Sucot é uma das Shalosh Regalim, expressão hebraica que literalmente significa “três pernas” e se refere às principais festas de peregrinação no Judaísmo, cada uma com imenso significado religioso. A Torá ordena que, nessas ocasiões, o Povo de Israel vá em peregrinação ao Templo Sagrado de Jerusalém, o Beit HaMikdash (Deuteronômio 16:16). A palavra Regalim, “pernas”, alude à caminhada ou viagem ao Templo Sagrado e simboliza a jornada física empreendida pelos Filhos de Israel para cumprir esse mandamento.

As Shalosh Regalim são Pessach, Shavuot e Sucot. A primeira, que seinicia em 15 do mês hebraico de Nissan, dura sete dias em Israel e oito na Diáspora. Trata-se dacomemoração do Êxodo. Denominada Zman Cherutenu (“época da nossa liberdade”) na liturgia judaica, essa festividaderememora os milagres e acontecimentos memoráveis que culminaram com o fim da escravidão do Povo de Israel no Egito, tais como as Dez Pragas e a divisão do Mar dos Juncos.

A segunda das Shalosh Regalim é Shavuot, que ocorre em 6 do mês de Sivan (50 dias após Pessach) em Israel, mas, na Diáspora, se estende até o dia seguinte. Nessa ocasião, comemoramos a Revelação Divina no Monte Sinai e a Proclamação dos Dez Mandamentos, o núcleo das 613 mitzvot (mandamentos)da Torá. Recitamos então orações quese referem à festividade como Zman Matan Toratenu, que significa “época da entrega da nossa Torá”. Shavuot relembra o acontecimento mais marcante e consequente da história, a única ocasião em que D’us Infinito Se revelou a seres humanos e deu ao Povo de Israel a Torá – um código Divino de instruções pelo qual o Todo Poderoso espera que o ser humano viva.

Finalmente, a terceira das Shalosh Regalim é Sucot, que se inicia em 15 do mês de Tishrei, cinco dias após Yom Kipur, e dura uma semana. Nesse período,comemoramos a proteção Divina que os Filhos de Israel desfrutaram ao longo dos 40 anos em que viveram no deserto sob a liderança de Moshé Rabenu. O nome Sucot, “moradias temporárias” em hebraico, é uma referência aos abrigos que protegeram nossos antepassados durante a longa jornada rumo à Terra Prometida e, segundo uma opinião talmúdica, eram as Ananei HaKavod, as Nuvens da Glória. De acordo com outra interpretação, trata-se das cabanas físicas em que os Filhos de Israel viveram nessas quatro décadas.

Não se encontra, na liturgia judaica, nenhuma referência a Sucot que reflita diretamente o tema central da festa, ao contrário do que ocorre com Pessach, chamada de Zman Cherutenu por celebrar a liberdade, e Shavuot, denominada Zman Matan Toratenu por comemorar a entrega da Torá ao Povo de Israel por D’us. Sucot não é Zman Sukatenu (“época do nosso abrigo”), mas Zman Simchatenu (“época da nossa alegria”), com destaque ao júbilo que caracteriza a festa e não aos acontecimentos históricos por ela relembrados. Essa referência deve-se à Torá, que ordena a alegria durante Sucot: “Sete dias festejarás a festa para o Eterno, teu D’us, no lugar que escolher o Eterno; porque o Eterno, teu D’us, te abençoará em todos os teus produtos e em toda obra de tuas mãos, e estarás ach sameach (‘somente ou completamente alegre’)” (Deuteronômio 16:15). Essa expressão hebraica enfatiza a felicidade plena que deve marcar Sucot. Embora o Judaísmo ordene a alegria não só no Shabat, mas também em todas as festas religiosas, a Torá não usa as palavras ach sameach para nenhum outro dia sagrado, nem mesmo para as outras duas das Shalosh Regalim. Esse mandamento ressalta que é imprescindível que haja um sentimento constante e absoluto de júbilo em Sucot, mais do que em qualquer outra ocasião. Um dos motivos para tamanho regozijo é a associação da data com o ciclo agrícola em Israel. Enquanto Pessach está ligada à ceifa da cevada e Shavuot, à do trigo, Sucot, que ocorre no fim do ano de colheita em nossa terra ancestral, marca a ceifa final de frutas, além de outros produtos, tanto que a Torá a denomina “festa da colheita” (Chag HaAsif). Representa a culminação desse período tão importante e, com toda a produção anual já recolhida e armazenada, caracteriza-se por um sentimento de realização e abundância. A Torá ordena: “A festa de Sucot farás para ti sete dias, quando tiveres recolhido os produtos da tua eira e de tua vindima. E te alegrarás na tua festa – tu, teu filho, tua filha, teu servo, tua serva, o levita, o peregrino, o órfão e a viúva, que estão nas tuas cidades. Sete dias festejarás a festa para o Eterno, teu D’us, no lugar que escolher o Eterno; porque o Eterno, teu D’us, te abençoará em todos os teus produtos e em toda obra de tuas mãos, e estarás somente alegre” (Deuteronômio 16:13-15). Esses versículos destacam o contexto agrícola de Sucot, bem como o júbilo e o senso de realização trazidos pela festa, coincidente com a colheita do ano.

