A magnífica Sinagoga de Lancut, uma das poucas que se mantêm até hoje, é um exemplo das sinagogas de quatro pilares, com majestosas abóbadas, construídas em todas as terras da Polônia. A sinagoga representa uma era e uma história sociopolítica e arquitetônica que, em outras partes, estão totalmente esquecidas.
Inaugurada em 1761 para substituir a sinagoga de madeira que fora destruída por um incêndio, tem seu prédio em pedra talhada, com 18m por 15m. Foi construída ao lado do vasto terreno onde ficava a residência de uma família da alta nobreza polonesa, dona da cidade, sob cuja égide viviam os judeus.
A modesta fachada externa não condiz com o rico décor de seu interior. Uma das características mais impressionantes do prédio é seu piso, rebaixado bem abaixo do nível térreo para contornar as rígidas limitações impostas pela Igreja acerca da altura das sinagogas. O espaço para as mulheres era acima da entrada e o acesso a essa galeria era feito através de uma escada externa. Após descer vários degraus da entrada, pode-se ver um salão de orações, com extrema luminosidade. Provavelmente os judeus de Lancut se sentiam tão seguros da proteção dos nobres proprietários das terras que se permitiam ter janelas mais amplas que o usual.
O prédio dá uma boa ideia da disposição espacial das sinagogas que têm a Bimá1 como elemento arquitetônico central, sendo construída com oito nichos em torno da mesma, e quatro pilares de pedra maciça que apoiam o teto e o telhado. Os quatro nichos, que ficam nos pontos cardeais, possuem abóbadas cilíndricas. A Bimá e seus pilares permitem que o prédio tenha uma estrutura com essas dimensões. Ademais, havia espaço suficiente para circulação ou colocação de assentos na direção norte e sul da Bimá. O interior é ricamente ornamentado com trabalhos em policromia e estuco, com pinturas de cenas da Torá, dos Chaguim, dos instrumentos musicais mencionados nos Salmos e do Zodíaco, executados por artistas judeus poloneses.
A história da comunidade judaica de Lancut teve seu início no século 16 quando um número pequeno de judeus lá se estabeleceram, mas a existência de uma Kehilá – uma comunidade judaica organizada – foi mencionada pela primeira vez em 1563.
A cidade teve seu real esplendor no século 17 quando o Duque Stanisław Lubomirski se tornou seu proprietário. Lubomirski contratou um judeu para fazer a contabilidade de sua propriedade e estendeu aos judeus da cidade inúmeros privilégios. Entre estes, dedicar-se ao comércio – com exceção do comércio de peles – e a vários ofícios, assim como comprar terras e construir casas na cidade. O número de judeus que lá viviam começa a aumentar, chegando a mais de 100 em 1662. Antes de 1648 havia uma sinagoga de madeira e a primeira referência a um cemitério judeu data de 1671. No século 18 a comunidade já tinha sua própria escola, uma mikvê, um local de orações e um hospital.
Em 1716, houve um incêndio na pequena sinagoga de madeira da comunidade, que foi reconstruída, mas voltou a pegar fogo. Em 1726, a Kehilá decidiu empreender esforços para erguer uma nova sinagoga de alvenaria, porém, o projeto era custoso e acabou sendo em grande parte financiado pelo Duque Stanisław. A nova estrutura em formato barroco é, até hoje, uma das mais magníficas sinagogas da Polônia. O único registro do seu interior original é uma aquarela pintada após 1786 pelo paisagista polonês Zygmunt Vogel (que usava o pseudônimo de Ptashek; 1764-1826). A sinagoga foi restaurada em 1896 e redecorada em 1909-10.
Após 1760, Lancut se torna um importante centro do Movimento Chassídico e os Chassidim passam a ser a força dominante na vida religiosa da comunidade. A pequena sala de orações da Sinagoga era usada como Corte Rabínica e ponto de encontro para os judeus da cidade e inúmeros Mestres Chassídicos. No final do século 18, residia em Lancut Rabi Yaacov-Yitzhak Horowitz, conhecido como o Chozé de Lublin, o Vidente de Lublin. Um dos mais importantes Tzadikim (Justos) na história do Chassidismo, Rabi Yaacov-Yitzhak Horowitz, tinha uma sala separada na sinagoga, onde fazia suas orações, estudava e ensinava. Rabi Yaacov-Yitzhak Horowitz acabou mudando-se para Czechów e, de lá, em 1784, para Lublin.
Após a primeira partilha da Polônia (1772), Lancut passa a ser território da Áustria, o que, no entanto, não impediu o crescimento da comunidade judaica. Em 1870, mais de mil judeus viviam na cidade, representando 41% da população geral. Em 1880, já eram 45 %. O período entre guerras (1918-1939) testemunhou um rápido crescimento da comunidade e de suas instituições educacionais e culturais. Em 1921, havia 1.925 judeus na cidade (cerca de 42% da população total) e 2.753, em 1939.
A cidade foi tomada pelos alemães em 9 de setembro de 1939, e eles incendiaram a sinagoga – a galeria das mulheres, em madeira, assim como as estruturas da janelas e o mobiliário foram destruídos. O incêndio só foi dominado após a intercessão de Alfred Potocki, que fez um apelo às autoridades alemãs. A família Potocki era proprietária de Lancut desde 1816.
Assim que os nazistas entraram na cidade, a maioria dos judeus foram expulsos, grande parte dos quais para território soviético. No início de 1940, eram apenas cerca de 900 os judeus da cidade. No final do ano, com a chegada dos refugiados expulsos de Cracóvia, esse número chegou a 1.300. Em 1º de agosto de 1942, a maioria dos judeus de Lancut foram deportados, e os que ainda lá viviam foram levados para o gueto de Szeniawa, em 17 de setembro. Em maio do ano seguinte o gueto de Szeniawa era liquidado.
Durante a ocupação nazista e por alguns anos após a guerra, a sinagoga foi usada para armazenar grãos. Em 1956, não havendo judeus residentes na cidade, a Prefeitura propôs que se destruísse o prédio, mas o Dr. Stanislaw Balici persuadiu a Câmara de Vereadores a preservar o prédio como museu e memorial da comunidade judaica destruída. A sinagoga foi reformada em meados do século 20, passando por novas reformas em 1983 e em 1990. Desde 2009, é propriedade da Fundação para a Preservação da Herança Judaica na Polônia.
Um dos projetos mais importantes da Fundação é a “Rota Chassídica”, uma rota turística que segue os vestígios das comunidades judaicas pelo sudeste da Polônia e oeste da Ucrânia. Essa rota inclui a sinagoga de Lancut e as de Kraśnik, Rymanów e Zamość.
1Bimá, a plataforma elevada utilizada para a leitura da Torá durante os serviços religiosos. Na antiguidade era feita de pedra, mas atualmente é uma plataforma retangular ou redonda de madeira à qual se acede através de poucos degraus.