Não se sabe ao certo se algum judeu passou pela Dinamarca durante a Idade Média. Na arte medieval dinamarquesa há imagens de judeus facilmente reconhecíveis pelo chapéu de ponta que usavam. No entanto, tais registros não constituem provas de sua passagem pelo país, podendo ser apenas um traço da iconografia medieval.

É provável que um pequeno número se tenha estabelecido na Dinamarca no século 16 com nomes cristãos. A bem da verdade, desde que, em 1536, a Dinamarca, assim como o restante da Península Escandinava, adotou a fé luterana como religião do Estado, ao menos oficialmente o país era fechado aos seguidores de qualquer outra denominação religiosa. Judeus, católicos e adeptos de outras correntes protestantes enfrentavam duras punições, inclusive a pena de morte, quando encontrados dentro dos domínios da Coroa.

No final do século 16, alguns judeus começaram a atuar no comércio em áreas próximas à fronteira e os reis dinamarqueses se utilizavam dos chamados “Judeus da Corte” – hofjoder, na língua local – quando queriam levantar empréstimos para sanear suas finanças ou empreender novos projetos ou mesmo levantar capital para fins bélicos. Em 1592, Jochim Jode (Joaquim, o judeu) registrou-se na cidade de Elsimore, sendo considerado o primeiro judeu a se estabelecer oficialmente no país.

Na época, os domínios da Coroa dinamarquesa incluíam não apenas o território do atual Reino da Dinamarca, mas também a Noruega, a Islândia, o sul da Suécia e o norte da Alemanha, além do ducado de Schleswig-Holstein1.

Em 1616, numa tentativa de acabar com o comércio de Hamburgo, o rei da Dinamarca, Christian IV, funda, às margens do rio Elba, a cidade de Gluckstadt. Convida Albert Dionis, abastado judeu sefaradita de Hamburgo, para administrar a Casa da Moeda em Gluckstadt, responsável por cunhar as moedas reais. Três anos depois, visando estimular a economia da cidade, Christian IV estende o convite a outras 30 famílias sefaraditas. Em 1628, os judeus da cidade conseguem autorização para ter um cemitério e se reunir em residências para os serviços religiosos.

As primeiras comunidades judaicas a ficar sob o domínio da Coroa dinamarquesa foram as das cidades ao norte de Hamburgo, depois de o rei Christian IV adquirir, em 1640, a área que pertencia aos Condes de Schaumburg. Altona, situada às margens do rio Elba, foi uma delas. No início do século 16, quando a cidade ainda estava sob jurisdição dos Condes de Schaumburg, foi fundada a comunidade judaica local. Esta rapidamente se desenvolve, em decorrência das severas restrições referentes ao número de judeus que tinham permissão de viver em Hamburgo. Em agosto de 1641, Christian IV concede à comunidade judaica de Altona sua Carta de direitos.

Mais um passo em direção à criação de uma comunidade judaica dinamarquesa é dado em 1657, quando o sefaradita Gabriel Gomez, um “judeu da Corte”, persuade o novo rei da Dinamarca, Frederik III, a permitir o estabelecimento de sefaradim que desejassem atuar no comércio nas áreas controladas pela monarquia. A permissão, no entanto, dizia respeito apenas aos “judeus portugueses”, sendo proibida a entrada de “judeus alemães” (ashquenazim), a menos que portassem um salvo-conduto real.

Após a Guerra dos 30 Anos e o desastroso conflito que a Dinamarca travou com a Suécia, em 1658, e que lhe custou seus territórios mais prósperos, o país viu-se diante de um caos econômico, militar e político. Dois anos mais tarde, a Dinamarca se torna uma monarquia absolutista e mercantilista. Visando incentivar o desenvolvimento comercial e industrial, o rei passa a estimular a vinda de imigrantes que poderiam trazer capital ou desenvolver novas iniciativas no país, entre os quais, os judeus.

