A primeira semana de setembro de 2017 e alguns dias subsequentes assinalam a passagem de 45 anos desde o massacre de onze atletas e técnicos israelenses que participariam dos Jogos Olímpicos realizados na cidade de Munique, em 1972. A organização Setembro Negro impactou o mundo com sua ação terrorista. O governo de Israel, por sua vez, soube ocultar do mundo a punição imposta aos responsáveis por aquele atentado.
No dia 18 de agosto de 1972, a delegação israelense que deveria embarcar para os Jogos em Munique compareceu a uma reunião no Instituto Wingate, um magnífico centro esportivo, situado perto da costa do Mediterrâneo, entre Tel Aviv e Haifa. O chefe de segurança do Ministério da Educação Cultura e Esportes, ali designado, recomendou aos atletas e técnicos que, uma vez na Alemanha (então Ocidental), não falassem em voz alta em hebraico, não usassem como adornos eventuais símbolos judaicos e, de um modo geral, evitassem chamar atenção com seu comportamento. Foi-lhes informado, então, o endereço que ocupariam na Vila Olímpica: Rua Connolly, número 31, onde também estariam as delegações do Uruguai e de Hong Kong. A viagem para a Europa transcorreu, dias depois, sem maiores problemas.
Às 4h15m da manhã do dia 5 de setembro, Shmuel Lalkin, chefe da delegação israelense, que ocupava o quarto número 5 no segundo andar do pequeno prédio da rua Connolly, teve a impressão de ter ouvido um estampido, como se fosse algo oriundo de uma arma de fogo. Foi até a janela, obervou as imediações, nada viu de anormal. Voltou para a cama. Àquela altura, terroristas da organização Setembro Negro já se encontravam no apartamento número 1 e já tinham atingido (o tiro que Lalkin ouvira) Yossef Gutfreund, um colosso de 130 quilos, praticante de luta livre. Ao mesmo tempo, Tuvia Sokolovsky, técnico de levantamento de peso, conseguiu quebrar uma janela e escapulir. Às cinco horas da manhã os terroristas já haviam sacrificado dois israelenses e feito nove reféns. Porém, nervosos e temerosos de imediatas represálias, os homens do Setembro Negro não investiram contra os apartamentos de números 2, 4 e 5, permitindo que outros israelenses escapassem. Em seguida, ante a perplexidade dos encarregados da segurança dos Jogos e do espanto que percorreu o mundo, os terroristas emitiram suas reivindicações em idioma inglês. Em troca dos reféns, exigiam a libertação de prisioneiros árabes em Israel e de perigosos elementos subversivos presos na própria Alemanha, compreendendo 234 nomes. Da lista faziam parte Ulrike Meinhof e Andreas Bader, líderes do nefasto grupo Bader-Meinhof, que convulsionara a Alemanha e estava preso desde junho daquele mesmo ano. O Setembro Negro também exigia que três aviões fossem colocados à sua disposição no aeroporto de Munique. Uma vez acertada a libertação dos prisioneiros, escolheriam um dos aviões que tomaria um destino não informado.
Em Jerusalém a primeira-ministra Golda Meir emitiu um comunicado conclamando todas as nações democráticas do mundo para que se unissem no resgate dos atletas mantidos como reféns em Munique e que condenassem “os inomináveis atos cometidos”. E acrescentou: “Se Israel ceder aos terroristas, nenhum cidadão israelense poderá sentir, em qualquer parte do mundo, que sua vida estará segura. Encontramo-nos perante uma chantagem da mais desprezível espécie”.
