A festa de Chanucá vem-nos lembrar uma grande filosofia de vida. Os hashmonaim, minoria absoluta e totalmente despreparada para enfrentar qualquer guerra, acabam vencendo o exército helenista. Isto só foi possível graças à firme decisão de tentar vencer, apesar de, aparentemente, terem mínimas chances.
Consta na Torá: "Veasú li mikdash veshachanti betocham" - e me farão um santuário e morarei entre eles. Diz o Midrash que quando D'us
lançou esta ordem, Moshé Rabenu, espantado, perguntou: "Como é possível ao ser humano construir uma morada para o Eterno? Nada neste mundo pode conter o Todo-Poderoso!" Disse D'us a Moshé: "Saiba que Meu pedido é proporcional à capacidade do povo e não ao que Eu realmente mereço...!"
Daí, segundo o Chafets Chaim, concluímos que o Todo-Poderoso exige do ser humano apenas aquilo que está dentro de seu alcance e de acordo com suas possibilidades. Nunca D'us irá querer que o ser humano faça algo que lhe seja impossível.
Nossos sábios lembram-nos na Ética dos Pais (cap. 2:16): "Você não tem obrigação de concluir o trabalho (referindo-se ao serviço do Todo-Poderoso), porém você não está livre para não o realizar".
Isto significa que a pessoa não deve desistir de iniciar o trabalho espiritual alegando que é impossível terminá-lo, já que não lhe foi ordenado concluir o trabalho, mas apenas iniciá-lo. O Todo-Poderoso pede e exige do ser humano apenas o esforço, não o resultado. Por isso, o ser humano não está livre de deixar de realizar a sua obrigação - cada um deve agir de acordo com as suas possibilidades. E é justamente isto que nossos sábios nos ensinam: "Quando o ser humano se santifica ainda que pouco, o Altíssimo, nos céus, santifica-o muito".
Portanto, apesar de ser impossível ao ser humano construir um santuário para o Todo-Poderoso, D'us nunca exigiu isto dele. O Altíssimo pede que cada um de nós faça o que está a seu alcance. Quando cada um fizer tudo o que puder, isto será a moradia que D'us almejou e assim Ele, sem dúvida, fará pairar entre nós a sua Divina Presença.
Nossos sábios instituíram uma reza para o término de um estudo de um tratado de Talmud: "Eu me esforço no meu estudo e todos os outros trabalhadores fazem o mesmo - eu me esforço e sou recompensado e eles se esforçam sem receber nenhuma recompensa" (Berachot 28:2).
Esta reza necessita uma profunda análise. Será que um sapateiro, um alfaiate ou qualquer outro profissional não receberá o seu salário no final de um dia de trabalho ou ao concluir o serviço? Será que alguém duvida da recompensa reservada para quem a merece? Então, como dizemos nesta oração que os outros operários não recebem recompensa?
Não há dúvida que todo aquele que fornecer um trabalho será finalmente pago pelo serviço realizado. Porém, o pagamento será pelo resultado e não pelo esforço. Por exemplo, um alfaiate se esforça, durante vários dias, para cortar o tecido para a confecção de um terno, mas percebe que, infelizmente, os modelos talhados não ficaram de acordo com o tamanho desejado. O alfaiate não receberá o pagamento, apesar de ter trabalhado durante algumas horas ou mesmo alguns dias. Se ele não entregar o terno pronto, nas medidas encomendadas, ele não terá cumprido o seu compromisso. É certo que ele trabalhou e se esforçou durante vários dias, porém o que conta para o cliente é o resultado.
No mundo espiritual a coisa é bem diferente. Aquele que se esforça para estudar Torá e cumprir um mandamento, mesmo se não tiver êxito em seu esforço, receberá a recompensa. Isto porque tentou e se empenhou.
Na Ética dos Pais (cap. 4) consta a seguinte passagem: "Aquele que ensina uma criança é comparado à tinta usada para escrever em uma nova folha de papel, e aquele que ensina um idoso é comparado à tinta usada em uma folha de papel que já foi usada e seu conteúdo apagado". Isto significa que ensinar jovens é sempre muito mais vantajoso, pois estes terão facilidade em lembrar o que estudaram enquanto que os mais idosos encontrarão dificuldades de memorização.
Isto, a priori, pode causar um certo desânimo para os menos jovens que desejam estudar, enriquecendo sua bagagem espiritual. Ficarão desestimulados por pensar que não irão conseguir memorizar o estudo e todo o esforço será praticamente em vão.
De acordo com que foi analisado acima, concluí-mos que o que conta no judaísmo é o esforço. Mesmo se a pessoa não tiver sucesso nos seus empreendimentos, a recompensa pelo desempenho está garantida.
O Talmud conta que Moshé Rabenu teve dificuldades para confeccionar a Menorá do Santuário. O Todo Poderoso teve que lhe mostrar, numa visão profética, todos os detalhes que envolviam tal fabricação. Após perceber que Moshé não estava captando as orientações e que a tarefa parecia ser muito além do seu alcance, o Todo-Poderoso lhe ordenou atirar o ouro no fogo. Milagrosamente surgiu a Menorá Sagrada.
