Querido amigo Arik, É muito difícil, na verdade impossível, imaginá-lo num leito de hospital inerte e entregue aos desígnios de D-us.
Quem acompanhou suas ações na guerra e na paz, desde os primórdios de Israel até os dias atuais, estava acostumado a vê-lo na linha de frente, volumoso, forte como um touro e audaz como uma águia, pronto para o que desse e viesse. Agora, não são somente os israelenses, mas é todo o povo judeu que carece da sua presença impositiva, de suas posições inarredáveis e, inclusive, tantas vezes rebeldes e turronas. Mas, o fato é que jamais, em seus 78 anos de vida, você pensou apenas em você. Esteve sempre com a mente e o coração voltados para todos nós, judeus, dentro e fora de Israel.
Muito do que vou escrever aqui não lhe será novidade porque tive como base sua própria autobiografia, que acabo de reler, desta vez com maior acuidade. Entretanto, relatarei algumas passagens que julgo importantes, porque a maioria das pessoas, no mundo inteiro, desconhece os meandros da sua história e a mídia lhe foi injusta como raras vezes a tenho visto ser, com um homem público no mundo civilizado, que nunca trilhou outro caminho senão o da democracia. Não faltou quem o rotulasse de "criminoso de guerra", "pária internacional" ou "fomentador de guerras". Entretanto, bastou que você tomasse uma iniciativa concreta em direção à paz com os palestinos, como a retirada unilateral de Gaza, para que passassem a vê-lo como um autêntico Estadista, como se você tivesse executado um passe de mágica, sem levar em conta que a sua vida sempre foi marcada por atitudes desprendidas e pragmáticas, tanto no campo militar como no político.
A acusação mais perniciosa que lhe fizeram foi a de ter detonado a segunda intifada, em setembro de 2000, depois de percorrer a pé o Monte do Templo, onde estão as mesquitas de Al-Aksa e do Domo da Rocha, em Jerusalém. Qualquer pessoa, com um mínimo de bom senso, sabe que sua única intenção foi a de evidenciar que, em tempo algum, nenhum judeu poderia ser impedido de estar em qualquer lugar de Jerusalém. Você certamente tomou conhecimento de uma declaração do então ministro palestino das comunicações, no dia 3 de março de 2001, ao jornal Al-Safir: "Quem pensa que a intifada eclodiu por causa da presença de Sharon junto à mesquita de Al-Aksa, está errado. Esta intifada já estava planejada, antes ainda da volta de Arafat das negociações de Camp David, onde ele virou a mesa para o presidente Clinton".
É muito sensível a maneira pela qual você escreve sobre sua infância no moshav (cooperativa agrícola) Kfar Malal, ao lado de seu pai, trabalhando no campo, raiz de sua segunda profissão, talvez a que sempre preferiu, a de fazendeiro. Depois, veio a sua participação na Guerra da Independência, na qual se destacou pela capacidade de liderança, apesar de ter pouco mais de 20 anos de idade. Em função disso, deram-lhe o comando da Unidade 101, encarregada de caçar terroristas usando a tática, até hoje empregada, de demolir suas casas. Foi por causa disso que lhe adveio a primeira adversidade: o ataque ao vilarejo de Kabia, na Jordânia. É desde quando data a fama de sua agressividade. Cumprida aquela missão, você só tomou conhecimento do que ali tinha de fato acontecido no dia seguinte, ao ouvir o relato de uma rádio jordaniana: a morte de 69 civis. Você ficou perplexo. Até então, as investidas israelenses contra terroristas se limitavam à periferia dos alvos. Durante o seu ataque, os moradores das pequenas casas poderiam ter-se resguardado em seus porões, mas não tomaram qualquer iniciativa e esta foi a causa da tragédia. Em compensação, o incidente de Kabia deu nova força moral ao exército israelense, que jamais havia penetrado com tanta autoridade em território inimigo. Na ocasião, o primeiro-ministro Ben Gurion comentou: "Não é relevante o que se dirá no mundo sobre Kabia. O importante é como esta ação será vista aqui na região, dando-nos a possibilidade de aqui vivermos".