O rei Hussein, da Jordânia, único chefe de estado árabe a condenar o Setembro Negro, declarou publicamente: “Presenciamos um crime selvagem cometido contra a civilização, perpetrado por mentes doentias”. Em Washington, o presidente Richard Nixon convocou um pequeno comitê de emergência para avaliar a situação, inclinado a declarar um dia de luto oficial no que foi apoiado pelo secretário de Estado William P. Rogers. Durante a discussão do comitê, houve quem dissesse que Nixon talvez devesse se deslocar até Munique para acompanhar os rituais fúnebres dos israelenses assassinados. Essa sugestão, porém, foi logo descartada. Acabou prevalecendo a opinião de Henry Kissinger, endossada por Nixon, no sentido de pressionar as Nações Unidas para que esse organismo internacional tomasse medidas severas contra o terrorismo. Ou seja, panos quentes.
Enquanto isso, em Jerusalém, Golda Meir mantinha contato telefônico permanente com o chefe do governo alemão, Willy Brandt, reiterando que Israel jamais faria qualquer negociação ou qualquer acordo com os terroristas, custasse o que custasse. Em face da determinação de Golda, o chefe da polícia de Munique, Manfred Schneider, concluiu que uma tentativa de resgate dos reféns seria a única opção viável. Mas Golda se antecipou e mandou para a Alemanha Zvi Zamir, o chefe do Mossad (serviço secreto de Israel). Zamir propôs às autoridades alemãs que permitissem a vinda de Israel para Munique da tropa de elite Sayeret Matkal, que, no decorrer dos últimos vinte anos já havia comprovado sua capacidade operacional. Na verdade, essa tropa tinha sido bem sucedida em ações até mais difíceis do que aquela que teria de enfrentar na Vila Olímpica. (Quatro anos depois, a unidade Sayeret Matkal foi a responsável pelo espetacular resgate dos reféns israelenses presos no aeroporo de Entebe, Uganda). Os alemães recusaram o oferecimento de Zamir, aprovado por Willy Brandt, mas negado por seus companheiros de gabinete, por questão de orgulho, alegando que a intervenção de militares estrangeiros dentro de suas fronteiras equivaleria a uma ruptura na soberania do país.
A partir desse ponto paira uma imensa interrogação, uma enorme dúvida, sobre o trágico desfecho ocorrido em Munique nas Olimpíadas de 1972. A polícia alemã mostrou que não tinha o menor preparo, nem planos primários ou secundários, para lidar com uma situação daquela magnitude e complexidade. O chefe Schneider, a cada hora mais nervoso e indeciso, por fim encaminhou para o aeroporto um comboio que conduzia tanto os terroristas como os reféns.
No aeroporto, colocou em posições avaliadas às pressas cinco atiradores de elite que deveriam disparar suas armas contra cinco terroristas. Só que eles não eram cinco, eram oito. Schneider fizera uma conta errada de forma primitiva. Tudo acabou dando errado porque a polícia alemã perdeu completamente o controle dos acontecimentos. Parte dos reféns foi levada para um helicóptero que foi atingido por uma granada atirada pelo Setembro Negro. Os israelenses morreram carbonizados. O mesmo aconteceu com os demais atletas dentro de um segundo helicóptero que explodiu ao ser alvejado por outra granada. Das cinzas de todo esse trágico cenário, restou uma interrogação que há de perdurar para sempre: como tudo poderia ter sido concluído se o resgate tivesse sido conduzido pelos impetuosos militares israelenses do Sayeret Matkal? Não há uma resposta objetiva para essa pergunta, mas é viável admitir, avaliando o retrospecto dessa tropa de elite, que aquelas vidas perdidas em solo alemão poderiam ter sido salvas.
Conforme escreve Aaron J. Klein em seu livro Striking Back, às 10 horas da manhã do dia 12 de setembro, o Parlamento de Israel fez um minuto de silêncio em memória das vítimas de Munique. Numa sala ao lado, Golda recebeu as famílias enlutadas dos técnicos e atletas e lhes disse: “Quero partilhar com vocês o que pretendo fazer. Vamos perseguir todos os terroristas. Nenhum deles que esteja envolvido nos acontecimentos de Munique vai andar livre por este mundo, por muito tempo. Todos serão implacavelmente caçados”. Em seguida, ela falou ao Parlamento reunido: “As ações terroristas evoluem a cada dia. Temos que nos preparar para esse tipo de guerra.