No entanto, há outros motivos para tanto júbilo, que, caso fosse devido apenasà produção rural em Israel, não teria muito significado para os judeus da Diáspora. Como a Torá ordena a observância de Sucot onde quer que se viva, a alegria inerente a essa festa transcende o contexto agrícola e não reflete apenas a fartura dessa época do ano.

Para entender os motivos da ênfase na alegria nessa festa, mais do que em qualquer outra comemoração judaica, é fundamental aprofundar o conhecimento sobre os dois principais mandamentos relacionados a Sucot. O primeiro é a mitzvá de habitar em uma Sucá (uma cabana temporária), que dá nome à festa. O segundo é o de tomar nas mãos os Arbaat HaMinim, as Quatro Espécies: o Lulav (folhagem da tamareira), o Etrog (cidra), o Hadass (murta) e a Aravá (salgueiro). Os temas associados a esses mandamentos Divinos (a saber, a confiança em D’us e a união do Povo de Israel) são pré-requisitos para a verdadeira alegria, além de servirem como paradigma para a paz e a harmonia entre toda a humanidade.

O mandamento de habitar na Sucá

A mitzvá mais claramente associada a Sucot,sobretudo por dar nome à festa, é residir em uma Sucá durante os sete dias que constituem esse Chag: “Nas cabanas habitareis por sete dias; todo natural de Israel habitará nas cabanas. Para que as vossas gerações saibam que nas cabanas fiz habitar os Filhos de Israel, quando os tirei da terra do Egito. Eu sou o Eterno, vosso D’us” (Levítico 23:42-43).

Ao cumprir esse mandamento, recordamos como nossos antepassados viveram sob a proteção e supervisão Divina no deserto durante sua jornada para a Terra Prometida. Por meio de uma linguagem metafórica, a obra fundamental da Cabalá, o Zohar (Emor 103a) ensina que: “Quando um homem se senta na Sucá da sombra da fé, a Shechiná (Presença Divina na Terra) estende Suas ‘asas’ sobre ele de cima”. Esse ensinamento destaca não só o aspecto místico e protetor da habitação na Sucá, mas também a importância dessa morada temporária como um local sagrado sobre o qual paira a manifestação de D’us em nosso plano e que, por conseguinte, oferece tanto refúgio espiritual quanto bênção. Nossos Sábios ensinam ainda que a Sucá é reminiscente do Mishkan, o Tabernáculo, o Templo Sagrado portátil que acompanhou os Filhos de Israel no deserto e servia como morada do Altíssimo na Terra, o local em que Ele se comunicava com Moshé Rabenu.

A Sucá é interpretada de maneira paradoxal. Segundo o Zohar, é nela que, durante os sete dias de Sucot, a Presença Divina habita emetaforicamente abre Suas “asas” sobre os que lá se encontram, em um abraço de proteção. Por outro lado, a Sucá é uma habitação temporária e frágil, e o s’chach, que a recobre, é feito de galhos cortados e bambu de forma que não tem a solidez do telhado de uma casa. Embora a Sucá ofereça abrigo e sombra, sua cobertura não pode ser à prova de intempéries, tanto que, se for densa a ponto de impedir a entrada da chuva, toda a estrutura é invalidada, pois esse “teto” frágil representa a vulnerabilidade do homem.

