No mês de julho de 1943, uma bandeira com a Estrela de David foi hasteada numa base militar inglesa na cidade de Bengazi. Embora não permitido pelos britânicos, esse evento assinalou informalmente, depois de dois mil anos, a criação de um exército totalmente judaico que se engajaria nas batalhas contra o nazismo.

Quando a Alemanha invadiu a Polônia, em 1939, dando início à Segunda Guerra Mundial, o Ishuv (judeus residentes na antiga Palestina) se viu numa situação ambígua. Por um lado, havia a confrontação com os ingleses, que eram os governantes do território e que tinham emitido naquele mesmo ano um documento chamado White Paper, destinado a coibir a entrada de judeus na então Palestina. Por outro, era imperioso apoiar e aliar-se aos ingleses que haviam declarado guerra à Alemanha. Foi, então, que David Ben Gurion resumiu a questão numa frase que se tornaria célebre: “Nós vamos lutar contra Hitler como se o White Paper não existisse e vamos lutar contra o White Paper como se não houvesse guerra”.

Em 1940, quando Churchill, simpatizante do sionismo, ascendeu ao poder na Inglaterra, a esperança era no sentido de que a restrição à imigração fosse abrandada. Não foi o que aconteceu, mas, mesmo assim, o Ishuv passou a colaborar com os britânicos e vice-versa. A Agência Judaica sugeriu, pela primeira vez, a criação de uma unidade militar judaica que fosse inserida nas fileiras do exército inglês. Não houve uma concordância explícita por parte dos ingleses, entretanto, para o que desse e viesse, foi organizado um treinamento militar para os jovens judeus, habilitando-os em táticas de comandos e estratégias de demolições e sabotagens.

Quando a Itália entrou na guerra, em 1940, o que levou o conflito às proximidades do Oriente Médio, Churchill decidiu apertar ainda mais o cinto do White Paper, porque as circunstâncias não aconselhavam uma rusga com os países árabes.

Ou seja: o governo de Sua Majestade preferiu ignorar o desespero dos judeus que precisavam escapar dos países sob domínio nazista e simplesmente não tinham para onde ir. Além disso, a atitude de Churchill não deu frutos. A maioria dos países árabes endossou o nazismo, alguns abertamente, como o Iraque, outros omitindo qualquer apoio aos aliados. Em 1941, Haj Amin al-Husseini, o Mufti de Jerusalém, emitiu um fatwa (declaração) contra os ingleses e rumou para a Alemanha, sendo recebido diversas vezes por Hitler e pelo Instituto Central Islâmico, onde, aclamado como “o Führer do mundo árabe”, pronunciou um discurso no qual disse que os judeus constituíam o “mais feroz inimigo dos muçulmanos” e “um elemento sempre corruptor no mundo”. O Mufti, inclusive, interveio quando Eichmann tentou fazer um acordo com os ingleses, pelo qual cinco mil crianças judias seriam trocadas por prisioneiros de guerra alemães. Sua declarada oposição àquele acordo teve acolhida e as crianças foram mandadas para Auschwitz.

Enquanto isso, a Agência Judaica concentrava todos seus esforços na chamada Aliá Beit, a vinda de embarcações ilegais conduzindo refugiados (ver reportagem O Herói que Comandou o Exodus, Morashá, no 74). Em terra, houve a proeza de trazer 1.350 judeus da Síria para a então Palestina, numa operação secreta e dificílima. Contudo, os ingleses endureciam e se endureciam. Em 1942, um navio chamado Struma, de bandeira romena, ancorou na Turquia com a intenção de seguir até a então Palestina. Sob pressão britânica, os turcos impediram que os judeus desembarcassem, embora eles já estivessem a bordo há 74 dias. E mais, ordenaram que o Struma zarpasse na direção do Mar Negro, onde um submarino russo, de forma inadvertida, o torpedeou, causando a morte de 796 pessoas.