A Coroa preferia ver o estabelecimento em seus domínios de “judeus portugueses”, mas acabou permitindo a entrada de seus irmãos “alemães”, desde que possuíssem recursos financeiros ou fossem comerciantes de porte. Na realidade, a maioria dos que, no final, instalaram-se na Dinamarca, eram asquenazitas, muitos dos quais vindos de Hamburgo e nem sempre abastados. Trabalhavam, principalmente, no empréstimo de dinheiro e no comércio de roupas usadas e de produtos “exóticos”, como café, chá e chocolate. Determinadas áreas de negócios passaram a ser chamadas de “comércio judaico”. Esta prática só foi oficialmente abolida depois que os judeus conquistaram direitos civis, quase dois séculos mais tarde, em 1814. As bases para uma presença judaica na Dinamarca começam a ser criadas a partir de 1667, quando os judeus de Altona recebem permissão para viajar pelo país e atuar no comércio de forma mais ampla. Até o final da década já podiam ser encontrados mercadores e financistas, além de alguns “judeus da Corte”, que desempenhavam importante papel financeiro para a Coroa. Havia, também, alguns que viviam nas províncias – em Ribe, Nakskov, Nyborg. Estes, apesar de não serem numerosos, desempenharam um papel estratégico para o crescimento da vida econômica e comercial da região.

Após 1675 um grupo de “judeus alemães”, estabeleceu-se em Fredericia. As autoridades haviam adotado uma política de tolerância religiosa para estimular o povoamento desta cidade construída para proteger as áreas vulneráveis entre a Jutlândia e as ilhas dinamarquesas. Em 1682, a comunidade judaica de Fredericia, a mais antiga dentro dos limites da Dinamarca atual, recebeu autorização para a realização de serviços religiosos, mas teria que esperar até 1719 para construir uma sinagoga.

Em Copenhague, a maior cidade  do reino e onde estava sediada a Corte, alguns fabricantes e comerciantes de tabaco tinham autorização para lá se estabelecer a partir da década de 1670, sem, no entanto, ter qualquer concessão de caráter religioso. Estima-se que na época viviam em Copenhague apenas 15 judeus e suas famílias, muitos ilegalmente, algo bastante comum na época. Em sua maioria eram judeus “alemães” originários de Hamburgo e de Altona. Na época, as comunidades judaicas de Hamburgo/Altona e de Wandsbeck, em Schleswing, formavam um importante centro judaico. É nesse período que foram criados fortes vínculos entre os judeus na Dinamarca propriamente dita e de Altona e Hamburgo. Apesar de seu reduzido número, os judeus de Copenhague eram abastados e desempenhavam um importante papel no comércio da cidade. Em 1684, Meyer Goldschmidt e seu sócio, Israel David, joalheiros de Corte originários de Hamburgo, obtiveram permissão real para “conduzir orações matutinas e vespertinas em sua residência com a condição de que tais cultos se realizassem a portas fechadas e sem sermões”. 

Nos 50 anos que se seguiram, os serviços religiosos comunitários continuaram a ser realizados na residência de Goldschmidt. A permissão de 1684 é considerada o marco da fundação da comunidade judaica de Copenhague. Dez anos mais tarde, os judeus são autorizados a adquirir um terreno para um cemitério, em Mollegade, o mais antigo na Europa do Norte.

Os judeus portugueses, em número bem menor que os asquenazitas, só conseguem permissão para realizar seus próprios serviços religiosos em 1695. Há documentos que atestam que na ocasião, o judeu português de grandes posses, Samuel Teixeira, estava em Copenhague e os judeus sefaraditas reuniram-se para as preces, ainda que não tivessem autorização para isso. Acabaram presos, mas foram libertados imediatamente e, logo depois, obtiveram permissão para celebrar seus próprios serviços religiosos.

Estima-se que, no final do  século 17, a população total do  Reino da Dinamarca fosse em torno de 600 mil habitantes e  que o número de judeus que lá vivia ainda fosse pequeno. Até 1700 a Coroa emitira 26 licenças de residência para as cidades de Altona, Gluckstadt e Hamburgo; 17 para Copenhague e 15 para Fredericia, além de algumas poucas para judeus que viviam em outras cidades espalhadas pelo reino. O total da população judaica na Dinamarca, no entanto, era bem maior do que aparenta ser, pois cada licença incluía familiares próximos e distantes e empregados, sem contar que havia um número considerável de ilegais no país.