Por que D'us tinha que mostrar a Moshé todos os detalhes da fabricação da Menorá se, na realidade, ele não conseguiria confec-cioná-la sozinho, sem a intervenção Divina?
Porém, este é o ensinamento da Torá. Devemos saber que o ser humano tem que se esforçar para realizar o que está a seu alcance, o resto vem posteriormente por si só. Isto é válido para todas as mitzvot. Quando a pessoa se esforça para fazer o máximo, o resto fica por conta de D'us.
O Midrash Rabá nos relata: "Disse D'us ao povo de Israel: Façam-me uma abertura bem pequena, como o buraco de uma agulha, e eu abrirei para vocês portões por onde passem carruagens e carroças..." O Todo-Poderoso aguarda que a pessoa dê o primeiro passo; aí, então, Ele completa e faz o que for necessário.
Quando Moshé Rabenu presenciou a revelação de D'us no Monte Sinai, ele quis se aproximar para ver tão fantástica visão, querendo entender por que o arbusto não se consumia.
Rabi Yochanan diz que Moshé, naquela oportunidade, deu três passos à frente para contemplar a visão. Resh Lakish diz que ele apenas estendeu o pescoço. Disse D'us a Moshé: "Você se esforçou tanto para ver, que vou-lhe revelar o que quer saber". D'us, então, o chamou de dentro do arbusto ardente.
É difícil acreditar que Moshé mereceu uma tal revelação Divina apenas por ter feito um esforço tão pouco significativo - deu meros três passos ou, de acordo com a segunda opinião, apenas estendeu o pescoço. Um gesto tão simples e, em contrapartida, uma recompensa tão elevada?
Porém é isto mesmo que nossos sábios nos ensinam no Talmud (Meguilá 6:2): "Yagaati Umatsati" - Esforcei-me e por isso acabei encontrando um bom resultado. Metsiá, em hebrai-co, significa um achado. Aquele que se empenha, teoricamente deve receber algo proporcional ao esforço investido. Porém o Talmud nos ensina que aquele que se esforça acaba encontrando, isto é, bem além do que o esforço investido, como um achado que a pessoa encontra sem esforço nenhum.
Conta o Midrash que durante os nove meses que o bebê se encontra no ventre da mãe, um anjo lhe ensina toda a Torá. No momento do nascimento, o anjo dá um tapa na criança e a faz esquecer-se de toda a Torá. É muito difícil entender este comportamento tão estranho do anjo. Se a criança já se esforçou e estudou toda a Torá, porque tem que esquecer tudo o que o próprio anjo lhe ensinou?
O motivo pelo qual D'us faz questão que a criança estude a Torá inteira antes do nascimento é para nos lembrar de que a Torá não é algo estranho e distante da pessoa, pois a criança já estudou esta mesma Torá no ventre materno. A Torá é algo conhecido pela criança e foi parte integrante de seu ser durante nove meses. Ela irá posteriormente esquecer o seu estudo porque o que conta aqui neste mundo é, justamente, o esforço. A vida é um mistério que o ser humano tem que descobrir. Sabendo, de antemão, de toda a mensagem Divina - a Torá, a pessoa não teria mais nenhum motivo para continuar a vida.
A dificuldade que a pessoa encontra em realizar as tarefas e as boas ações, é uma indicação de que aquilo é necessário e muito importante para o cumprimento de sua missão e para o alcance da perfeição. Uma boa imagem para se entender isto é o efeito da fisioterapia.
Uma pessoa machucou o braço e este ficou imobilizado durante três meses. Sem dúvida, a pessoa terá muita dificuldade em mexer o braço após retirar o gesso. Na sua primeira sessão de fisioterapia, este indivíduo certamente reclamará de uma forte dor ao fazer os movimentos exigidos. Para se livrar de tal dor, ele sugere ao fisioterapeuta fazer os exercícios necessários com o segundo braço, que nunca foi machucado. Porém, obviamente, fazer os exercícios com o outro braço não resolveria o problema. O fato de sentir dor e ter dificuldades em realizar os movimentos no braço enfraquecido demonstra o quanto isto é importante para o seu restabelecimento. Quanto mais difícil e doloroso, mais rápida será a plena recuperação.
De forma geral, o ser humano encontra mais êxito nas coisas nas quais investiu um certo esforço do que nas que recebeu facilmente. As primeiras Tábuas da Lei entregues ao povo de Israel eram obra de D'us, fabricadas de um material precioso, pelo próprio Criador. Infelizmente elas não tiveram uma longa existência e foram quebradas por Moshé Rabenu ao ver que o povo de Israel tinha-se desviado do caminho de D'us, curvando-se ao Bezerro de Ouro. Na segunda vez, o Todo-Poderoso ordenou a Moshé que talhasse novas Tábuas e Ele escreveria os mesmos mandamentos que constavam das primeiras. Estas segundas Tábuas, obra da mão de Moshé Rabenu, existem até hoje. Isto reforça a idéia de que o fruto de um grande empenho só pode ser o sucesso e a perpetuidade.