A Hagadá de Pessach, recitada durante o Seder, conta a história de como o povo judeu, que começou como uma família de 70 pessoas, se tornou uma grande nação - o Povo escolhido por D-us para receber Sua Torá.
A Hagadá nos conta acerca de eventos que precedem e sucedem o Êxodo - a amarga escravidão sofrida por nossos antepassados, as Dez Pragas que venceram o Faraó, o Êxodo, a divisão do Mar e a outorga da Torá no Monte Sinai, entre outros. Mas, o clímax do processo de constituição dos judeus em uma nação ocorreu não em 15 de Nissan - dia do Êxodo e primeiro dia de Pessach - mas 50 dias mais tarde, quando D'us Se revelou a todos os Filhos de Israel e lhes deu a Torá - um evento que é comemorado na festa de Shavuot.
As festividades de Pessach e Shavuot são ligadas de forma indissolúvel. Começando na segunda noite de Pessach e terminando no dia antes de Shavuot, fazemos a contagem do Omer - um mandamento de grande significado místico. Durante os 49 dias dessa contagem, somos obrigados a trabalhar sobre nós mesmos e a aumentar nossa espiritualidade para que, em Shavuot, o dia cujo tema é nossa dedicação ao estudo e ao cumprimento da Torá, possamos estar em um nível espiritual mais elevado do que estávamos antes do início de Pessach. O processo do crescimento espiritual que se inicia em Pessach culmina, pois, em Shavuot.
A seguir analisaremos três marcos no processo que se iniciou quando Moshé foi enviado por D'us para libertar o Povo Judeu e que culminou com a Revelação Divina no Monte Sinai. Tais marcos são as Dez Pragas que se abateram sobre o Egito, a divisão do Mar de Juncos e o recebimento da Torá.
As Dez Pragas
Quando D'us se faz ver a Moshé e lhe atribui a missão de voltar ao Egito e libertar o Povo Judeu da escravidão, o profeta responde: "Mas eles não acreditarão em mim, nem ouvirão minha voz, pois dirão: 'O Eterno não apareceu a ti!'" (Êxodo, 4:1). D'us então lhe diz que tome seu cajado e o atire ao chão, e, ao fazê-lo, o cajado se transforma em uma serpente. O Eterno ordena que Moshé agarre o rabo da serpente, e ele obedece. A víbora volta a ser o cajado. D'us instrui Moshé a realizar esse milagre diante dos judeus para que "… creiam que o Eterno, D'us de teus pais - o D'us de Abrahão, o D'us de Isaac e o D'us de Jacob - apareceu a ti!" (Ibid, 4:5). Mas, caso um sinal não fosse suficiente para fazê-los acreditar, D'us dá a Moshé um segundo milagre, dizendo-lhe que se mesmo realizando os dois o povo não desse atenção a suas palavras: "Tomarás das águas do Nilo e derramarás no seco; e as águas que tomarás do rio tornarse-ão sangue no seco" (Ibid, 4:9).
Essa passagem da Torá deixa claro que D'us, que é Onisciente, sabia que a maneira mais rápida de fazer com que o Povo Judeu acreditasse Nele e em Moshé seria através da realização de milagres. Os judeus - escravizados, desesperados e desesperançados - necessitavam de milagres para acreditar que o D'us de seus antepassados não os tinha renegado. E assim, quando Moshé volta ao Egito, ele e seu irmão Aharon reúnem os anciãos judeus, diante de quem Moshé realiza os milagres, segundo as instruções Divinas. Ao testemunhar os milagres, "o povo acreditou, e compreenderam que o Eterno visitara os Filhos de Israel e vira sua aflição, e curvaram-se e se prostraram". (Ibid, 4:31). Quando Moshé e Aharon, então, invadem o palácio do Faraó e exigem a libertação do Povo Judeu, eles não pedem misericórdia nem ameaçam com algum tipo de rebelião. Em vez disso, realizam milagres, exatamente como haviam feito antes perante os judeus. Pois D'us havia dito a Moshé: "E não vos escutará o Faraó, e porei Minha mão sobre o Egito, e tirarei os Meus exércitos, o Meu povo, os filhos de Israel da terra do Egito, com grandes juízos. E o Egito saberá que Eu sou o Eterno, ao estender a Minha mão sobre o Egito, e tirarei os Filhos de Israel dentre eles". (Ibid, 7:4-5). De fato, a confrontação entre o líder egípcio e Aharon e Moshé foi um duelo sobrenatural. Para provar ao Faraó que falavam em Nome de D'us, Aharon atirou o cajado de seu irmão e o transformou em serpente. Mas o Faraó chama seus sábios feiticeiros, que conseguem repetir o feito. O rei egípcio pressupõe que Moshé e Aharon são magos como os seus, e não leva a sério sua alegação de que falam em Nome do Altíssimo. É nesse ponto que o episódio das Dez Pragas se inicia.