É nesse paradoxo que reside a essência da confiança em D’us. É o reconhecimento de que a verdadeira segurança vem de Sua Presença e Providência, não de edifícios altos e imponentes. A Sucá ensina que uma morada frágil habitada pela Shechiná é infinitamente mais segura de que, até mesmo, a construção mais robusta. Já vimos estruturas sólidas desmoronarem de repente, às vezes por ação de pessoas más, o que nos lembra, repetidas vezes, que a segurança absoluta só vem de D’us. Portanto, os verdadeiramente sábios aprendem a confiar no Onipotente, e não nos homens ou nas criações humanas, por mais magníficas que sejam.

A Sucá incorpora ainda um segundo tema: a união do Povo de Israel. O tratado Sucá, do Talmud, que aborda sobretudo os mandamentos pertinentes a Sucot, dedica muitas de suas páginas aos critérios de validade da cabana de acordo com a Lei Judaica. São instruções minuciosas e técnicas sobre a quantidade de paredes, a resistência delas, a altura mínima e máxima da estrutura, bem como os requisitos e diretrizes para o s’chach. No entanto, há uma ausência notável de limites quanto ao comprimento e à largura da Sucá. Em outras palavras, não há restrições para a quantidade de pessoas na morada temporária, que, assim, pode ser ampla o suficiente para acomodar todo o Povo Judeu. De fato, o Talmud ensina que, por simbolizar a união entre os Filhos de Israel, a Sucá ideal reúne o maior número possível deles.

O Mandamento das Arbaat HaMinim - as Quatro Espécies

Além de habitar na Sucá, outro mandamento Divino essencial de Sucot é segurar nas mãos as Arbaat HaMinim, as Quatro Espécies: o Lulav (folhagem da tamareira), o Etrog (cidra), três Hadassim (ramos de murta) e duas Aravot (ramos de salgueiro). Em cada dia da festa, exceto no Shabat, cumprimos essa mitzvá. É significativo que um dos principais mandamentos de Sucot envolva espécies agrícolas, pois, como mencionado acima, um dos nomes da comemoração é Chag HaAsif, “a Festa da Colheita”. As Arbaat HaMinim simbolizam a abundância da Terra de Israel, portanto o ato de tê-las nas mãos expressa gratidão a D’us pela colheita passada e confiança de que Ele abençoará as futuras.

Assim como há razões esotéricas para o mandamento de habitar em uma Sucá durante Sucot, a mitzvá das Quatro Espécies também tem dimensões místicas, com simbolismo e significados profundos conforme revelado no Zohar e discutido no Midrash. De acordo com a obra fundamental da Cabalá, as Arbaat HaMinim (um Lulav, um Etrog, três Hadassim e duas Aravot) representam as sete Sefirot emocionais por meio das quais D’us Se relaciona com Suas criações. Não é coincidência que Sucot dure uma semana e que seus dois principais mandamentos envolvam o número sete – o mais recorrente na Torá. Sucot, Zman Simchatenu (“época da nossa alegria”), é uma oportunidade de renovar e fortalecer as sete Sefirot emocionais – as dimensões que constituem tanto a arquitetura do Universo quanto os atributos afetivos de todos os seres humanos.

Uma famosa passagem no Midrash (Midrash Rabbah, Emor, págs. 12-13) ensina que as Arbaat HaMinim representam quatro personalidades distintas dentro do Povo de Israel. O Lulav simboliza aquele que se dedica inteiramente aos estudos da Torá e, portanto, não tem tempo, energia ou recursos suficientes para realizar muitas boas ações. O Hadass, por outro lado, representa os que se ocupam tanto com atos de generosidade e bondade que não têm condições de debruçar-se com afinco sobre a Torá. O Etrog evoca uma combinação dessas duas personalidades: são as pessoas que se dividem entre o estudo da Torá e a realização de boas ações, porém sem o mesmo empenho a nenhuma dessas duas atividades que os grupos anteriores. Finalmente, a Aravá simboliza aqueles que ainda não se destacam em nenhuma das duas áreas, mas sim na humildade e na abnegação. Nenhum judeu deve aspirar a ser este último tipo, desprovido de conhecimento e boas ações, porém talvez todos os Filho de Israel devam nele inspirar-se e adquirir a virtude da humildade, uma das mais exaltadas, senão a mais enaltecida, pela Torá.