A nação judaica tem uma história sangrenta e por isso mesmo já aprendemos que, quando a violência se configura tendo os judeus como alvo, essa violência se estende a todos os povos. Não temos outra escolha a não ser combater as organizações terroristas onde quer que se encontrem”. Suas palavras foram endossadas pelo líder da oposição, Menachem Begin: “Precisamos eliminar esses criminosos. É preciso que eles sintam medo. Se há necessidade de uma unidade especial para isso, está na hora de formá-la”. Begin não sabia que essa unidade secreta já existia e tinha o nome de Caesarea.
Uma das primeiras providências de Golda Meir foi nomear o ex-chefe do serviço de inteligência do exército, o competente general Aharon Yariv, como seu conselheiro especial para assuntos de contraterrorismo. Os dois, mais Zvi Zamir, se incumbiram de convencer o gabinete governamental sobre a necessidade da criação de um comitê ultrassecreto para o combate ao terrorismo. A sugestão foi aprovada e passou a contar em seguida com a presença ativa de Moshé Dayan. O grupo foi nomeado apenas como “Comitê X” e partiu de um consenso segundo o qual caberia ao Mossad implementar as ações contra-terroristas de modo a eliminar aqueles que haviam perpetrado o massacre de Munique. Não caberia ao Mossad a tarefa de promover capturas ou de investigar suspeitos. O objetivo ficara bem claro: o abatimento de integrantes do Setembro Negro e suas ramificações. Para dar andamento ao projeto, Yariv chamou o agente Michael “Mike” Harari que já havia formulado, no início dos anos 1970, as teorias e práticas da operação Caesarea.
Mike Harari merece um capítulo à parte, tal sua dimensão e importância nos serviços de segurança do Estado de Israel desde os primórdios do país. Harari nasceu na antiga Palestina em 1927 e, com apenas dezesseis anos de idade, engajou-se na Haganá(organização militar clandestina judaica, ao tempo do Mandato Britânico). Passou a atuar, em seguida, no grupo Palmach, uma unidade de choque, mais ativa e dinâmica, dentro da própria Haganá. Foi preso diversas vezes pelos ingleses até que, em 1946, foi mandado para Marselha, no sul da França, com a incumbência de trazer refugiados judeus da 2ª Guerra para a Palestina em navios clandestinos que tentavam furar o bloqueio naval britânico, sendo às vezes bem-sucedidos.
Após a independência passou a atuar no Shin Bet, o serviço de segurança interna de Israel. Em 1954 foi recrutado pelo Mossad, aonde chegou à condição de dirigente, reconhecido e admirado por sua excepcional criatividade e audaciosa capacidade operacional. No âmbito da Caesarea, Harari criara uma unidade chamada Kidon que fora treinada especificamente para ações definitivas. Nos meses seguintes, o Mossad se empenhou em elaborar a lista mais completa possível com os nomes dos membros do Setembro Negro, e seus superiores, responsáveis pelo terror em Munique. Harari recrutou 15 agentes, homens e mulheres, para a missão chamada “Cólera de D’us”. Separou os agentes selecionados sob rigorosíssimo critério, conforme as letras do alfabeto hebraico.
O primeiro grupo, o alef, era composto por dois especialistas em armas de fogo; o bet reunia dois agentes para dar retaguarda aos dois do alef; o het tinha dois homens encarregados das logísticas; o ayn compreendia de seis a oito agentes dedicados a diversas tarefas, além de apontar os alvos a serem atingidos e a assegurar as rotas de fuga para o pessoal do alef e do beit; finalmente, o kuf abrigava dois peritos em comunicações.