Devemos ser cautelosos, no entanto, ao considerar os judeus da Dinamarca como um grupo populacional estável, pois ao longo de toda a história do país, muitos foram os judeus que lá se estabeleceram apenas temporariamente. Em várias instâncias, por exemplo, quando o antissemitismo em terras germânicas escapava ao controle, judeus alemães acabaram se refugiando em Gluckstadt, Altona e outros pontos. Já naquela época era conhecida a tolerância da monarquia dinamarquesa.

Glückel de Hamelin(1646 –1724), mulher de negócios e a mais antiga memorialista e cronista em língua iídiche, relata em suas memórias como ela e sua família tiveram que deixar Hamburgo, sua cidade natal, para Altona, então parte da Dinamarca, quando se acirraram as manifestações antijudaicas.

Vida judaica no século 18

No limiar do século 18, as condições de vida dos judeus dinamarqueses eram boas, sem dúvida melhores do que as de seus correligionários em outros países da Europa. Haviam conseguido garantir sua presença em Copenhague e outras cidades. Administravam com bastante liberdade sua vida religiosa e social e não eram obrigados a viver em guetos nem tampouco usar vestimentas diferentes. Os mais abastados levavam uma vida confortável e desempenhavam um papel bastante significativo na sociedade dinamarquesa. Viviam, no entanto, culturalmente isolados da sociedade maior, pois apesar das relações comerciais que vigoravam entre cristãos e judeus, era limitado o contato social entre os dois grupos.

A relativa tolerância da Coroa não significava, porém, que não houvesse uma série de restrições que limitavam a vida dos judeus. Entre outros, não podiam pertencer às guildas, servir exército ou estudar em universidades, nem tampouco casar-se com cristãos. Além de serem inúmeras as restrições em relação às suas atividades comerciais, os judeus que quisessem entrar ou se estabelecer na Dinamarca, necessitava de permissões, tendo que comprovar seu status financeiro e sua capacidade de construir uma casa ou abrir um negócio. Ademais, tinham ainda que pagar uma taxa especial à polícia destinada à busca, prisão e expulsão dos judeus ilegais da Dinamarca.

Sua vida piora a partir da primeira década do século18. A peste atingira a Dinamarca por volta de 1711 e, à medida que a miséria e a morte se espalham pelo país, cresce o medo e a desconfiança da população cristã em relação aos judeus e, consequentemente, o antijudaísmo “tradicional”. Não tarda para que sejam expostos a insultos, humilhações e ataques físicos. Não há nada que indique que as autoridades apoiavam esse tipo de atitude; pelo contrário, registros da época mostram que, de modo geral, procuravam dar aos judeus a proteção da lei. Em 1722, por exemplo, proíbem a população de insultá-los nas ruas. Mas, o clima popular antijudaico continuou forte e, quando seis anos depois, um grande incêndio destrói parte de Copenhague, prendem vários judeus sob a acusação de tê-lo deflagrado.

A política da Coroa continua sendo positiva face aos judeus, pois os considerava uma minoria benéfica para a economia. Quando havia alguma mudança nessa atitude, isso se devia a pressões que o governo sofria por parte das guildas, que temiam a competição judaica e, mais ainda, da Igreja luterana. Durante todo o século 18 houve tentativas por parte do clero luterano de convertê-los. Em Copenhague, em 1728, por exemplo, foram obrigados a assistir sermões nas igrejas. Os judeus protestaram veementemente e o assunto só foi abandonado quando, tempos depois, uma igreja foi destruída e incendiada.

Apesar do clima antijudaico, durante o século 18 cresceu o número de judeus na Dinamarca. Aumenta, também, o dos chamados “judeus indesejados”, ou seja, sem recursos financeiros, que conseguiam entrar no país. Ao longo desse período, as autoridades fizeram uma série de tentativas para limitar sua entrada. Muitas vezes, acabavam permitindo sua permanência, pois como a Carta do Comércio de 1757 constatava: “Reconhecemos que se trata de pessoas desafortunadas, infelizes; são odiados por toda parte e seus direitos civis lhes são negados na maior parte da Europa”.