Foi a gota d’água que transbordou na Agência Judaica. Depois de tal atrocidade, não seria mais possível qualquer entendimento com os ingleses. As esparsas notícias vindas da Europa dando conta do genocídio perpetrado pelos nazistas fizeram com que o ishuv se mobilizasse. A situação no país era tensa na medida em que o Afrika Korps alemão, comandado pelo general Rommel, colhia importantes vitórias no Norte da África e avançava na direção do canal de Suez, a um passo da então Palestina.

Medidas de proteção para um possível ataque foram ativadas em Jerusalém e Tel Aviv. A situação era tão dramática que antes que os alemães ocupassem a cidade de Tobruk, na Líbia, a população judaica local foi resgatada e levada para o Egito. Pelo sim, pelo não, a Agência Judaica elaborou um plano segundo o qual, caso ocorresse uma invasão alemã, a população seria evacuada para Haifa, onde a resistência se instalaria para enfrentar a luta no alto do monte Carmel. O alívio só veio depois da batalha de El Alamein, com a vitória aliada comandada pelo general Montgomery. Persistia, contudo, um problema: a presença na Síria de tropas francesas, estas sob o comando do regime colaboracionista de Vichy. Em junho de 1941, a partir da Palestina, uniram-se forças francesas livres e inglesas, às quais se integraram jovens judeus, para expulsar da Síria os franceses aliados da Alemanha. Encontraram forte resistência e, após uma tormentosa batalha (na qual Moshé Dayan perdeu uma vista), entraram em Damasco no dia 17 daquele mês. Os derrotados assinaram um armistício no dia 12 de julho, e um regime pró-aliados foi mantido na Síria até o final da guerra.

Os combatentes do Ishuv na frente síria e outros membros da comunidade, num total de 35 mil homens, alistaram-se em diferentes unidades britânicas. Acima disso, havia uma considerável presença de judeus nos exércitos aliados, ocupando dos mais simples aos mais altos escalões nas frentes da Europa e do Japão. Constituíam um total de 1 milhão e 300 mil judeus, assim distribuídos: Estados Unidos, 600 mil; União Soviética, 500 mil; Reino Unido e Comunidade Britânica, 70 mil; Polônia Livre, 15 mil.

Além dos oriundos do Ishuv, também se alistaram milhares de voluntários judeus que haviam conseguido escapar de prisões, de campos de concentração e de trens da morte nos países sob ocupação nazista. Outros judeus se reuniram em grupos de partisans (guerrilheiros) nas florestas da Europa para empreender atos de sabotagem, ou ingressaram no Maquis, a resistência francesa.

Os combatentes da Palestina usavam uniformes ingleses e eram rotulados como integrantes das “tropas coloniais”. Os voluntários judeus eram alemães, poloneses, austríacos e checos, que, separados de suas famílias, só pensavam em vingança e alimentavam intenso ódio aos nazistas. No entanto, não lhes foi permitido participar de ações militares e o mesmo aconteceu com os judeus do Ishuv. Todos foram contidos durante quatro anos, limitados a funções menores de logística, apoio e plantões de sentinelas. Isto porque os ingleses não abdicavam da sua férrea política de agradar aos árabes. Na verdade, Churchill não se deu conta de que eles pouco se importariam se os judeus iriam, ou não, combater o nazismo frente a frente. Seu objetivo era um só: acabar com as colonizações francesa e inglesa em seus territórios.

A Agência Judaica continuou insistindo para que os aliados permitissem a formação de uma tropa exclusivamente judaica, que lutaria sob bandeira inglesa. No início de 1944, Winston Churchill, já a par do Holocausto, embora se recusasse a mandar sua força aérea bombardear os trilhos de trens que conduziam a Auschwitz, (Ver Morashá, no 47) mandou um telegrama para o presidente Roosevelt sugerindo que “judeus de todas as raças (sic) tivessem o direito de revidar contra os alemães como uma entidade reconhecida”. Decorridos cinco dias, Roosevelt respondeu: “Não faço nenhuma objeção”.