A primeira delas transformou o Nilo em sangue. Aharon ergue o cajado e toca o Nilo, tornando suas límpidas águas sangue puro. Mas os feiticeiros egípcios conseguem replicar esse milagre, e o Faraó, assim sendo, imagina que Moshé e Aharon apenas executavam mágicas - prática comum no Egito. Os bruxos egípcios conseguem, pois, replicar a segunda praga, mas não a terceira, e dizem ao Faraó que essa última não era magia, mas "o dedo de D'us". Mas o Faraó supõe que também a terceira deveria ser algum tipo de bruxaria mais elevada e que, certamente, os dois irmãos deviam ser melhores na magia que seus magos. Somente quando a sexta praga, a sarna, na realidade, bolhas que se transformavam em úlceras, causando grande sofrimento físico, assola o Egito, seus bruxos ficam totalmente desmoralizados. Pois, apesar de serem profundos conhecedores da magia negra, eles não conseguem proteger nem a si próprios. Tornava-se cada vez mais claro aos egípcios que Moshé não era um simples mago e que as pragas eram verdadeiramente obra de D'us.
À medida que as demais pragas trazem cada vez mais destruição e miséria ao Egito, os emissários do Faraó lhe imploram: "Até quando isto será um impedimento para nós? Envia os homens, e que sirvam ao Eterno, seu D'us" Ainda não notastes que o Egito está perdido?" (Ibid, 10:7). Mas foi preciso que viesse a décima e última praga - a morte dos primogênitos - para finalmente quebrar o Faraó. Ele tinha sido alertado várias vezes por Moshé para que tivesse a chance de se arrepender, salvando a si próprio e a seu povo. Bem verdade que D'us endurecera o coração do Faraó, dificultando o seu arrependimento, sendo isto uma forma de punição por suas más ações - mas a porta do arrependimento nunca esteve totalmente fechada para ele. Mas, apesar das pragas e do sofrimento que se seguiu, o Faraó se recusou a ver a Mão de D'us. Suas racionalizações, seu desprezo pelos demais e sua teimosia levaram à sua trágica queda e à destruição de seu poderoso reino.
No que tange ao Povo Judeu, eles observaram as Dez Pragas dizimarem o Egito enquanto permaneciam a salvo. Claramente, isso não foi obra do acaso. Com cada praga que atingia o Egito, os judeus se convenciam de que o D'us de seus antepassados não os tinha abandonado. Tinha vindo resgatá-los da escravidão e do genocídio, e interferia abertamente em Seu mundo para punir aqueles que vitimavam o Seu povo. Vinha salvá-los com Sua mão poderosa e Seu braço estendido.
A divisão do Mar
No entanto, nem as Dez Pragas foram suficientes para convencer os egípcios de que foi D'us - e não Moshé e Aharon - quem viera libertar os judeus. Apenas alguns dias após permitir que o Povo Judeu deixasse o Egito, o Faraó e a totalidade de seu exército saem à caça dos fugitivos judeus para trazê-los de volta. Apesar do terror das pragas, os egípcios estavam tão confiantes na vitória que, nessa saída militar, adornam seus cavalos com ornamentos em ouro, prata e pedras preciosas.
O Povo Judeu havia deixado o Egito no dia 15 de Nissan. Em torno do dia 20, o Faraó e seu exército tinham-nos alcançado. E os judeus se vêem presos em uma armadilha: tinham atrás de si o Faraó e seus homens, e à sua frente o Mar de Juncos. Apesar de tudo o que tinham presenciado no Egito, ficaram desesperados e gritam a Moshé: "Foi porque não havia sepulcros no Egito que nos trouxeste para morrer no deserto? O que nos fizeste, ao nos tirar do Egito?"(Ibid, 14: 11). Cheios de temor, os judeus dizem a Moshé: "Deixa-nos e serviremos aos egípcios. Pois nos é melhor servir aos egípcios do que morrer no deserto!" (Ibid, 14: 12).