O primeiro alvo da “Cólera de D’us” foi um palestino chamado Wael Suatyr, nascido em Nablus, havia seis anos radicado em Roma, onde trabalhava como tradutor. Antes de se radicar na Itália havia feito uma escala na Líbia. Em agosto de 1972, Suatyr foi preso pela polícia italiana acusado de participar de um grupo terrorista que colocara uma bomba numa refinaria de petróleo. O atentado foi reivindicado pelo Setembro Negro e, assim, Suatyr, embora liberado pelas autoridades de Roma, foi parar na lista de Harari. Pouco tempo depois, foi apontado pelo Mossad como um dos terroristas que tentaram explodir um Boeing da El Al enquanto o avião decolava do aeroporto Leonardo da Vinci, em Roma. Uma bomba foi detonada no compartimento de bagagens, mas a aeronave resistiu porque, dias antes, ali haviam sido instalados reforços moldados em placas de aço. O comandante do avião conseguiu fazer uma aterragem milagrosa nos arredores da capital italiana.
Suatyr levava uma vida simples e anônima, trabalhando na embaixada da Líbia em Roma, mas os israelenses estavam convencidos de que se tratava de um lobo em pele de cordeiro. Decidiram monitorá-lo durante quinze dias e nada de anormal notaram em sua rotina. Mesmo assim, consideravam inequívoca sua ligação com o Setembro Negro. No dia 16 de outubro, Suatyr jantara num restaurante e seguira para seu apartamento onde os agentes do Mossad o aguardavam no escuro da portaria do prédio. Foi abatido com doze tiros de uma arma Beretta, calibre 22, às 9h30 da noite.
A eliminação de Suatyr levou enorme preocupação aos membros do Setembro Negro e seus afiliados, espalhados entre a Europa e a África. Alguns terroristas aprimoraram seus sistemas de segurança e, a rigor, todos passaram a viver olhando para trás com medo de alguma emboscada.
Em Paris, Mahamud Hamshari, representante da Organização de Libertação da Palestina, não sentia medo algum. Como detinha um status quase diplomático, julgava estar livre de ser admoestado. Como também imaginava que sua efetiva ligação com o Setembro Negro permaneceria na sombra, Hamshari gostava de aparecer em público e de dar entrevistas. Por isso não estranhou quando foi procurado por um jornalista italiano que o convidou para tomar um café dali a tantos dias. Harari precisava de algum tempo para contatar Zamir e lhe pedir que mandasse para Paris uma equipe da unidade Rainbow, especializada em arrombar edifícios, apartamentos, veículos e cofres sem deixar vestígios. A Rainbow era comandada por Zvika Malkin, meu amigo, que capturara Eichmann em Buenos Aires, e sobre o qual já escrevi aqui na Morashá.
O jornalista italiano era um agente do Mossad incumbido de estabelecer sem sombra de dúvida a identidade de Hamshari, de saber pormenores de sua atividade cotidiana e de entretê-lo enquanto Zvika colocava um explosivo dentro do telefone instalado em seu apartamento. O agente apurou que Hamshari era casado com uma francesa e o casal tinha uma filha pequena. Harari elaborou um plano no sentido de que a mulher e a menina nada sofressem. Às 8h30 do dia 8 de dezembro de 1972, as duas saíram de sua residência na Rua d’Alésia. Quinze minutos depois o telefone tocou e Hamshari o atendeu. Seguiu-se uma explosão que destruiu toda a sala de estar do apartamento.
No organograma da organização terrorista Fatah um jovem chamado Abu Khair fazia a ligação permanente entre seus chefes e a KGB, o serviço secreto Soviético. Ele chegara no início do ano de 1973 à Nicósia, capital de Chipre, na qualidade de representante da OLP. O pessoal do “Cólera” seguiu-o durante duas semanas e constatou que ele não mantinha nenhum esquema especial de segurança. Coube a Zvika colocar um explosivo sob sua cama no quarto que ocupava no hotel Olympic, na avenida Presidente Makarios. Pouco antes da meia-noite do dia 25 de janeiro, o emissário da OLP entrou em seu quarto. Do lado de fora, dentro de um carro, um agente do Mossad só precisou apenas apertar o botão de um controle remoto. A explosão sacudiu o hotel inteiro.