É nesse período que a comunidade judaica de Copenhague se torna a maior do país. Viviam na cidade, em 1726, 65 “famílias” judias e, em 1780, estima-se em 700 o número de judeus, a maioria asquenazitas. Era uma comunidade abastada: 30% pertenciam à classe alta e 40% à classe média alta. A primeira sinagoga foi inaugurada em 1766, após longas negociações, em Laederstraede, e manteve-se como ponto central da comunidade asquenazita por 30 anos, até ser destruída durante o grande incêndio de Copenhague, em 1795.

Durante o século 18, havia judeus vivendo em outros 16 centros urbanos, espalhados nas diversas províncias do reino. A população judaica em Schleswing era numerosa, sendo Hamburgo e Altona ainda o ponto focal. Até meados do século a maioria dos que viviam na Jutlândia ainda residiam em Fredericia, mas, a partir das últimas décadas, a cidade de Randers, mais ao norte, torna-se o mais importante centro para os judeus da Jutlândia.

A partir da metade do século 18, as condições comerciais e econômicas tornam-se mais favoráveis e, nas últimas décadas, a Dinamarca passou por um período de grande prosperidade, devido a seu status de neutralidade, que lhe permitia comerciar com os dois lados das várias guerras da época. A frota mercantil dinamarquesa e o comércio da colônia registraram uma expansão significativa. Nesse período, muitos judeus puderam erguer importantes empresas, sendo que um bom número destas importantes casas comerciais e industrias de manufatura.

Iluminismo e emancipação

A partir das últimas décadas do século 18, os judeus na Dinamarca vão passar por mudanças radicais. Numericamente, a população judaica crescera em relação ao tamanho da população geral. Em 1790, dos 90 mil habitantes de Copenhague, 1.200 eram judeus, além de um grande número de “ilegais”.

As novas correntes de pensamento racionalista, o Iluminismo, e os acontecimentos na Alemanha foram cruciais para o curso dos eventos na Dinamarca, inclusive para os judeus. Também crucial foi a influência de Moisés Mendelsohn e da Haskalá sobre os judeus do país. A Haskalá, nome dado ao Iluminismo Judaico, incentivava a integração com a sociedade europeia e a valorização da educação secular.

No final do século 18, havia elementos dentro da comunidade judaica de Copenhague que mantinham fortes vínculos, inclusive de parentesco, com Mendelsohn. Eles defendiam o fim de seu isolamento através de melhoria no nível educacional e o uso do idioma dinamarquês. Ao longo de todo esse período, foi travada uma batalha acirrada entre os que defendiam a reforma e os tradicionalistas.

De sua parte, a monarquia estimulava a integração, e os judeus começaram a ganhar igualdade na maioria dos setores da vida nacional. Em 1788, eles puderam fazer parte das guildas; em 1798, casar com cristãos e, em 1809, alistar-se no exército e entrar nas universidades. Apesar desses avanços, ainda havia uma forte discriminação social. Contudo, é inegável que, aos poucos, surgia uma comunidade mais moderna. Em 1805 foi aberta uma escola para meninos e, em 1810, uma para meninas carentes, sendo implantada uma política de concessão de bolsas de estudos.  A escola de meninas recebeu o nome de Carolineskolen, em homenagem à filha menor do Rei. Nas duas escolas, o dinamarquês era lecionado, com o objetivo de fazer com que o iídiche deixasse de ser a primeira língua dos judeus, a sua mameluschen – sua língua materna.