Mesmo assim, os ataques dos fedaín (terroristas que ainda não eram homens-bombas) contra Israel continuaram em ritmo crescente. O sul do país, incluindo os subúrbios de Tel Aviv, eram o alvo constante. Em pouco tempo, seis crianças foram mortas numa escola em Shafir e sete adolescentes foram assassinados em Bet Guvrim. No sítio arqueológico de Ramat Rachel, quatro mortos e dezesseis feridos. Um grupo de trabalhadores foi metralhado a caminho das indústrias químicas próximas ao Mar Morto. Em Jerusalém, uma mulher e sua filha foram estupradas e mortas. Numa noite, em 1956, seu motorista, um amigo de confiança, lhe revelou que por acaso tinha ouvido uma conversa entre oficiais do estado-maior, na qual alguém comentara: "Quero ver a cara do Arik quando ele souber que depois de Kabia ele nunca mais comandará coisa alguma". No dia seguinte, impetuoso, você foi procurar o general Moshe Dayan que, nas entrelinhas, lhe disse o mesmo. Depois de bater-lhe a porta, você telefonou para o gabinete do primeiro-ministro e pediu para ser recebido. Ben Gurion ouviu suas razões com paciência e apenas murmurou: "Espera". Sua reação: "Esperar o que?" O velho respondeu: "Espera, que tudo tem uma solução". E a solução, pouco tempo depois, foi a devolução do seu comando.
No dia 25 de outubro de 1956, em novo encontro com Ben Gurion, este lhe revelou que havia concluído um acordo militar com a França e a Inglaterra, que queriam garantir seus direitos de passagem pelo canal de Suez, então nacionalizado por Gamal Abdel Nasser, o ditador egípcio. O objetivo de Israel, na ação conjunta, era ocupar o Sinai para acabar com os fedaín. Nessa batalha, sua ação foi crucial para desobstruir a passagem de Mitla, contra a vontade de Dayan que, devido ao perigo, não queria concentrar muitas tropas naquela região. Por isso, mesmo depois do sucesso no Sinai, cresceu sua fama de rebelde, ao lhe acusarem formalmente de ter desobedecido ordens superiores, com a instalação de uma comissão de inquérito. Ben Gurion chamou-o e perguntou: "Se você tivesse que tomar novamente aquela decisão desobediente, o que faria?" Sua resposta: "Sentado aqui ao seu lado e tomando esta bela xícara de chá, e tendo todas as informações, talvez fizesse algo diferente. Mas, naquele dia, estava comandando muitos soldados, numa área aberta, quase sem armamentos anti-tanques, sem noção das ações dos franceses e ingleses, e com o grosso do nosso exército a mais de cem milhas de distância. Naquela situação, toda a responsabilidade era minha. Meu julgamento foi no sentido de que tínhamos que avançar e fazer todo o possível para nos defendermos". Ben Gurion respondeu: "O fato é que não me compete julgar o comportamento de dois comandantes militares em tal questão". Dayan veio a saber do teor daquela conversa e o inquérito foi arquivado.
No dia 14 de maio de 1967, você estava em Jerusalém assistindo à parada comemorativa da independência, quando vieram as primeiras informações de que os egípcios haviam deslocado grande quantidade de tropas na direção do canal de Suez. Foi uma surpresa. Até então, as condições na frente com o Egito eram de relativa calma, sublinhada pela presença de forças das Nações Unidas, entre as quais o Batalhão Suez, do Brasil. A ansiedade aumentou quando a mesma situação foi detectada na fronteira com a Síria. O primeiro-ministro Levi Eshkol se encontrava em nítido estado de depressão. Depois de uma série de reuniões com o estado-maior, sua conclusão foi a de que Israel deveria atacar imediatamente e de forma maciça. Não era esta a opinião de Rabin, responsável pelo estado-maior, que preferia uma ação em fases sucessivas. A indecisão era palpável. Naquela ocasião, você repetiu para seus comandados o que sempre costumava dizer: "O escalão político deve ter a liberdade de fazer suas opções, sejam elas políticas ou militares. Nossa missão consiste em dar-lhe liberdade para decidir. Os políticos é que vão definir seus objetivos e estratégias. E nós devemos estar em condições de lhes mostrar que seus objetivos podem ser alcançados".
Você foi chamado por Eshkol que lhe perguntou se a tensão seria aliviada caso ele nomeasse Dayan, então na vida civil, para o ministério da defesa. Sua resposta foi que, àquela altura dos acontecimentos, tanto fazia se o ministro da defesa fosse o próprio primeiro-ministro, ou Dayan, ou Beba Idelson (uma octogenária, pioneira do movimento kibutziano). O importante era rever os planos de ataque, o que acabou sendo feito, com a premissa de que a iniciativa deveria caber a Israel. Na noite de 4 de junho, véspera do início da Guerra dos Seis Dias, você escreveu uma carta para Lily, sua mulher, que vale reproduzir.
