General que liderou o exército israelense na Guerra da Independência, político, intelectual e arqueólogo, Yadin representou melhor do que ninguém o ideal sionista: defender a Pátria como soldado e, ao mesmo tempo, ser um intelectual.
No entanto, foi como arqueólogo que seu nome extrapolou as fronteiras de Israel para se consagrar como uma das maiores figuras da arqueologia mundial.
O ideal sionista e a arqueologia fizeram parte da vida de Yadin desde a mais terna idade. Yigael, cujo nome em hebraico significa "será redimido", nasceu em Jerusalém, em 21 de março de 1917. Era filho de Eliezer e Hasya Feinsold Sukenik, sionistas fervorosos que haviam emigrado da Polônia em 1912. Seu pai era arqueólogo, pioneiro em sua área de atividade e professor da Universidade Hebraica de Jerusalém; sua mãe, ativista em defesa dos direitos das mulheres, fundou o primeiro jardim de infância na então Palestina.
Aos 15 anos, Yigael entrou para a Haganá, grupo clandestino de defesa da comunidade judaica em Eretz Israel. Como todos os oficiais, passou a ser conhecido por um codinome secreto, Yadin, que significa "julgará". Depois da criação do Estado de Israel, Yigael adotou Yadin como sobrenome.
Yigael ficou na Haganá, da qual se tornaria uma das figuras-chaves, até 1946, quando vai estudar na Universidade Hebraica de Jerusalém. No ano seguinte, com a escalada da violência árabe contra o Ishuv, foi reconvocado à ativa. Em 1º de abril, então um dos comandantes da Haganá, Yadin encontra-se com Ben-Gurion para relatar que os árabes estavam estrangulando o Ishuv.
O plano de Yadin era arriscado e o gabinete sionista debate durante horas a proposta. No final, Ben Gurion força o desfecho, apoiando o deslanchar da ofensiva proposta por Yadin. Na nova fase da Guerra de Independência, de 1o de abril a 15 de maio, foi marcada por inúmeras iniciativas da Haganá, que garantiram o controle judaico sobre grande parte do território que, de acordo com a decisão da ONU sobre a Partilha, seria destinado ao futuro Estado de Israel. Em maio de 1948, quando o Estado de Israel foi declarado, Yigael Yadin tornara-se chefe de Operações da Haganá. A estratégia militar que Yadin desenvolveu durante a Guerra da Independência era, em parte, baseada em seus estudos das batalhas mencionadas na Torá e no conhecimento que possuía sobre as antigas e esquecidas estradas romanas. Costumava dizer que "a topografia da guerra não mudara muito". Durante os combates na região do deserto do Neguev, por exemplo, para driblar o exército egípcio, as forças israelenses usaram uma antiga estrada romana sobre a qual poucos tinham informações, apenas os estudiosos, entre os quais, Yadin.
Com o término da guerra, em 1949, e a vitória do exército por ele liderado, Yadin fez parte da delegação israelense que participou das negociações para a assinatura do armistício com os países árabes, realizadas na ilha grega de Rodes. Assim, aos 32 anos, já era um herói nacional.
No dia 9 de novembro do mesmo ano, foi indicado chefe do Estado-Maior, após a renúncia de Ya'acov Dori, cargo em que permaneceu até 1952. Durante seu comando, Yadin reorganizou as Forças de Defesa de Israel (FDI), o sistema de serviço militar obrigatório, implantando o modelo para reservistas ainda vigente nas FDI - um sistema inédito e único, no qual todos os homens devem servir um mês por ano até atingir a idade de 55 anos. Segundo estrategistas militares internacionais, este treinamento contínuo tem garantido a qualificação e superioridade das forças israelenses através das décadas.
Em 1952, após sérias desavenças com Ben Gurion a respeito do orçamento do exército - o então primeiro-ministro queria fazer cortes drásticos - Yadin deixa o cargo. Aos 35 anos, encerrava sua brilhante carreira como militar e retornava ao primeiro e grande amor de sua vida, a arqueologia.