A mitzvá de tomar nas mãos as Quatro Espécies simboliza a união do Povo Judeu, um princípio fundamental da Torá. Conforme ensina o Talmud, não é possível cumprir esse mandamento se faltar qualquer uma das Arbaat HaMinim, pois nenhuma delas substitui alguma outra. Por exemplo, nem mesmo o mais belo Etrog, que simboliza um judeu que avança tanto em conhecimento da Torá quanto em boas ações, pode compensar a falta de uma Aravá, que representa aquele desprovido de ambas as virtudes. Em caso de ausência ou invalidade de qualquer uma das espécies, é proibido recitar a bênção e cumprir a mitzvá.

Ao discutir o mandamento das Arbaat HaMinim, o Midrash ensina: “O Santo, Bendito é Ele, diz: ‘Que todos sejam amarrados juntos como um só feixe, e eles expiarão uns pelos outros’ ”. Essa remissão mútua e recíproca demonstra que até mesmo a Aravá tem algo a oferecer, o que, por sua vez, ensina que ninguém é completo sozinho e nem desprovido de virtudes de maneira que todos somos interdependentes.

No comentário sobre a importância da união judaica, simbolizada pela junção das Quatro Espécies, o Midrash esclarece que D’us é exaltado pela congregação dos Filhos de Israel. Segundo Etz Yosef, renomado comentarista do Midrash Rabbah, a harmonia advinda da reunião das diversas personalidades dentro do Povo Judeu influencia diretamente as forças celestiais, as quais, por efeito dessa comunhão, se agregam, derramam bondade sobre o mundo e, dessa forma, exaltam o Nome de D’us.

Confiança em D’us e união: pré-requisitos para a alegria

As duas principais mitzvot de Sucot, na liturgia judaica, têm em comum dois temas fundamentais: a confiança em D’us e a união. Ambos, manifestados nos mandamentos de habitar na Sucá e tomar nas mãos as Quatro Espécies, são indispensáveis para a verdadeira alegria.

As pessoas que realmente confiam em D’us e vivem de acordo com Sua vontade estão menos propensas ao caos e às falhas, causas de tanto sofrimento à humanidade. Ao depositarmos a confiança no Altíssimo e não apenas em nós mesmos, conquistamos a humildade e, com isso, evitamos não só um contentamento acomodado, mas também os graves erros nascidos da arrogância e do excesso de autoconfiança. Aqueles que verdadeiramente confiam em D’us são gratos por tudo o que Ele lhes concede e têm mais esperança no futuro, pois reconhecem que sua vida não é fortuita ou aleatória, mas uma consequência da Providência Divina.

A união, que, quando verdadeira, incorpora paz, amor e generosidade, assim como exclui inveja, raiva, ressentimento e conflito, fontes de sofrimento e angústia, constitui outro pré-requisito para a alegria, além de ser essencial para a estabilidade e o êxito de uma nação. Na história judaica, a união nacional sempre trouxe paz e bênçãos. Por outro lado, ocorreram catástrofes nos momentos de divisão, seja há dois mil anos, quando o Segundo Templo de Jerusalém foi destruído, ou, recentemente, nos meses que antecederam a invasão terrorista em 7 de outubro de 2023, o dia mais trágico enfrentado pelo Estado de Israel. O perigo da desunião interna não afeta apenas o Povo Judeu, mas todas as nações. Os conflitos mais sangrentos e trágicos são, em muitos casos, as guerras civis, como já ocorrido nos EUA, Espanha, Rússia, Líbano, Ruanda e Síria.

O conceito de união é tão importante no Judaísmo que está associado à Era Messiânica, quando reinarão a paz e a harmonia entre todas as nações. A comunhão de toda a humanidade não significa assimilação ou perda de identidades nacionais, religiosas e culturais. Na verdade, representa entendimento e cooperação entre os diversos povos, que trabalham juntos para o bem comum enquanto preservam suas singularidades. Ainda que destaque sobretudo a alegria e ressalte a necessidade da união do Povo de Israel, Sucot é a festa do calendário judaico que tem o tema mais universal, pois aborda a comunhão, harmonia e bem-estar de toda a humanidade.

Nos tempos do Templo Sagrado de Jerusalém, sacrificavam-se, durante a semana de Sucot, 70 touros que representavam as principais nações do mundo, além da judaica. O ritual, destinado a atrair bênçãos, paz e harmonia para todos os povos, demonstra a preocupação do Judaísmo com toda a humanidade, assim como o reconhecimento da importância da paz universal. De fato, Zman Simchatenu, a “época da nossa alegria”, só pode ser verdadeiramente jubilosa se não houver guerra, conflito e sofrimento em nenhuma parte do mundo.