"Minha querida. Todos nós sabemos o que estamos esperando aqui, já pela terceira semana consecutiva. Pode acontecer a qualquer momento. É inevitável e se não o fizermos imediatamente, estaremos sob risco de destruição, ainda mais que o exército do Iraque entrou na Jordânia. Você, com certeza, sabe e compreende que não há outra alternativa. Mantenha o espírito elevado e tome conta de nossos três filhos maravilhosos. Entenda que as batalhas serão confiadas aos comandantes mais experientes e eu me incluo entre eles. Não se preocupe comigo. Sei da alegria que me espera quando voltar para casa. Se eu não telefonar amanhã, é porque realmente não foi possível. Muitos e muitos beijos para você, Gur, Omri e Gilad. Seu, Arik".
Mais uma vez, meu bom amigo, sua ação foi decisiva naquela guerra, tendo dominado toda a região ao sul de Israel. Em seguida, confiaram-lhe a missão de diretor de treinamento do exército, uma função na qual você estava à vontade e, também, com as rédeas soltas para nova rebeldia. Em 1969, a polêmica entre os militares tinha como foco o projeto da chamada Linha Bar-Lev, que deveria ser construída do lado israelense, ao longo do canal de Suez. Seria uma série de fortificações destinadas a posições de defesa contra qualquer futuro ataque por parte dos egípcios. Desde o começo, você achou que era um tremendo erro, argumentando que uma longa linha daquela natureza era desnecessária, bastando a Israel se posicionar em duas ou três localidades onde, pela lógica, os egípcios poderiam se aventurar a uma travessia. A polêmica sobre a Linha Bar-Lev foi-se avolumando, até que lhe convocaram para uma reunião do estado-maior. Foi um encontro tenso, a partir das duras críticas, tanto pessoais como profissionais, que lhe foram feitas pelo general Yeshayau Gavish, comandante da frente meridional. Você nem deixou ele terminar de falar. Levantou-se e disse: "Pensei que nós estávamos aqui para discutir as vantagens e desvantagens da Linha Bar-Lev. E eu vim para lhes dizer que se trata de uma idéia muito estúpida". Dayan interveio: "Arik, não lhe compete decidir o que o estado-maior deve, ou não, discutir". No que você se levantou, deu as costas e foi embora. Sua convicção era inamovível de que você estava certo e, todos os outros, errados. E conforme leio na autobiografia, vejo que, quatro anos depois, não lhe deu o menor prazer constatar que tinha razão, na medida em que a Linha Bar-Lev foi facilmente ultrapassada pelos egípcios na guerra do Iom Kipur.
Um parêntese. Conhecemo-nos em 1971, no Rio de Janeiro, quando você veio junto com a Lily pela primeira vez ao Brasil. Fui seu guia turístico e gastronômico, quando pude testemunhar seu enorme apetite à mesa. Depois, voltamos a nos ver pessoalmente em 1973, logo depois do cessar-fogo da guerra do Iom Kipur, em seu acampamento do outro lado do canal de Suez. Lembro-me que ali cheguei de manhã bem cedo, enquanto você fazia a barba à frente do espelho retrovisor de um jipe. Bati uma foto que tive o prazer de ver emoldurada no seu quarto de dormir, na sua fazenda perto de Ashkelon. Naqueles dias subseqüentes à Guerra do Iom Kipur, seu nome era mítico em Israel. O destino do conflito armado tinha tomado outro rumo depois de você ter idealizado e comandado a travessia do canal, pegando os egípcios de surpresa, cercando seu terceiro exército e posicionando-se na direção do Cairo. Fiquei sabendo, na longa entrevista que você ali me concedeu, que por causa da sua absoluta descrença na efetividade da Linha Bar-Lev e estando na reserva, você já tinha ido até o canal e marcado com um bloco de tijolos vermelhos o local que seria apropriado para uma eventual travessia. Antes disso, porém, muitas águas haviam rolado.
Em 1972, ao completar 45 anos de idade, você teve que deixar as forças armadas, pois essa era a idade limite para permanecer na ativa. A idéia do governo é que essa medida impediria a formação de uma casta militar no país, além de dar aos militares a oportunidade de iniciarem uma atividade civil, ainda com pouca idade. Sua decisão foi comprar um pedaço de terra para se tornar fazendeiro em tempo integral. Isso lhe custou uma peregrinação atrás de empréstimos bancários e, com a ajuda de amigos, lhe foi possível comprar a fazenda que tem até hoje, vizinha do kibutz Bror Chail, fundado por pioneiros oriundos do Brasil.