Mesmo assim, o governo de Londres permanecia hesitante em seus entendimentos com a Agência Judaica, e apesar da pressão a favor da Agência exercida pelos Estados Unidos. O primeiro consenso foi no sentido de que uma Brigada Judaica só poderia ser atuante na Europa, jamais na então Palestina. Mas as desavenças seguiram prevalecendo. Quando o Ministério da Guerra britânico pretendeu formar uma nova comissão para estudar o assunto, Churchill ficou furioso. Ele sabia que se tratava de um pretexto para adiar, sem data, qualquer resolução.

Assim, no dia 20 de setembro de 1944, a BBC transmitiu o seguinte pronunciamento, emitido pelo primeiro-ministro: “O governo de Sua Majestade decidiu que deve ser formada uma Brigada Judaica para tomar parte ativa nas operações militares. O necessário treinamento para essa tarefa já está em curso antes que a Brigada seja enviada para o teatro da guerra. A Agência Judaica está colaborando nessa iniciativa”. No dia 28 do mesmo mês, Churchill declarou perante a Câmara dos Comuns: “As tropas britânicas que se encontram na Itália agora incluem unidades da Palestina. Estou certo de que os senhores parlamentares aprovarão que uma Brigada Judaica ali tome parte ativa. Há grande número de judeus servindo em nossas tropas, nas americanas e em outros exércitos.....É apropriado que este povo, que tem sofrido indescritíveis tormentos perpetrados pelos nazistas, seja representado de forma distinta, no seio de nossas forças, por uma unidade especial formada por judeus”. Foi, então, com emoção e júbilo, que os combatentes judeus costuraram nas mangas de seus uniformes um emblema com a Estrela de David e confeccionaram bandeiras com igual símbolo. Em seus veículos, ao lado da estrela, lia-se: “Jewish Brigade”. A corporação, que abrigava cerca de cinco mil homens, seria comandada pelo brigadeiro Ernest Benjamin, judeu de origem canadense.

Compunham a Brigada homens do Ishuv dos mais diferentes extratos sociais e, alguns deles, viriam a ocupar posições relevantes no futuro Estado de Israel.Destacava-se na tropa uma elite de intelectuais, entre os quais o poeta Yehuda Amichai, nascido em Wirzburg, na Alemanha, que emigrara para a então Palestina em 1935, com onze anos de idade. Desmobilizado da Brigada, lutou na Guerra da Independência de Israel e permaneceu no exército até a Guerra do Yom Kipur. Parte de sua poesia, consagrada no mundo inteiro, contém passagens autobiográficas, como esta: “Levei meus filhos ao alto da colina / aonde um dia travei batalhas / para que eles possam compreender as coisas que fiz / e perdoar-me pelo que não fiz”. Amichai, conhecido no Brasil através das muitas traduções de seus poemas feitas pelo escritor Millôr Fernandes, faleceu em 2000.

Outro poeta consagrado que serviu na Brigada foi Amir Gilboa, cuja obra serviu de inspiração para uma inteira geração de poetas israelenses na segunda metade do século passado. Também enfileirado na Brigada esteve Israel Tal, responsável pelo desenvolvimento e fabricação do tanque de guerra israelense conhecido como Merkavá. Talik, como era conhecido, chegou ao posto de general, tendo sido o principal formulador da doutrina militar que até hoje predomina nas Forças de Defesa de Israel. Participou de todas as guerras de Israel e serviu como conselheiro de Ben Gurion, Golda Meir e Itzhak Rabin. Faleceu em 2010, com 85 anos de idade.

Outra personalidade importante na Brigada, onde chegou ao posto de major, foi Chaim Laskov, veterano da Haganá e companheiro de Orde Wingate (ver reportagem “O Amigo Oculto”, Morashá, no 72), que, na qualidade de general, foi o quinto chefe do Estado Maior do exército de Israel e considerado um de seus mais brilhantes estrategistas.