“Em D’us confiamos” e “De muitos, um”

Constitui uma verdade atemporal e universal o fato de que a riqueza material, não só das nações, mas também dos indivíduos, envolve tantos desafios que sempre foi um dos temas mais controversos ao longo da história e permeia quase todas as discussões políticas, econômicas, sociais e religiosas. Até hoje, as diversas perspectivas sobre a acumulação e distribuição de riqueza fundamentam os principais sistemas político-econômicos.

Ao contrário de muitas religiões, filosofias e movimentos sociopolíticos, o Judaísmo não mantém uma posição absoluta sobre a riqueza ou a falta dela. Enquanto o Talmud a coloca como um indicativo de graça e favor Divino, o Midrash ensina que D’us ama os pobres, como demonstra a vida completamente destituída de posses materiais de boa parte dos nossos maiores Sábios.

O Judaísmo ensina, de forma inequívoca, que o valor da riqueza depende de sua utilização. Segundo a Torá, não há um conflito inerente e insolúvel entre o físico e o espiritual, tanto que ambos podem coexistir com harmonia. No entanto, D’us explicitamente nos adverte da atribuição da conquista de bens materiais e de êxito pessoal apenas aos próprios méritos, o que seria uma forma de autoidolatria. Além disso, o Todo Poderoso ordena o emprego sábio, justo e generoso da abundância, sobretudo no auxílio aos necessitados.

A riqueza e a fartura são temas relevantes de Sucot, “a Festa da Colheita”, que, em Israel, ocorre no fim do ano agrícola, quando o Povo Judeu recolhe os frutos de sua terra. Essa comemoração, que marca a conclusão de um ciclo, é um momento de agradecimento a D’us pela abundância.

Nos anos de fartura em nossa terra ancestral, era fácil entregar-se ao contentamento pessoal e à arrogância em vista do próprio êxito. Por isso, a Torá adverte: “Quiçá dirás no teu coração: ‘A minha força e o poder da minha mão me conseguiram estes bens’. Mas, antes te lembrarás do Eterno, teu D’us, porque é Ele quem te dá força para conseguires riqueza, a fim de confirmar Sua aliança, que jurou a teus pais, como o faz hoje”. (Deuteronômio 8:17-18).

A festa de Sucot, com seus dois principais mandamentos centrados na confiança em D’us e na união, serve como um poderoso lembrete aos judeus de que a verdadeira fonte de riqueza é o Todo Poderoso, que lhes confiou a abundância para que dela façam bom uso. Ao habitarmos em uma Sucá, que, apesar de temporária e frágil, se torna a morada da Presença Divina durante a festa, lembramo-nos de que a única segurança absoluta no mundo é D’us. Apenas Ele garante nossa vida e sustento. A confiança no Altíssimo é o reconhecimento do Onipotente como base de nossa manutenção e a certeza de que Ele continuará a prover. Além disso, incentiva a união e o amor entre os seres humanos, os quais, ao compreenderem que seu êxito é uma dádiva Divina, passam a se ver como agentes de D’us, responsáveis por ajudar todos os necessitados, conforme ensina a Torá. Assim, um dos pilares do Judaísmo (e uma de suas contribuições mais significativas para a humanidade) é a assistência a pobres, viúvas, órfãos e estrangeiros, além do cuidado com todas as criaturas de D’us.

Outra razão pela qual Sucot é chamada de “época da nossa alegria” é que a Torá manda dar aos necessitados uma parcela de cada safra. Assim, é durante esse período que aqueles abençoados com riqueza tinham mais oportunidades de compartilhar sua fartura com aqueles que pouco ou nada tinham, o que proporcionava alegria às pessoas em vulnerabilidade econômica.