A chamada “Cólera de D’us” serviu como base para o filme “Munich”, de 2006, dirigido por Steven Spielberg que, por sua vez, baseou-se no livro “Vengeance”, escrito por George Jonas. Toda a narrativa do livro é feita a partir de um longo depoimento prestado ao autor por um dos principais elementos da equipe de Harari, que não revelou sua verdadeira identidade, escondendo-se atrás do pseudônimo Avner. O livro de Jonas peca pela glamorização de toda a operação e descreve situações, circunstâncias e fatos impossíveis de serem confirmados, sobretudo um capítulo no qual diversos agentes do Mossad pedem demissão por estarem emocionalmente arrasados em função da missão que lhes havia sido confiada. Além disso, no relato de Avner há repetidas menções aos contatos que manteve e a remunerações que repassou a uma organização clandestina francesa chamada Le Group, detentora de surpreendentes informações ultrassecretas, cuja existência jamais foi confirmada. Na verdade, todas as etapas que dizem respeito a esse assunto devem ficar restritas à área das suposições. Desde o massacre de Munique o governo de Israel apenas admite que ordenou, sim, uma série de operações contra o terrorismo, sem jamais fornecer pormenores referentes a recursos humanos, datas, métodos ou opções. As operações desenvolvidas pelo Mossad, desde sempre, continuam arquivadas em pastas com os selos de “confidencial”.
O fato é que uma ação de retaliação, tal como a empreendida pela equipe Caesarea, vem provocando há mais de quarenta anos uma inundação de reportagens em jornais e revistas, livros, documentários e filmes de ficção, fervilhando imaginações que decerto ainda se estenderão por muito tempo. Há quem diga, inclusive, que a expressão “Cólera de D’us” é uma invenção da mídia.
A única ação documentada da equipe Caesarea, e, portanto, irrefutável, tem como cenário, em julho de 1973, uma pequena cidade turística da Noruega, chamada Lilehamme. Foi uma operação desastrada em busca de Ali Hassan Salameh, codinome Príncipe Vermelho, mentor do massacre de Munique e cérebro do Setembro Negro, o No 1 da lista de Harari. Depois de um ano de pesquisas minuciosas, o Mossad sentiu-se seguro com a informação de que Salameh se refugiara em Lilehammer.
Uma agente secreta já estacionada na Noruega foi incumbida de monitorar os passos do dito Salameh, além de providenciar a logística da operação, consistindo no aluguel de veículos e de pelo menos duas casas que viriam a servir como esconderijos. Em seguida, Harari enviou para a Noruega cinco de seus melhores operadores que se hospedaram sob falsos nomes no Oppland Tourist Hotel. O primeiro contato visual com o alvo aconteceu na tarde do dia 21, quando o suposto terrorista se encontrava numa piscina pública ao lado de uma mulher grávida.
Acompanharam-no o dia inteiro, até avistá-lo saindo de um cinema, junto com a mesma mulher, às oito horas da noite. Dois agentes do Mossad seguiram atrás do casal numa calçada e abateram o homem. A polícia chegou ao local minutos depois, mas os atiradores já haviam fugido num automóvel Mazda, abandonado adiante, trocado por um Peugeot que partiu em alta velocidade para uma das casas alugadas. Passantes pelo local testemunharam aquela súbita troca de automóveis e estranharam a disparada do Peugeot vermelho, comunicando o fato à polícia.