Vários fatores influíram para que, em 1814, a Dinamarca finalmente emancipasse os judeus do país. O próprio rei, Frederick VI, era partidário da emancipação, influenciado, como ele próprio afirmara estar, pela emancipação dos judeus franceses e a política de Napoleão em relação aos judeus da Europa. Ademais, durante o caloroso debate público realizado em 1813 sobre a “Questão Judaica”, importantes personalidades tinham-se pronunciado a favor da igualdade. Tampouco se pode ignorar o fato de que, em 1814, a Coroa teve que pedir vultosos empréstimos a banqueiros judeus. As Guerras Napoleônicas e os ataques britânicos a Copenhague, em 1801 e em 1807, haviam marcado o fim da era de prosperidade, e com os ingleses controlando as vias marítimas, o país foi à bancarrota em 1813.

O decreto para a emancipação dos judeus e a concessão de seus direitos de cidadania foi finalmente aprovado em março de 1814. No entanto, ainda havia restrições – os judeus não podiam ser membros do governo central e tampouco podiam ser eleitos para as assembleias estaduais.

O judaísmo passou a ser denominado de “Fé Mosaica” – que ainda é seu nome oficial – e o dinamarquês substituiu o hebraico nos documentos comunitários. Além disso, o governo adotou várias medidas para alinhar, no aspecto administrativo, a “Fé Mosaica” com a Igreja Luterana do Estado. As mudanças resultaram no enfraquecimento da autoridade religiosa e da autonomia comunitária.

Apesar dos avanços no status civil, a população cristã ainda sentia uma forte antipatia pelos judeus.  O antissemitismo acabou acerbando-se em grande parte por causa da precária situação interna, pois após a catástrofe econômica de 1813, o desemprego se alastrara provocando a insatisfação com a monarquia. Muitos viam os judeus como “responsáveis” pela péssima situação econômica ou como partidários da monarquia.

Em agosto de 1819, eclodem na Bavária violentos pogroms. Os chamados “Tumultos Hep-Hep”2 logo se espalharam pelo Norte e atingiram Hamburgo e Altona. Em setembro, foram registrados violentos distúrbios contra a população judaica em várias outras cidades dinamarquesas, inclusive Copenhague. A violência durou cinco meses, período no qual os judeus foram atacados, suas lojas e residências destruídas e saqueadas. Em várias ocasiões, o governo foi obrigado a interferir para fazer voltar a calma. A seriedade dos ataques antissemitas tiveram consequências dramáticas sobre os judeus. Alguns chegaram a buscar na assimilação uma alternativa segura e, depois de 1820, cresce o número de conversões ao luteranismo.

Da emancipação à assimilação

Em 1820, a população judaica era ainda era pequena, numa população total de 1,2 milhão de pessoas, apenas 3.907 eram judeus, a maioria dos quais, 60%, viviam em Copenhague. No entanto, apesar do fato de não ser uma minoria numericamente significativa, suas contribuições ao crescimento e desenvolvimento do país foram importantes. Eles se destacaram nas finanças, ciências, artes, literatura e jornalismo.

Tornaram-se importantes patronos e colecionadores de arte. Um sinal dessa nova autoconfiança foi a construção, em 1833, em Copenhague, de uma grandiosa sinagoga, em Krystalgade. Projetada pelo arquiteto judeu alemão, G. F. Hetsch, seu estilo era uma mescla de orientalismo com o clássico.

Na década de 1830, novas mudanças iriam sacudir a Dinamarca. O movimento liberal-nacionalista dinamarquês ganhou impulso nesse período e, após as Revoluções europeias de 1848, a Dinamarca se torna uma monarquia constitucional em junho de 1849. Com a nova constituição, os judeus têm garantida por lei a igualdade de direitos.

A emancipação trouxe consigo tanto consequências positivas quanto negativas em termos de mudanças sociais e econômicas. A aproximação com a sociedade maior levou não apenas à integração, mas também à assimilação. Ao longo do século 19, os inúmeros casamentos mistos e as conversões eram uma ameaça concreta à continuidade judaica. O número de judeus do país diminuía constantemente. Em 1834, eram mais de 4 mil; em 1901, menos de 3.500. A comunidade de Copenhague ficou extremamente reduzida nos últimos anos do séc. 19 em virtude de sua acentuada integração e assimilação.