Um novo começo
A Universidade Hebraica de Jerusalém recebeu de volta, de braços abertos, seu ex-aluno, dono naquele então, de uma extensa ficha de serviços prestados ao país. Pouco tempo depois, Yadin envolveu-se, assim como seu pai, Eliezer Sukenik, na aquisição dos Pergaminhos do Mar Morto, em nome do Estado de Israel. No livro The Message of the Scrolls (A mensagem dos pergaminhos), Yadin conta que, em novembro de 1947, chegaram às mãos de Sukenik fragmentos dos rolos. Imediatamente, ele se deu conta de sua importância. Na época, o mandato britânico havia dividido Jerusalém em duas áreas - a árabe e a judaica. Os pergaminhos estavam em Bethlehem, com um árabe que os queria vender. A situação estava muito tensa entre a população árabe e a judaica e, naquela mesma semana, a ONU debatia a Partilha da Palestina. Yadin pediu ao pai que não fosse a Bethlehem, cidade árabe, em busca dos pergaminhos, pois a Haganá recebera informações de que haveria atos de violência e hostilidade contra os judeus. Sukenik ignorou os conselhos do filho e, no dia 29 de novembro, foi à parte árabe de Jerusalém, onde tomou um ônibus para Bethlehem. Era o único judeu a bordo. No final do dia, voltou exultante com três pergaminhos enrolados num papel, debaixo do braço. Quando chegou em Jerusalém, soube que a Partilha fora aprovada pela ONU.
Yadin relembra: "Não pude evitar a sensação de que havia algo de simbólico na descoberta dos pergaminhos e em sua aquisição, no momento exato da criação do Estado de Israel. Parecia que os manuscritos ficaram esperando em cavernas, por dois mil anos, desde a destruição da independência de Israel até que Am Israel retornasse a seu lar ancestral e recuperasse a sua liberdade. O simbolismo fica ainda mais forte pelo fato de que os três primeiros pergaminhos foram comprados por meu pai, em nome de Israel, no dia 29 de novembro de 1947, no exato dia em que a ONU votou pela recriação de um Estado judaico na Terra de Israel, após dois mil anos... Foi uma experiência tremendamente empolgante, difícil mesmo de ser traduzida em palavras, ver os pergaminhos originais e estudá-los, sabendo que alguns dos manuscritos bíblicos foram copiados apenas alguns anos após sua composição, e que esses mesmos manuscritos foram lidos e estudados por nossos antepassados no período do Segundo Templo... Eles constituem um elo vital - perdido, há muito, e agora, recuperado - entre aquela época ancestral, tão ricos em raciocínio civilizado, e o momento atual..."
No entanto, Sukenik obtivera apenas três dos sete principais pergaminhos encontrados. Os outros quatro fizeram seu caminho em direção aos Estados Unidos, onde Athanasius Yeshue Samuel, o Metropolita1 da Igreja Siríaca Ortodoxa de São Marco, em Jerusalém, tentou vendê-los. Contudo, foi mais difícil do que havia imaginado. Acabou colocando um anúncio nos classificados do Wall Street Journal: "Vendem-se quatro manuscritos bíblicos do Mar Morto, que remontam, no mínimo a 200 a.E.C". Era o ano de 1953 e Yadin estava nos Estados Unidos para proferir umas palestras. Alguém chamou sua atenção sobre o anúncio e, através de intermediários, ele conseguiu comprar os pergaminhos para o Estado de Israel, completando, assim, a tarefa iniciada por seu pai. O preço pelos quatro pergaminhos foi de US$ 250.000, ou seja, US$ 62.500 cada. Hoje, os sete rolos estão abrigados no Santuário do Livro, no Museu Israel, em Jerusalém. O próprio Yadin editou dois dos sete rolos, o Pergaminho da Guerra e o Pergaminho Apócrifo de Gênese.
Em 1955, ele obteve o título de Doutor em Arqueologia, tendo por tema central de suas pesquisas os Pergaminhos do Mar Morto; e publicou um dos seus livros mais famosos - The Scroll of the War of the Sons of Light Against the Sons of Darkness (O Pergaminho da Guerra dos Filhos da Luz contra os Filhos das Trevas). A obra descreve o conteúdo de um dos famosos manuscritos encontrados em cavernas na região. Em 1956, por suas pesquisas e descobertas, recebeu o Prêmio Israel para Estudos Judaicos, o mais prestigioso concedido pelo governo israelense a cidadãos que se destacam em diversas áreas. Em 1964 foi laureado com o Prêmio Rothschild para Ciências Humanas.