As autoridades norueguesas identificaram a vítima como Ahmed Bouchiki, de nacionalidade marroquina, que trabalhava como garçom num restaurante da cidade. No Peugeot em fuga encontravam-se os agentes Marianne Gladnikof e Dan Arbel. Eles passaram a noite no esconderijo e seguiram para o aeroporto na manhã seguinte. Foi, então, que cometeram um erro fatal: usaram o mesmo Peugeot vermelho que foi detectado pela polícia ao se aproximar do aeroporto. Ambos foram presos e, sob interrogatório, revelaram toda a verdade da situação, tendo Marianne cometido outro erro imperdoável: forneceu como seu endereço em Lilehammer uma das casas alugadas. Ali as autoridades prenderam os demais componentes da equipe. Os seis agentes israelenses foram levados a julgamento, tendo sido um absolvido e cinco condenados a penas de dois anos e meio a cinco anos e meio de reclusão. Por envolver outro país, no caso Israel, o caso foi tratado como sigilo de justiça, mas é sabido que o pessoal do Mossad foi libertado depois de 22 meses de encarceramento.
A despeito do fracasso em Lilehammer, Harari e seus homens contabilizavam uma série de ações bem consumadas contra os terroristas do Setembro Negro, faltando, porém, no seu entender, o mais importante: justiçar o chamado Príncipe Vermelho, Hassan Ali Salameh. Este nasceu numa família abastada, em 1940, na pequena cidade de Qula, perto de Jaffa. O jovem foi educado na Alemanha e supõe-se que tenha recebido treinamento militar no Cairo e em Moscou. Era conhecido no âmbito da OLP como um gastador extravagante de dinheiro e um imbatível sedutor de mulheres.
Embora os americanos neguem, Salameh manteve, desde o início dos anos de 1970, contato assíduo com a CIA na qualidade de informante. Portanto, se sentia protegido e circulava à vontade pela Europa e pelo Oriente Médio. Em 1978 casou-se com Georgina Rizk, uma beldade libanesa que, anos antes, havia sido eleita Miss Universo. Salameh assumiu o comando da segurança do grupo terrorista Fatah, foi um dos formuladores e organizadores do Setembro Negro e principal mentor do ataque nas Olimpíadas de Munique. Todos os esforços da equipe de Harari para localizá-lo, ao longo de sete anos, tinham sido inúteis, até tomarem seguro conhecimento de que ele havia fixado residência em Beirute, no Líbano.
No início de janeiro de 1979 chegou a Beirute uma turista inglesa, pintora amadora, levando uma maleta recheada de tintas e pincéis. A recém-chegada alugou um apartamento na Rua Verdun, de cuja varanda tinha pleno visual, em diagonal, do apartamento de Salameh. Dali ela era capaz de observar e anotar toda a movimentação no apartamento do chefe terrorista, além do que os vizinhos não podiam suspeitar daquela moça pintando durante horas e horas na varanda. No dia 22 de janeiro, Salameh e seus guarda-costas saíram num automóvel da Rua Verdun e dobraram na direção da Rua Marie Curie. A inofensiva pintora acionou um carro estacionado ali perto, onde um homem apertou o botão de um controle remoto. A explosão foi arrasadora.
Michael “Mike” Harari aposentou-se do Mossad no ano seguinte, depois de 26 anos de ininterruptos serviços. Foi condecorado pelo governo e voltou a ser chamado ocasionalmente pelo Mossad com a missão de avaliar as possibilidades do Irã na fabricação de artefatos nucleares. Harari faleceu no dia 21 de setembro de 2014. Deixou sua mulher, Pnina, e dois filhos.
BIBLIOGRAFIA
Klein, Aaron J., Striking Back, Random House Papaperbacks, 2007, EUA.
Bar-Zohar, Michael, Mossad, Ecco Reprint, 2007, EUA.
Reeve, Simon, One Day in September, Arcade Publishing, 2006, EUA.
Jonas, George, Vengeance, Simon & Schuster, 2005, EUA
Large, David Clay, Munich 1972, Rowman & Littlefield, 2012, EUA