Naquele mesmo ano, o general Bar Lev deixou o comando do estado-maior, sendo substituído por David Elazar. Pouco antes de ir para a reserva, num encontro com Dado, nome com que o general era mais conhecido, você lhe perguntou o que deveria ser feito no tocante às fortificações da linha: em caso de ataque, deveriam ser mantidas ou as tropas evacuadas? Elazar optou pela manutenção, contra o seu argumento de que havia um limite para segurar aquelas fortificações e que se elas fossem superadas o risco se estenderia a todo o deserto do Sinai. Você ficou tão preocupado com este problema que pediu a Elazar para permanecer mais um ano no exército para o que desse e viesse, como já acentuei. O pedido foi recusado e endossado por Moshe Dayan. Restou-lhe apelar para Golda Meir que, na condição de primeiro-ministro, preferiu não se envolver no assunto e lhe respondeu com uma evasiva. Durante a cerimônia que marcou sua passagem para a reserva, chegou-lhe a informação de que o comando da região sul caberia doravante ao general Shmuel Gonen. Você disse a Dayan que Gonen não tinha a necessária experiência para a função. Dayan respondeu: "Arik, não vai haver guerra nenhuma este ano. Talvez Gonen não seja de fato muito experiente, mas ele terá tempo para aprender". Esta foi uma avaliação que, no decorrer da guerra que aconteceu no ano seguinte, teria dramáticas conseqüências.
Apesar de reservista, você continuou fazendo visitas freqüentes ao quartel-general do comando sul e justamente numa dessas ocasiões, foi até a margem do canal, onde marcou um local com os já referidos tijolos vermelhos. Em outubro de 1973, na véspera do dia sagrado do Iom Kipur, você estava numa casa que mantinha em Beersheva quando o oficial de inteligência do comando sul lhe mostrou uma série de fotografias aéreas que indicavam uma compacta concentração de tropas egípcias às margens do canal de Suez. Sua certeza de que a guerra iria estourar foi imediata. Dayan aprovou que você se reintegrasse ao comando da frente sul, onde os oficiais analisavam as informações. Era evidente que alguém do alto escalão deveria ir até o canal para saber com exatidão o que estava acontecendo. De nada adiantou seu telefonema para o general Gonen que simplesmente lhe disse que esta era uma medida desnecessária, enquanto as fortificações na Linha Bar Lev eram dizimadas, ocasionando a morte de centenas de soldados israelenses. Mais uma vez, lhe foi reforçada a idéia fixa de que era fundamental a travessia do Suez. Entretanto, essa iniciativa foi descartada por Bar Lev, que também voltara à ativa, e por Dado. No dia 16 de outubro, estava tudo pronto para a travessia, mas a negativa dos comandantes superiores permanecia inalterada.
Foi só no dia seguinte que Dayan lhe deu a luz verde para o ataque que, em primeira e última análise, salvou Israel de uma possível derrota na guerra contra o Egito. A travessia do canal, desde o transporte da ponte móvel através do deserto até sua instalação com soldados em botes de borracha sob fogo cerrado, foi o mais épico momento das forças armadas de Israel desde a sua criação. Eu me lembro que, percorrendo o Sinai rumo ao canal, vi dezenas de tanques e caminhões com a seguinte inscrição feita em tinta branca: Arik Mélech Israel (Arik, Rei de Israel). Enfim, tudo que narrei aqui, de forma sucinta, foi o que você me disse naquela entrevista, pela qual sempre lhe serei grato.
No outro lado do canal, no aeroporto de Fayd, embarcamos num pequeno avião Cesna, rumo a Beersheva. Tive, então, a oportunidade de ver e ouvir, de sua própria voz, o que foi a batalha no deserto que sobrevoamos, sobretudo na chamada Fazenda Chinesa onde havia milhares de tanques queimados e retorcidos, tanto egípcios como israelenses. De sua casa em Beersheva, seguimos para uma localidade próxima, Beeri, em cujo cemitério haveria uma cerimônia em homenagem aos soldados mortos durante o conflito. Eram cerca de quatrocentos túmulos rodeados pelas famílias dos militares, a grande maioria jovens entre 18 e 30 anos de idade. Por quanto tempo eu ainda vier a viver, jamais esquecerei o som daquele kadish (oração pelos mortos) coletivo, entoado por centenas de vozes soluçantes, enquanto você também chorava. Na saída do cemitério, centenas de pessoas se atiraram ao seu encontro para abraçá-lo e cumprimentá-lo. Lembro bem de um judeu humilde, de procedência oriental, que parou à sua frente e disse: "Arik, a guerra levou meus dois filhos. Se foi para o bem de Israel, que assim seja. Obrigado pela nossa salvação".