Moshé ora a D'us e Ele lhe ordena: "Toma teu cajado e estende tua mão sobre o mar e fende-o, e que os Filhos de Israel entrem pelo meio do mar, em seco". (Ibid, 14: 16). As águas do Mar de Juncos se abrem, permitindo que os judeus atravessem. Os egípcios, que claramente não haviam aprendido a lição com as Dez Pragas, saem no seu encalço. Quando o exército do Faraó está no meio do mar, D'us começa a castigá-los. Em pânico, os egípcios exclamam: "Fugirei diante de Israel, pois o Eterno luta por eles contra o Egito!" (Ibid, 14: 25). Mas sua sorte já fora selada. Seguindo instruções Divinas, Moshé estende sua mão sobre o mar e, na manhã do 21o dia de Nissan, sétimo dia de Pessach - que, na Terra de Israel, é o último dia da festividade - as águas voltam a se unir e engolem todo o exército do Faraó.
A divisão do Mar foi o ponto culminante do Êxodo, pois mesmo depois de os judeus terem fugido do Egito, o exército desse país permaneceu intacto e a ameaça da volta à escravidão ainda existia. No mar, os judeus foram perseguidos por uma força militar extremamente poderosa, que facilmente os teria vencido e capturado. Segundo o Midrash, havia 30 egípcios para cada judeu. Somente quando o mar se dividiu e engoliu o exército egípcio foi que o êxodo judeu realmente se completou. No 15º dia de Nissan - dia em que os judeus deixaram o Egito, primeiro dia de Pessach - D'us puniu o Egito com a 10ª praga, mas os judeus deixaram o país como escravos em fuga. No 21º dia de Nissan, após a divisão do Mar, como vimos acima, os judeus se tornaram um povo verdadeiramente liberto. Contudo, há uma razão mais profunda para a divisão do mar ser mais importante do que as Dez Pragas. No Egito, os judeus presenciaram ocorrências sobrenaturais, mas quando o Mar de Juncos se abriu ao meio, todos os judeus adquiriram a condição de profetas. Está escrito no Midrash que mesmo o mais simples dos judeus "viu no Mar de Juncos o que não fora visto nem pelo profeta Ezequiel", cuja visão da Carruagem Divina é a base do estudo da Cabalá. No Mar de Juncos, os Céus se abriram; todos os judeus, mesmo as crianças, tiveram uma visão do mundo infinito. Por essa razão foi naquele momento, e não antes - nem mesmo durante as pragas que se abateram sobre o Egito - que "o povo temeu ao Eterno, e creram no Eterno e em Moshé, Seu servo". (Ibid, 14:31).
Antes dessa experiência profética, os judeus haviam testemunhado vários milagres e maravilhas. Mas sua fé em D'us e em Seu emissário não era absoluta. Como fizera o Faraó, eles também poderiam ter racionalizado sobre o que ocorrera no Egito. Talvez as Dez Pragas tivessem sido uma coincidência - muito pouco provável, certo, mas ainda assim uma coincidência. Talvez houvesse alguma explicação natural para elas terem caído sobre os egípcios e não sobre os judeus. Talvez o Faraó e seus feiticeiros estivessem certos: Moshé e Aharon eram apenas super-magos que tinham conseguido manipular a natureza para destruir o Egito, enquanto protegiam os judeus.
Resumindo, pura e simplesmente, as Dez Pragas não eram prova suficiente - nem para os judeus, que entraram em pânico diante da divisão do mar, nem para os egípcios, que foram atrás deles.
Mas, com a divisão do mar, tais dúvidas se desvaneceram. Os egípcios por fim reconheceram a verdade - infelizmente, quando já era tarde. Para os judeus, não se tratou de mais outro milagre, mas do ponto de partida para o objetivo supremo do Êxodo - o recebimento da Torá - que somente poderia ter ocorrido depois dos Filhos de Israel vivenciarem as revelações espirituais da divisão do mar. No sétimo e último dia de Pessach todos os judeus se tornaram profetas. D'us se tornou uma realidade tão palpável que, na Canção do Mar, entoada pelo Povo Judeu em louvor a D'us por sua salvação, as crianças proclamaram: "Este é meu D'us!", indicando claramente perceber a Presença Divina.
A experiência profética que ocorreu no Mar de Juncos preparou os judeus para a Revelação Divina que iria ocorrer no Monte Sinai, apenas 50 dias após o Êxodo.