Nas décadas de 1950 e 1960, Yigael Yadin realizou expedições em inúmeros sítios, chegando a grandes descobertas. Para ele, as ruínas do passado revelavam a grande conexão do Povo Judeu com a Terra de Israel. Entre 1956 e 1958, dirigiu uma importante escavação no sítio de Hazor, na antiga cidade do mesmo nome, situada ao norte da Galiléia, no que foi a maior expedição já organizada em Israel. Nela, foram treinados uma nova geração de arqueólogos israelenses, já líderes em sua profissão.
Em um Tel de enorme complexidade estratigráfica e com a Torá nas mãos, Yadin e suas equipes escavaram camada sobre camada de civilizações antigas. Yadin identificou 23 níveis de ocupação antes de atingir o leito da rocha. Um desses níveis o arqueologo identificou como sendo a cidade que Yehoshua Ben Nun queimara, durante sua conquista da Terra de Israel (Livro de Josué, 11:11). Encontrou também uma colônia mais tardia, que constituiu a primeira ocupação de hebreus naquela colina.
Massada
Na década de 1960 Yadin deu início ao trabalho que iria coroar sua carreira: as escavações em Massada. Lá mesmo, onde Herodes, o Grande, construiu um palácio-fortaleza de três andares, em uma montanha inóspita em pleno deserto da Judéia e onde, mais tarde, os judeus ousaram desafiar Roma. Durante a 1ª Revolta Judaica, um grupo de zelotes se refugiaram em Massada. Mesmo após Roma ter queimado Jerusalém e destruído o Templo, esses valentes judeus resistiram ao cerco romano até o ano de 73 ou 74 desta Era. Quando perceberam que seriam vencidos não se renderam, optando pelo Kidush Hashem - a morte em santificação do Nome Divino.
Poucos foram os sítios em que a realidade de outrora voltou à vida mais vividamente do que em Massada. Os achados foram extraordinários (V. artigo sobre Massada à página 30), lançando uma nova luz sobre um dos mais trágicos acontecimentos da história judaica da Antigüidade. Entre outros, foram encontrados 11 pequenos fragmentos de cerâmica com nomes inscritos em cada um. Em um deles aparece o nome "ben Yair", que pode ser o diminutivo de Eleazar ben Yair, líder dos rebelados; os outros podem ter pertencido aos últimos dez judeus, segundo o relato na obra de Flávio Josefo, os escolhidos para matar uns aos outros.
A história das descobertas foi detalhadamente descrita por Yadin em sua obra Masada: Herod's Fortress and the Zealots' Last Stand (1966).
Enquanto notícias sobre as descobertas ganhavam manchetes em jornais no exterior, em Israel não recebiam a atenção dos próprios governantes. Para Ben Gurion, um local onde os judeus haviam preferido se suicidar a enfrentar Roma não poderia ser reverenciado. Yadin, no entanto, discordava, e agiu para que as notícias sobre Massada fossem intensamente divulgadas, ao ponto de oferecer uma reportagem exclusiva para um jornal britânico. O resultado foi imediato - Massada e a história dos judeus na Antigüidade ganharam as páginas da imprensa internacional.
Com o passar do tempo, pelo seu significado histórico, tornou-se símbolo do orgulho nacional de Israel. A proclamação "Massada jamais voltará a cair" conquistou o coração dos israelenses e a montanha se tornou o local onde os membros das Forças de Defesa de Israel fazem seu juramento de lealdade ao Estado de Israel.
As cartas de Bar-Kochba
Yadin conduziu uma equipe que sistematicamente explorou cavernas na área onde foram encontrados os Pergaminhos do Mar Morto. Não havia outra maneira de chegar a esse local, a não ser sobrevoando a região de helicóptero e lançando os voluntários, pendurados em cordas, diretamente sobre a entrada das cavernas. E foi exatamente o que fez a equipe de Yadin. Nessas cavernas, ele encontrou pacotes de cartas, algumas das quais tinham sido escritas por Bar-Kochba, herói da 2ª Revolta Judaica contra Roma (132 a 135 E.C.). Yadin não soube, de pronto, se tais cartas eram realmente de autoria de Bar-Kochba. Apenas depois de cuidadosamente desenrolar os antigos pergaminhos, seu conteúdo pôde ser desvendado.