O capítulo seguinte da sua autobiografia tem o título de "Político e Fazendeiro". Com rara elegância, você se esquivou de revelar a verdadeira razão que o levou a se afastar do Partido Trabalhista, com cujos líderes tinha longo e constante envolvimento, para se dedicar à formação do Likud, partido de oposição. Depois do êxito na guerra do Iom Kipur, seu desejo, mais do que justo, era ser o próximo chefe do estado-maior. Entretanto, os vaivens da política lhe obstaram essa natural promoção que seria a consagração de sua carreira como militar. Eu sei, através de nosso amigo comum e seu confidente, o jornalista Uri Dan, de sua devastadora decepção naquele episódio. Se, naquela ocasião, você tivesse chegado ao estado-maior é até provável que, ao término do mandato, viesse a se retirar da vida pública e, em vez de ter sido eleito primeiro-ministro, seria hoje o mais próspero exportador de melões de Israel. O Uri, inclusive, repetia: "Quem não quis Arik Sharon como chefe do estado-maior, vai ter que engoli-lo como ministro da defesa; e quem não quiser tê-lo como ministro da defesa, vai ter que engoli-lo como primeiro-ministro".
Dito e feito. Com a vitória do Likud nas eleições de 1977, de tudo que o vitorioso Menachem Begin lhe ofereceu, você preferiu o ministério da agricultura, para poder dedicar-se aos novos assentamentos na Cisjordânia. Em 1979, você me levou, junto com a Sonia, minha mulher, para conhecer alguns desses assentamentos, ainda com pequenas populações. Fomos a Ariel, Tapuz, mais uns dois cujos nomes não recordo, e terminamos a excursão em Eilon Moré. Esses assentamentos são até hoje objeto de acaloradas controvérsias. Sua intenção, ao instalá-los, era a de tê-los como pontos avançados de defesa, como um fator de dissuasão de quaisquer intenções hostis por parte dos palestinos. No entanto, essas colônias acabaram se tornando um símbolo concreto da ocupação e as pessoas fingiam não ouvir quando você argumentava: "Se nós podemos conviver com mais de um milhão de árabes dentro de Israel, por que eles não podem conviver com 200 mil judeus?"
Há pouco, um dos mais violentos opositores dos assentamentos, o jornalista israelense Ari Shavit, declarou numa entrevista, já após sua internação no Hospital Hadassah: "Sharon jamais pensou na Margem Ocidental do Jordão de forma messiânica. Os colonos sempre o viram como alguém que encorajava seu plano divino, embora ele mesmo não acreditasse nessa divindade. E depois da retirada de Gaza, passaram a temer que, algum dia, Sharon os desalojaria dos assentamentos. Sharon ganhou grande respeito entre os palestinos, em particular, e entre os árabes, em geral, nos últimos dois anos. Ao sair de Gaza, ele desengajou 1 milhão e 400 mil palestinos. É um fato que cria um importante precedente. Em 1982, você foi ministro da defesa, quando desencadeou a guerra do Líbano, a chamada operação "Paz para a Galiléia". Seu primeiro objetivo, que era expulsar a OLP de Beirute, foi bem sucedido. O segundo fracassou no dia em que assassinaram o presidente libanês, Bashir Gemayel. Há muito tempo que Gemayel estava em contato com Israel, com quem pretendia assinar uma paz definitiva, tão logo se visse livre da presença de Arafat em seu país. Se Bashir tivesse vivido, o panorama político do Oriente Médio, hoje, seria totalmente diferente, algo que seu irmão e sucessor, Amin, não compreendeu e não implementou.
Arik, vou passar ao largo de Sabra e Chatila porque a responsabilidade que lhe pretenderam atribuir, com relação àquele massacre de muçulmanos, jamais fez o menor sentido. Couberam-lhe, em seguida, diferentes ministérios até chegar a sua hora e vez de assumir como primeiro-ministro. Pena que você não esteja consciente para constatar como a opinião pública israelense, e também a mundial, mudou a seu respeito. Outro que sempre lhe foi contrário, o jornalista Benny Morris, declarou: "Ariel Sharon ficará na história como um grande general. Como um perito em guerra que despertou para o fato de que Israel não podia continuar se ocupando de outro povo e manter-se democrático. A retirada de Gaza foi um primeiro passo nesse sentido. Outros decerto se seguiriam".
Está claro, Arik, que você nunca mais será o que foi. Entretanto, onde e como estiver, sei que estará velando pelo povo de Israel, pelo povo judeu. Shalom, meu amigo.