A Revelação Divina no Sinai
Se o povo vivenciou a visão de D'us durante a divisão do Mar, que necessidade haveria da ocorrência da Revelação Divina no Monte Sinai?
São muitas as respostas, mas talvez a principal seja que é extraordinariamente difícil negar um evento testemunhado por milhões de pessoas. Um único indivíduo pode fabricar ou imaginar uma história, e as pessoas podem optar por acreditar ou não em suas palavras. Mas é muito difícil convencer terceiros da veracidade de um evento envolvendo milhões de pessoas se tal evento não ocorreu.
Se não tivesse ocorrido a Revelação Divina no Sinai, seria possível questionar a origem Divina do judaísmo. Poder-se-ia alegar que Moshé foi um grande líder carismático, um mago; mas jamais um verdadeiro profeta de D'us. Poder-se-ia mesmo acusá-lo de ser um impostor ou simplesmente desacreditá-lo, rotulando-o de um esquizofrênico que, no entanto, acreditava ter ouvido o chamado da Voz de D'us. Mas, quando até o mais simples dos judeus se tornou um profeta à beira do Mar de Juncos e, em especial, quando todos eles - milhões de pessoas - ouviram a Palavra de D'us aos pés do Monte Sinai, não mais havia lugar para dúvidas sobre a origem da Torá. Isto explica por que até mesmo os maiores oponentes de Moshé, como seu primo Corach, não puderam negar ser ele um verdadeiro profeta de D'us. Durante sua longa jornada de 40 anos pelo deserto, muitos judeus falsamente acusaram Moshé de crimes terríveis - nepotismo, roubo, até mesmo de adultério - mas eles nunca ousaram sugerir que ele fosse impostor, charlatão ou alucinado. Pois que eles, afinal, tinham presenciado a Revelação de D'us e quando Ele Próprio chamou Moshé para ascender ao Monte Sinai para receber a Torá. D'us Se assegurou de que seria impossível alegar que Sua Torá era um relato de ficção. E é por essa razão que mesmo os maiores inimigos do Povo Judeu, mesmo aqueles que quiseram converter todos os judeus, nunca negaram a verdade histórica do judaísmo.
Uma segunda razão para a Revelação Divina no Monte Sinai é que D'us transmitiu ao Povo Judeu os meios de se conectarem a Ele - e isto é feito através da Torá. Se Ele jamais Se tivesse revelado, as pessoas alegariam que a Torá era criação de Moshé. No Monte Sinai, D'us fez o Povo Judeu jurar que iria preservar a Torá: assim sendo, Sua Lei não poderia ser descartada com um código de leis criado pelo homem.
Através da Torá, D'us nos permitiu conectarmo-nos com Ele. Um homem pode considerar-se sábio e espiritualizado. Mas, pelo fato de ser finito, não pode compreender os Desígnios de D'us. O homem requer que D'us lhe aponte o que fazer. No Monte Sinai, D'us nos jogou uma corda que nos permite manter uma conexão com Ele. Quando estudamos a Sua Torá, absorvemos uma centelha de Sua Sabedoria Infinita. Quando realizamos Seus mandamentos, tornamo-nos instrumentos no cumprimento de Sua Vontade na Terra. E quando estendemos a mão para ajudar os outros, tornamo-nos agentes da bondade e plenitude Divinas no mundo.
Cinqüenta dias após deixarem o Egito, os judeus ouviram a Voz de D'us que lhes falava. O Mestre do Universo proclamou os Dez Mandamentos que são o núcleo dos 613 Mandamentos da Torá. Quem lê a Torá em hebraico sabe que os Dez Mandamentos foram dirigidos na 2ª pessoa do singular. No Monte Sinai, D'us não se dirigiu ao Povo Judeu como um todo. Ele falou pessoalmente a cada um de nós, pois a alma de cada um de nós esteve presente no Monte Sinai quando D'us Se revelou aos Filhos de Israel. E cada vez que abrimos a Torá, cada vez que a estudamos e praticamos o que nos ensina, estamos revivendo aquele dia tão monumental na história da humanidade.