A constituição oficial da Brigada Judaica mobilizou os judeus de todas as partes do mundo. Na Inglaterra, um capitão ilustre do exército britânico, chamado Edmond de Rothschild, pediu para ser transferido para a Brigada. Nessa ocasião, recebeu uma carta assinada por J.H. Hertz, rabino-chefe do Reino Unido, que dizia: “8 de novembro de 1944. Caro capitão de Rothschild. Soube que o senhor está considerando assumir o comando de uma unidade judaica da Palestina, que será a Brigada Judaica. Creio que lhe será uma excelente experiência organizar e liderar judeus – nunca uma fácil tarefa. Tendo em conta a nobre tradição de sua casa, será da maior importância que o senhor cumpra essa missão”. Rothschild respondeu: “Oficialmente a única bandeira da qual nos poderíamos valer, seria a Union Jack, mas também passamos a exibir uma bandeira azul e branca tendo ao centro a Estrela de David”.

A Brigada Judaica era formada por homens de toda a Europa. Havia refugiados da Alemanha, Áustria, Checoslováquia, Hungria, Romênia, Rússia, Polônia, judeus negros da Etiópia e um tanto do Iêmen, fora os que já eram residentes na Palestina. No total, cerca de cinquenta nacionalidades compunham a tropa.

Anos depois, Rothschild, promovido a major, escreveria: “No final de fevereiro fomos enviados para a frente do rio Senio, na Itália, aonde nos posicionamos no flanco sul. Os alemães estavam no flanco norte e nossa missão era desalojá-los para que os aliados pudessem dar sua arrancada decisiva na Itália. Ali chegamos um pouco antes de Pessach e durante toda a semana da festividade recebemos matzot (pães ázimos) em vez de pão comum e, na primeira noite, tivemos vinho de Rishon Le-Zion, da Palestina, enviado por meu tio, o Barão Edmond de Rothschild, juntamente com hagadot”.

No começo houve pouca atividade militar até que a Brigada desfechou uma cortina de fumaça, atravessou o rio e expulsou os alemães. O líder da travessia foi o coronel Ben Artze, comandante do primeiro batalhão da Brigada, que mais tarde ocuparia o posto de general no exército de Israel. Após a retirada nazista, a tropa tomou o rumo de Bolonha, dando apoio a uma Brigada Livre Italiana. Na área de Bolonha, a Brigada sofreu numerosas baixas, venceu os obstáculos e os combatentes choraram quando viram a bandeira azul e branca hasteada sobre um posto de comando alemão capturado. O escritor Howard Blum narra em seu livro sobre a Brigada que quatorze soldados alemães foram ali surpreendidos, antes do ataque final, enquanto dormiam. Um capitão, chamado Yoram Levy, acordou-os, gritando: “Fora, seus porcos! Os judeus chegaram!” Blum se reporta ao incidente ocorrido em Bengazi, quando os ingleses mandaram retirar a bandeira que os judeus haviam erguido, sob inspiração de um companheiro, chamado Israel Carmi. Os rapazes do ishuv afrontaram com violência um coronel britânico e foi pura sorte não ter ocorrido uma troca de tiros. Diz o escritor que não se tratou de uma simples teimosia, mas da consciência ancestral daqueles jovens judeus, certos de que estavam vivendo um momento histórico.

Em seguida, a corporação se deslocou até a cidade de Udine, que havia sido libertada pelo exército da Nova Zelândia. Foi durante esses percursos pela Itália que a Brigada manteve contatos ocasionais com as tropas da Força Expedicionária Brasileira, incorporada ao exército americano sob o comando do general Mark Clark. O oficial de ligação da Brigada chamava-se Yaacov Gotal e o da FEB, Oswaldo Aranha Filho. Os dois se reencontraram e se reconheceram, sob forte emoção, em 1975, quando Gotal assumiu o Consulado Geral de Israel no Rio de Janeiro.