Sucot ensina não só que a alegria não é completa se alguém está em sofrimento, mas também que uma nação não é verdadeiramente próspera se uma única pessoa que seja passe fome. Ao cumprirem os mandamentos da Torá que ordenam compartilhar parte da colheita com os necessitados, os detentores de posses e riquezas possibilitavam a participação de todos na abundância propiciada pela Terra de Israel e, com isso, proporcionavam um senso de felicidade coletiva. Ademais, aqueles que distribuem parte de sua fartura com generosidade demonstram, na prática, o reconhecimento de D’us como fonte de sua vitória, bem como da própria condição de meros administradores fiduciários da abundância que o Todo Poderoso lhes confiou para que beneficiassem os outros. Por trazer a consciência da posição de simples intermediário do compartilhamento da fartura material com todos os filhos de D’us, essa interpretação da riqueza é um antídoto contra a arrogância.

Ao mesmo tempo em que geram união e paz, os atos de bondade e generosidade têm um sentido profundamente religioso, pois demonstram a confiança em D’us, assim como a certeza de que o Altíssimo continuará a abençoar aqueles que renunciam a parte de sua riqueza para assegurar o bem-estar de todos, sobretudo daqueles que se encontram em situação econômica difícil.

Há um forte entrelaçamento entre a confiança em D’us, a união entre as pessoas, os atos de generosidade e o sentimento de alegria plena, que trazem uma abundância de bênçãos tanto para os indivíduos quanto para os povos. Não é coincidência que, no país mais bem-sucedido financeiramente de todos os tempos, os EUA, há uma referência a essas duas primeiras virtudes em cada moeda e cédula, nas inscrições “In G-d We Trust” (Em D’us confiamos) e “E Pluribus Unum” (De muitos, um). Aquela frase em inglês, adotada durante a Guerra de Secessão (1861-1865), expressa a confiança do país no Onipotente durante tempos de grande crise e conflito. Já a divisa “E Pluribus Unum”, em latim, simboliza a união dos Estados individuais em uma única nação ao destacar que, apesar da diversidade regional e populacional, os EUA formam uma só entidade. Quase um século após a Guerra de Secessão, que quase resultou no fim desse país, surgiu outra ameaça: a Guerra Fria contra o Império Soviético. Em 1956, em uma época de grande tensão, o Congresso aprovou uma resolução que tornou “In G-d We Trust” o lema oficial do país. Essa decisão, que contrastava com o ateísmo estatal promovido pela União Soviética, reforçou a ideia de que os EUA eram uma nação sob a proteção e orientação de D’us. A inclusão desse lema em cédulas e documentos oficiais demonstrava essa crença e deixava bem clara a diferença ideológica entre os dois países.

O Lubavitcher Rebe mencionava com frequência a importância de ambas as divisas, além de explicar que “E Pluribus Unum” simboliza a união essencial entre as pessoas e “In G-d We Trust” reflete a confiança na Providência Divina. Segundo o Rebe, essas frases, por incorporarem dois grandes princípios judaicos, expressam ideias basilares da identidade dos EUA e do mundo.

O Rebe ensinava ainda que o êxito da economia americana e a força do dólar como a moeda internacional mais confiável se devem à inscrição “In G-d We Trust”. Fundados em valores judaico-cristãos, os EUA atribuem seu triunfo e riqueza a D’us. Desde a inclusão desses dizeres em sua moeda, o país tornou-se o mais rico e poderoso do mundo enquanto a União Soviética, um regime repressivo, antirreligioso, violentamente antissemita e antissionista, desabou econômica e politicamente.

Assim, a história contemporânea corrobora a lição central de Sucot, a “época da nossa alegria”: a confiança em D’us e a união entre todos constituem receptáculos espirituais para que o Todo Poderoso derrame Suas bênçãos sobre a humanidade. A festa, que ocorre duas semanas após Rosh Hashaná, o início do ano, e cinco dias após Yom Kipur, destaca que a maneira de alcançar um bom ano, cheio de paz e prosperidade, é o fortalecimento de nossa relação com o Onipotente e com os outros. A Torá manda amar e reverenciar o Altíssimo, bem como n’Ele confiar, além de amar, respeitar o próximo e fazer o bem a ele. Ao aproximar-se de D’us Infinito e fortalecer os laços com os outros, a pessoa encontra o que todos os seres humanos mais buscam: a verdadeira alegria, a felicidade, a paz e o sentimento de realização pessoal que advêm de uma vida repleta de propósito e benevolência.

Bibliografia

What Is a Sukkah?, artigo publicado no site http://www.chabad.org/library
How to celebrate Sukkot?, artigo publicado no site http://www.chabad.org/library
What is Sukkot?, artigo publicado no site http://www.chabad.org/library