A percepção do Divino
A Torá é eterna e é uma lição para todo judeu. Com efeito, a raiz da palavra Torá é Hora'á, que literalmente significa "instrução". Cada vez que estudamos um trecho da Torá, devemos tirar uma lição do mesmo. Quais são, portanto, as lições transmitidas por nosso estudo dos três marcos que vimos acima: as Dez Pragas, a divisão do mar, e a Revelação Divina no Sinai? Estes marcos representam três estágios na percepção que a pessoa tem de sua relação com D'us. O primeiro ocorre quando se vivencia um milagre - um evento muitíssimo improvável: uma cura milagrosa, um socorro financeiro quando mais se necessita, a salvação em momento de extrema dificuldade, uma coincidência extraordinária ou qualquer evento que nos leve a crer que o mundo não funciona por si só. Os milagres servem para nos lembrar que há Alguém que rege os acontecimentos e que nos guarda. A isso o judaísmo chama de Divina Providência.
Mas os milagres são apenas o primeiro estágio de conscientização sobre o Divino, pois dificilmente causam uma impressão duradoura. A pessoa pode ficar grata e se sentir inspirada por um milagre, e isto pode fazê-la reconhecer o envolvimento de D'us em sua vida, mas, mais cedo ou mais tarde, poderá vir a acreditar que o milagre foi apenas uma grande coincidência. Os egípcios testemunharam eventos sobrenaturais - as Dez Pragas - mas os racionalizaram como coincidências infelizes ou mágicas usadas para manipular a natureza. No que tange aos judeus, apesar dos milagres que presenciaram, foi somente no Mar de Juncos que eles finalmente "creram no Eterno e em Moshé, Seu servo".
O segundo estágio da ligação com D'us é simbolizado pelo episódio no Mar de Juncos. Como está escrito no Talmud, nós, judeus, talvez não sejamos todos profetas, mas descendemos dos profetas. Todos nós, em maior ou menor grau, possuímos um pequeno dom para a profecia. Todos tivemos experiências espirituais. Para alguns, pode ser algo simples como receber uma mensagem em um sonho que se torna realidade; para outros, pode ser um sexto sentido aguçado; e para poucos judeus privilegiados, pode ser algo tão dramático como ver almas ou vivenciar uma experiência de quase-morte, em que a pessoa tem uma visão do mundo futuro. Uma experiência genuinamente espiritual causa uma impressão bem mais acentuada do que um milagre, pelo fato de ser muito mais difícil de atribuí-la a uma coincidência. Um milagre é uma improbabilidade estatística, mas uma percepção do mundo espiritual é algo vivenciado. É um evento que transforma a vida de quem a percebe.
Contudo, podemos perguntar-nos: como podemos saber se uma experiência espiritual não é produto da imaginação ou de um alucinógeno? Como diferenciar um profeta de um esquizofrênico? No antigo Israel, quem alegava ter recebido uma mensagem profética era rigorosamente examinado por verdadeiros profetas e sábios para verificar de quem se tratava - profeta ou louco. Uma experiência espiritual tem valor quando serve de ponto de partida para se chegar a um nível mais alto de conscientização do Divino, o que é alcançado através do estudo e da prática de Sua Sabedoria e Vontade.
O fato de uma pessoa realizar milagres não significa nada; afinal, os feiticeiros idólatras egípcios eram magos de grande alcance. E mesmo as vivências espirituais genuínas, por mais fascinantes que sejam, não conseguem mudar o mundo. A pessoa pode meditar e mesmo levitar dias inteiros, mas, com isso, não fará deste um mundo mais Divino. Por outro lado, aquele que se dedica a estudar a Sabedoria Divina e a verdadeiramente cumprir a Vontade Divina, praticando atos de santidade e bondade, faz muito mais do que meramente tocar os Céus: essa pessoa traz os Céus para a Terra. O homem pode ser um milagreiro, profeta ou sábio - pode estar na mais alta das montanhas e compreender tudo o que pode ser compreendido - contudo, ele nada mais é do que um ser humano finito, com os pés no chão. Acima dele está um D'us Infinito, que é desconhecido, impalpável e que não pode ser compreendido. Como pode, então, o homem finito, por maior que seja, alcançar o Infinito? Sua própria libertação e a única libertação do mundo inteiro se dão quando o Altíssimo chega aqui embaixo e lhe diz, e diz a todos nós: "Estudem isto. Façam aquilo. E através de seu estudo de Minha Sabedoria e seu cumprimento de Minha Vontade vocês estão ligados a Mim". Quando isto acontece, o homem e D'us se unem a um tal ponto em que não mais existem o finito na Terra e o Infinito nos Céus. E passa a existir apenas UM.