O conflito entre reformistas e tradicionalistas que envolveu a comunidade durante décadas resultou num meio-termo “conservador”, que procurou manter muitos elementos tradicionalistas. Apesar disso, os segmentos mais ortodoxos acabaram por se afastar, formando uma nova congregação na segunda metade do século.

O judaísmo fora de Copenhague, nas províncias, também passou por transformações. Em 1867 Altona tornou-se parte do Reino da Prússia. Em 1864 a Prússia juntara-se à Áustria em uma guerra contra a Dinamarca pelo domínio dos ducados de Schleswig e Holstein. Após a Dinamarca sofrer uma grande derrota, teve que ceder os Ducados de Schleswig, Holstein e Lauenburg à Prússia e Áustria, respectivamente. Com a perda de Altona, o judaísmo dinamarquês perdeu uma de suas maiores comunidades. Simultaneamente, o ponto central do judaísmo da Jutlândia fora transferido para Randers.

Na segunda metade do século 19, ainda havia judeus vivendo em várias cidades, mas em números cada vez menores. Muitos haviam-se assimilado, enquanto outros se haviam mudado para Copenhague. Como resultado de todo esse processo, pode-se dizer que, no limiar do século 20, a vida judaica nas províncias dinamarquesas estava em fase de desaparecimento.

Século 20

Eventos ocorridos fora desse país ao longo do século 20 mudaram a composição de sua comunidade judaica. Antes que a assimilação fosse total e levasse ao desaparecimento dos judeus dinamarqueses, novos imigrantes, judeus vindo do Império russo, começaram a se estabelecer no país. O pogrom em Kishinev, em 1903; a guerra russo-japonesa de 1904; a Revolução Russa de 1905 e, finalmente, a Revolução Bolchevique de 1917, enviaram centenas de milhares de judeus da Europa Oriental, que falavam iídiche, nessa marcha – mais uma na longa história judia de eternas caminhadas.

A maioria desses judeus partiu para a América do Norte ou para a África do Sul, ao passo que outros, que não dispunham de recursos para tanto, optaram pela Escandinávia, talvez temporariamente, até juntar o suficiente para as passagens marítimas ou permanentemente. Os imigrantes, em sua maioria jovens que haviam fugido do czarismo da Rússia, com a esperança de recomeçar uma vida melhor, eram “incentivados” a seguir viagem pelas autoridades e pelos próprios judeus dinamarqueses. As autoridades receavam que os recém-chegados fossem socialistas revolucionários e a comunidade judaica da Dinamarca, liderada pelas prósperas famílias que haviam vivido na região por gerações e, em forte processo de assimilação, temiam que sua presença fosse resultar num crescimento do antissemitismo latente.

Em números absolutos, esta emigração não foi expressiva, especialmente se os comparamos a quantidade de judeus que foram para os Estados Unidos. Mas o é se levarmos em consideração o número total de judeus que viviam na Dinamarca, à época. Dos cerca de 20 a 30 mil judeus do Leste europeu entraram na Dinamarca no início do século 20, cerca de 3.500 se estabeleceram permanentemente em Copenhague, dobrando a população judaica de então. Começava uma nova fase na história do judaísmo dinamarquês.

1 Schleswig und Holstein - localizado ao norte da Alemanha, por mais de 400 anos sua história esteve intimamente ligada à da Casa Real da Dinamarca.

2 Hep!Hep! Grito de provocação antissemita, típico dos pogroms da Bavária, durante o período da emancipação judaica. Atribuiu-se sua origem ao acrônimo do brado cruzado “Hierosolima Est Perdita”, mas esta teoria não vingou e talvez seja simplesmente o grito dos pastores alemães na hora de reunir o rebanho.

Bibliografia:
Jørgensen , Mirjam Gelfer, Jews in Danish Art, the
Society for the publication of Danish Cultural Monuments, Ed. Rhodos International Science Art Publishers, Patrono: Sua Majestade, a Rainha Margarete II da Dinamarca.
The Jewish community in Denmark: history and present status, ensaio publicado na revista "Judaism: A Quarterly Journal of Jewish Life and Thought“, 22 de março de 1998