Depois da tomada parcial de Bolonha, a situação não era confortável para os aliados por causa dos contra-ataques e da resistência alemã. A Brigada recebeu ordens para investir na área de Monte Grande, ao norte de San Clemente. Sua missão era assegurar aquela posição, o que foi feito com sucesso, facilitando o avanço aliado e assegurando a captura definitiva de Bolonha. Em seguida, a Brigada foi designada para atacar o Monte Ghebbio, onde havia uma concentração de pára-quedistas nazistas. Esta ação teve como testemunha o judeu Norman Lourie, correspondente da BBC. Ele escreveu que a Brigada enfrentava uma batalha penosa porque os alemães respondiam com bem equipados franco-atiradores. A Brigada acabou sendo vitoriosa, comandada pelo major Maxie Kahan, oriundo de Haifa. Naquela investida aconteceu um milagre. O soldado Shlomo Levins, do kibutz Tirat Zvi, foi atingido por uma bala que se alojou entre seu crânio e seu capacete. Ele não sofreu sequer um arranhão. Lourie acrescentou que as principais baixas sofridas pela Brigada foram devidas aos campos minados que tinham de ser percorridos. É emocionante sua narrativa sobre um soldado chamado Zelig Zankelis que pisou em uma das minas e caiu ao solo, terrivelmente ferido. Ele gritou para os companheiros: “Não, não venham me buscar porque há muitas minas por aí. Joguem uma corda que eu saio, me arrastando”. Morreu pouco depois. No Pessach de 1945, o mesmo Israel Carmi, teve a iniciativa de fazer um seder (noite comemorativa do Êxodo) dentro das trincheiras. O carregamento que traria as matzot e o vinho fora interceptado por uma barragem de fogo alemão. Mesmo assim, Carmi reuniu a tropa, recitou o kidush (oração), deu um pequeno gole de vinho, vindo não se sabe de onde de seu cantil e disse: “Celebrando este seder nós estamos tornando possível que outras noites iguais se sucedam por muitos séculos”.

Com o fim das hostilidades, em maio de 1945, a Brigada juntou-se às forças aliadas que ocupariam a Alemanha, sendo estacionada em Tarvisio, no norte da Itália, perto das fronteiras da Áustria e da Iugoslávia. Tarvisio tornou-se um ponto de passagem para milhares de refugiados e só então a tropa da Brigada começou a tomar pleno conhecimento do genocídio que se abatera sobre os judeus da Europa.
Carmi e um amigo, chamado Johanan Peltz, foram para a Polônia por conta própria, encontraram sobreviventes dos campos de concentração e chegaram até a aldeia onde Peltz havia nascido e onde toda sua família havia sido assassinada. Na volta, Carmi compôs uma patrulha de sua confiança, composta de militares judeus, e, em seguida, pediu para ser integrado ao serviço de inteligência britânico, ciente de que ali obteria informações sobre nazistas fugitivos. De fato, obteve uma extensa lista de criminosos de guerra e, embora não existam provas conclusivas, acredita-se que essa patrulha tenha eliminado cerca de duzentos oficiais da Gestapo nos meses subsequentes à 2a Guerra.

Carmi foi para Treviso, na região do Vêneto, onde as tropas SS tinham mantido um quartel-general durante toda a guerra. Soube, então, de um oficial nazista que ali vivia disfarçado e que fora responsável pelo confisco de bens, incluindo uma montanha de jóias e de obras de arte pertencentes a judeus italianos e por sua deportação. Para salvar-se, o alemão entregou a Carmi um dossiê contendo dezoito páginas com nomes de membros das SS. Carmi entregou a lista com os nomes menos expressivos à inteligência britânica e guardou os mais relevantes. Partiu em busca deles acompanhado por Peltz, Meir Zorea (que viria a ser general e deputado no Parlamento de Israel), Chaim Laskov, Abram Silberstein (futuro chefe do Departamento de Transportes do Exército de Israel), Marcel Tobias (também futuro general em Israel) e outros companheiros. Não há registros oficiais sobre as atividades desse grupo, mas sabe-se que ele só se importava com “criminosos acima de qualquer suspeita” e tinha como lema “agimos em nome do Povo Judeu”.

É certo, porém, que Carmi e Peltz obtiveram a informação de um oficial americano sobre um destacado membro da SS que se havia escondido numa igreja em uma pequena cidade da Polônia. Ambos entraram na igreja vestindo seus uniformes da Brigada, com a Estrela de David na manga, junto ao ombro esquerdo. Encontraram um grupo de crianças rezando e resolveram esperar até que estas se retirassem. Na saída, uma das meninas, de oito anos, aproximou-se de Carmi e, apontando seu emblema, disse: “Maguen David” (Estrela de David). Carmi perguntou em iídiche se ela era judia. Era. Toda a sua família tinha sido morta e ela fora acolhida por freiras católicas. O grupo ignorou o nazista que buscava e levou a menina para um acampamento de crianças judias na Itália.