Para comunicar a natureza dos achados, ele escolheu uma ocasião em que as várias equipes tinham sido convidadas à casa do Presidente de Israel para fazer o relato das descobertas. Reunidos para a ocasião estavam, além do Presidente Yitzchak Ben-Zvi, o Primeiro Ministro David Ben Gurion, membros do Gabinete e do Knesset. Quando chegou a sua vez de fazer o relato, Yadin projetou na tela um slide de uma carta. Leu a primeira linha em voz alta: "Shimeon Bar Kosiba [Bar-Kochba], Presidente sobre Israel". A seguir, voltando-se na direção do Presidente de Israel, disse: "Excelência, tenho a honra de lhe dizer que descobrimos 15 despachos escritos ou ditados pelo último Presidente do Antigo Israel, há 1.800 anos". Yadin descreveu a reação: "Por um momento, o público parecia ter emudecido. Depois, pouco a pouco, o silêncio foi quebrado por gritos espontâneos de surpresa e júbilo".
Um dos responsáveis pela descoberta e compra de alguns fragmentos dos manuscritos do Mar Morto e férreo defensor da idéia de que os mesmos deveriam permanecer em Israel, Yadin foi o idealizador do Santuário do Livro, anexo do Museu de Israel, em Jerusalém, que abriga uma exposição permanente destes documentos, além de algumas das cartas de Bar-Kochba e outros artefatos antigos. O Santuário do Livro tem o formato da tampa do vaso onde os pergaminhos foram encontrados.
Carreira política
Ainda que se tenha dedicado à arqueologia, Yigael Yadin nunca se afastou completamente da vida pública. Às vésperas da Guerra dos Seis Dias, em junho de 1967, atuou como assessor militar do então primeiro-ministro Levi Eskhol. Logo após a Guerra de Yom Kipur, em outubro de 1973, foi membro da Comissão Agranat, criada em novembro do mesmo ano para investigar os acontecimentos que antecederam essa guerra e a falta de preparo do país diante de um conflito iminente com seus vizinhos árabes.
Em 1976 entrou para a política, com a formação do Movimento Democrático para a Mudança, partido conhecido pelo seu acrônimo em hebraico, Dash. Os principais catalisadores da mensagem do novo partido eram a luta contra a corrupção e a frustração generalizada da população em relação à Guerra de Yom Kipur, além de temas ligados aos contrastes sociais que começavam a surgir na sociedade e a defesa das mudanças no sistema eleitoral. Para muitos, Yadin era considerado o protótipo do israelense ideal: intelectual respeitado, militar brilhante e cidadão sem manchas de corrupção, ou seja, características consideradas necessárias pelos eleitores em alguém que deveria conduzir o país para uma nova realidade.
Em sua primeira disputa nas eleições de 1977, o Dash obteve 15 das 120 cadeiras do Knesset (Parlamento). Seus votos foram cruciais para a formação do primeiro governo de Menachem Begin e Yadin se tornou Vice Primeiro Ministro, um posto que manteve por mais de quatro anos. Nessa qualidade, ele desempenhou um papel fundamental nas negociações com o Egito, que acabaram levando à assinatura do Acordo de Camp David, que, entre 1978 e 1979, selou a paz entre Israel e os egípcios.
O partido, no entanto, acabou desmembrando-se em várias facções. Yadin uniu-se ao Partido Democrático, mas também não se adaptou e se manteve como parlamentar independente até o final de seu mandato, em 1981, quando se afastou da vida política e voltou, uma vez mais, à arqueologia.
Morreu em 1984, aos 67 anos, deixando sua esposa, Carmela Ruppin, parceira de toda uma vida privada e profissional, e duas filhas, Orly e Littai. Em sua curta vida, Yigael Yadin desempenhou muitos papéis - foi líder militar, político, arqueólogo. Teve uma paixão jamais suplantada pela arqueologia e pela história, por Israel e por nossa herança ancestral - mas, acima de tudo era um erudito.
Na empolgação silenciosa de seu estúdio, ele experimentou suas maiores emoções. Mais do que qualquer outro estudioso, ele entendeu o relacionamento entre o menor dos detalhes e a história com letras maiúsculas. Ele via as conexões onde nenhum outro conseguia ver...