nessa comissão, havia um judeu, o geógrafo e historiador Salomão Serebrenick z"l.

O ano de 1958 tem uma grande importância histórica para os judeus de Brasília, quando foi realizada a primeira manifestação de religião judaica na 'Cidade Livre', como era chamado aquele aglomerado urbano com cara de "faroeste", em pleno cerrado brasileiro. Numa parte reservada do restaurante italiano Adele, embora sem as condições ideais, foi celebrado um seder de Pessach.

Pode-se dizer que esse período imediatamente posterior à inauguração de Brasília (21 de abril de 1960) representa, de fato, o estabelecimento de uma comunidade judaica, no sentido mais exato da palavra. Não só aumentou o número de judeus, como as pessoas passaram a se reunir, festejando as datas religiosas e discutindo as questões judaicas. Também nessa época a cidade passou a receber um outro tipo de judeu: o brasileiro, funcionário público, que vinha transferido do Rio de Janeiro para a nova capital. Este era o caso, por exemplo, de Salomão Bensusan e Germano Galler, que tiveram uma participação muito ativa na formação da Associação Cultural Israelita de Brasília, em 1964. Galler contava que, em 1960, havia uma associação informal chamada Grupo de Amigos de Israel (GAI), que se reunia em sua casa. Esse núcleo foi o embrião do grupo que, anos depois, criou a Acib.


Em 1961, Brasília recebe pela primeira vez a visita de um Rabino, Michel Leipziger. "A pedido de um grupo de três casais judeus liderados por Jedydia Worcman, fui a Brasília encaminhado pelo Rabino Lemle, z"l, do Rio de Janeiro. Havia entre os casais um que acabara de ter um menino, talvez o primeiro judeu nascido na nova capital", conta.

Consolidação do ishuv

O ano de 1964 representa um marco histórico na presença dos judeus no Distrito Federal. A coletividade ainda era bastante reduzida, mas já havia um sentimento de integração entre os pioneiros que se radicaram no Núcleo Bandeirante, a partir de 1957, e os que chegaram posteriormente à cidade. Começou, então, a amadurecer a criação de uma entidade que congregasse os judeus de Brasília e cidades-satélites. Foi quando surgiu a Associação Cultural Israelita de Brasília. Vale a pena frisar que as mulheres da coletividade já haviam criado um núcleo da Wizo, entidade de caráter filantrópico, na nova Capital.

Se fundar a Acib foi relativamente fácil, difícil foi mantê-la ao longo dos anos e, mais difícil ainda, construir a atual sede. Naquele primeiro ano de existência, a Acib debateu-se com um problema de identidade: era uma associação cultural e recreativa ou uma organização religiosa? Mas, uma reunião realizada em 21 de outubro de 1964 definiu a questão: a Acib não tinha caráter predominante religioso. Já nessa época, a comunidade judaica de Brasília enfrentava dois problemas principais: além de ser reduzida, seus integrantes eram obrigados a fazer constantes viagens para cuidar de suas obrigações profissionais ou mesmo para tratamento de saúde.

Por volta de 1970, a população judaica era extremamente rarefeita: apenas 80 famílias. Talvez isso tenha dificultado não só a expansão da Acib, mas também da própria B'nai B'rith. A entidade foi fundada em Brasília em 1973, no mesmo dia em que foi lançada a pedra fundamental da Embaixada de Israel. Mas não prosperou. Em 1982, o rabino Michel Leipziger volta a conviver com a comunidade judaica de Brasília. Sua estada em Brasília se encerrou em abril de 1984 e muitos membros da comunidade se lembram dele.

Juventude: o Grupo Shamayim

Em meados dos anos 90, faltavam aos adolescentes, universitários e pós-universitários da kehilá atividades que os unissem, que lhes propiciassem uma convivência mais estreita. Por outro lado, os encontros informais após o Cabalat Shabat na então existente sinagoga Beit Chabad atraíam mais e mais jovens. "Era tradição", relembra Tamara Socolik.

Foi quando Carla Ungierowicz, Danielle Belicha, Julia Costa, Miriam Futer e a própria Tamara fundaram o Grupo Shamayim. "Com integrantes de 18 a 40 anos, o objetivo do grupo era e continua sendo unir e aproximar os judeus desgarrados de volta à comunidade", completa Tamara. A grande leva de jovens judeus que chega a Brasília para trabalhar ou estudar foi muito importante para a comunidade. Vindos dos grandes centros, com grandes comunidades judaicas, trouxeram sua experiência comunitária. A presença em Brasília de um jovem judeu de outra cidade sempre foi festejada pelo grupo. "Corremos atrás", confessa Miriam Futer, a 'Mirinha'.

"O Shamayim é um grupo que promove eventos de caráter social, cultural e religioso", define Tamara. Quando a carioca Diana Levacov se mudou para Brasília, em 2001, e começou a freqüentar o grupo, teve a idéia de criar um espaço judaico de debates na Internet para melhorar a comunicação entre os jovens. Nasceu a lista Shamayim, uma extensão natural do Shamayim já existente. A versão virtual do grupo jovem de Brasília reúne, hoje, judeus de todo o Brasil.

Jovens itinerantes

"O Shamayim é um grupo que promove eventos de caráter social, cultural e religioso", define Tamara. Quando a carioca Diana Levacov se mudou para Brasília, em 2001, e começou a freqüentar o grupo, teve a idéia de criar um espaço judaico de debates na Internet para melhorar a comunicação entre os jovens. Nasceu a lista Shamayim, uma extensão natural do Shamayim já existente. A versão virtual do grupo jovem de Brasília reúne, hoje, judeus de todo o Brasil.

A peruana Leslie Sasson Cohen chegou ao Brasil aos nove anos de idade. Criada no Rio, está em Brasília desde 2000 e se integrou ao grupo jovem. Para Leslie, falta um rabino fixo à Acib. "Talvez isto fizesse com que mais gente freqüentasse a sinagoga e a instituição e trouxesse mais jovens". E ela toca ainda num ponto nevrálgico: "A Acib é a única organização judaica da Capital Federal e nem ao menos é reconhecida como tal. Sempre que há eventos ecumênicos de âmbito nacional, por exemplo, vem gente de fora, do Rio ou de São Paulo, para representar a comunidade judaica", brada.

 

Sobrevivência



Felippe Ungierowicz, é quem cuida das finanças da Acib. "A comunidade de Brasília é totalmente diferente da dos outros centros, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife etc. Aqui não temos colégio, hospital, cemitério israelita. Não temos capela própria, não temos condições de fazer o asseio dos corpos no cemitério, tudo é feito no próprio hospital onde a pessoa falece. Aqui para nós é tudo difícil. Aqui não temos grandes empresários que queiram ajudar a Acib. O que arrecadamos mensalmente mal dá para pagar nossas despesas operacionais", enfatiza. "O recado que dou para os jovens da comunidade é que eles devem se interessar mais pela Acib para que ela não acabe", completa.


Membro da Acib atualmente vivendo nos EUA, a professora universitária, geógrafa e antropóloga Sonia Bloomfield Ramagem, proferiu uma palestra recente em Brasília. Ela é mais otimista: "Senti uma grande alegria em ver as pessoas curiosas, participando, discutindo vivamente seu judaísmo. Temos uma importante missão em Brasília: a luta pela sobrevivência do judaísmo", conclui.


Marcus Moraes
Jornalista responsável pelas notícias do site morasha.com