A par das ações de Carmi e seu pessoal, muitos outros judeus, incluindo sobreviventes do Holocausto e ex-militares da Brigada, passaram a perseguir, para justiçar, os criminosos de guerra nazistas. Agiam em grupos de três ou quatro e se denominavam Esquadrão Din (din é a palavra em hebraico para justiça). Cumpriam essa tarefa ao mesmo tempo em que se engajaram na imigração ilegal para a então Palestina, coordenada pela Agência Judaica. Centenas de ex-brigadistas foram para a Bélgica e a Holanda com a missão de obter armas para o futuro Estado judeu e conduzir refugiados para a então Palestina. Mais de mil deles se encontravam a bordo do navio Fede, em um porto da Itália, rebatizado como Tel Hai. Os ingleses impediram que o navio zarpasse. Os refugiados começaram uma greve de forme e ameaçaram promover um suicídio coletivo. Por fim, os ingleses mandaram para o local um judeu do partido trabalhista, membro do Parlamento britânico, Harold Laski, que conseguiu liberar o navio.

Um dos criminosos mais infames capturados pelo Esquadrão Din foi o Dr. Ernst-Robert Grawitz, médido-chefe das SS. Dele havia partido a idéia da construção das câmaras de gás para apressar a execução dos judeus. Outro figurão preso foi Paul Glesler, chefe nazista em Munique. A ânsia judaica por vingança era tão marcante que um grupo liderado pelo poeta Aba Kovner teve a ideia de envenenar a água do reservatório central de Hamburgo (ver reportagem “A Epopéia dos vingadores”, Morashá, no 50). Israel Carmi se opôs, argumentando que os judeus não deveriam ser responsáveis por assassinatos em massa e, sobretudo, indiscriminados. Seguiu-se uma ácida discussão entre Kovner e Carmi, durante a qual Kovner explodiu: “Você é um covarde!”. Era a última das coisas que poderia ser dita a um bravo como Israel Carmi.

Quando, desde 1939, os ingleses se opuseram à formação de uma Brigada Judaica, diziam que os judeus usariam suas armas e experiência militar para lutar contra eles mesmos tão logo a guerra terminasse. Foi exatamente o que aconteceu. Mas, se a Brigada Judaica não tivesse existido, talvez o próprio Estado de Israel não chegasse a existir.

Zevi Ghivelder é escritor e Jornalista

Bibliografia:
Beckman, Morris, “The Jewish Brigade: An army with two masters 1944- 45”, editora Spellmount, 1998, Reino Unido
Blum, Howard “The Brigade: An epic story of vengeance, salvation and WWII”, editora Harper Perennial, 2002, EUA

Circular emitida pelo Major Edmond de Rothschild aos componentes da Brigada Judaica sob seu comando

Vocês são embaixadores de todo o Povo Judeu. Vocês vêm de Eretz Israel (Terra da Israel) e estão mostrando o que Eretz Israel é e será. Portanto espero mais de vocês do que se possa esperar de outras tropas.

1) Disciplina permanente e obediência às ordens de seus superiores.
2) Alto padrão de comportamento.
3) Apresentação impecável em serviço ou fora dele.
4) Alto padrão de limpeza e higiene.
5) Todos seus pertences limpos e bem organizados.
6) Alto padrão nas continências a seus superiores.
7) Comportamento apropriado em público e cortesia com as mulheres.
8) Alerta constante em missões de guarda.
9) Autoestima com relação ao seu regimento e à sua brigada.
10) Cumprir até a definitiva conclusão as tarefas que lhes sejam atribuídas.
11) Quando necessário, sacrifício por seus companheiros.
12) Honestidade nas relações com seus companheiros e com os civis.