Na costa Mediterrânea, entre Tel Aviv e Haifa, ergue-se Cesaréia, cidade moderna que mantém muito do esplendor de dois mil anos atrás, quando Herodes a tornou o maior porto do Império Romano. a grandiosidade da antiga cidade, foi revelada pelas Escavações arqueológicas realizadas nas décadas de 1950, 1960 e 1990.

Herodes, que Roma colocara no trono da Judéia em 37 a.E.C., recebera do imperador César Augusto, como recompensa por sua lealdade, a Torre de Straton, Pyrgos Stratonos, antigo porto fundado pelos fenícios, no século 3 a.E.C. Grande admirador da cultura greco-romana, o monarca transformou o porto, em um curto período de 13 anos - de 22 a 9 a.E.C. - na segunda maior cidade da Judéia, secundando apenas Jerusalém, e a chamou de Cesaréia, em homenagem a César Augusto, seu grande protetor.

Em suas obras Antigüidades e Guerra Judaicas, Flávio Josefo, historiador judeu do século 1o de nossa Era, conta que devido à profundidade do mar, Herodes teve que criar uma enseada artificial para erguer o novo porto, ao qual deu o nome de Sebastos, nome grego do imperador Augusto. O quebra-mar construído está atualmente a cinco metros abaixo do nível do mar. Para construção do novo porto, maior do que o famoso porto de Atenas, Pireus, Herodes importou tecnologia e materiais desenvolvidos por engenheiros romanos, em particular uma argamassa pozolânica, usada para preencher as estruturas de madeira colocadas na água para erguer as fundações do porto. Esta material constitui ligante muito potente na construção de grandes estruturas, especialmente por suas propriedades hidráulicas que permitem que as fundações sejam lançadas sob a água. Duas destas estruturas de madeira, uma quase intacta, foram encontradas por arqueólogos.

Essencial para o comércio entre o Império Romano e o Oriente, Cesaréia tornou-se rapidamente o maior porto em funcionamento na costa oriental do Mediterrâneo, rivalizando com os de Jaffa e Acre. Além do valor estratégico e econômico, a importância da cidade estava diretamente relacionada à vontade de Herodes em fazer desta o maior centro de cultura greco-romano na Judéia.

Totalmente murada, a cidade de 200 acres era uma poli, uma cidade greco-romana em sua estrutura e concepção. Flávio Josefo relata que Herodes a construíra "inteiramente em pedra branca, ornando-a de palácios magníficos. E foi lá, mais do que em qualquer outra parte, que Herodes implementou a grandeza do seu gênio".

Sobre um pódio elevado diante do porto, o monarca erguera um templo dedicado ao imperador César Augusto. Na parte meridional da cidade estava o palácio real, cuja grandiosidade foi revelada pelas escavações realizadas ao longo de décadas. As duas colunas com inscrições em grego e latim encontradas, com nomes dos governadores romanos da Província da Judéia, comprovam que o palácio real ficou em uso durante todo o período romano.

Como em toda cidade romana, havia em Cesaréia inúmeros edifícios públicos e locais de entretenimento. Na parte sul da cidade, de frente para o mar, foi construído o primeiro teatro romano do Oriente Médio, com milhares de lugares distribuídos em uma estrutura semicircular arqueada. O piso da orquestra era revestido de gesso pintado, passando a ser de mármore em período posterior. Havia, ainda na costa meridional, um amplo anfiteatro onde, a cada quatro anos, eram realizados jogos. Pelas dimensões, forma e instalações conclui-se que o anfiteatro também era usado para corridas de cavalos e bigas. Relata Josefo que Herodes ergueu no local uma gigantesca figura de César, não menor do que o Zeus olímpico, uma das sete maravilhas do mundo antigo. Na época de sua construção, o anfiteatro acomodava 8.000 espectadores, sendo sua capacidade ampliada para 15.000, no século 1o da Era Comum. Os lados oriental e setentrional ainda estão bem preservados, enquanto o ocidental foi destruído em grande parte pela ação do mar. Atualmente, o anfiteatro não é apenas uma relíquia do passado, mas um local moderno no qual são frequentemente realizados shows e espetáculos.

Para garantir à cidade constante suprimento de água potável, Herodes construiu um aqueduto de mais de 18 km, que se estendia ao longo da costa trazendo água de fontes localizadas no sopé do Monte Carmel. A água entrava pelo norte e corria por um sistema de tubulação às cisternas e fontes da cidade. Um sistema de drenagem por baixo da cidade levava o esgoto para o mar.

Dois anos após a morte de Herodes, no ano 6, a Judéia passou a ser governada diretamente por procuradores romanos, que fizeram de Cesaréia a capital administrativa da região e o quartel-general da 10ª Legião Romana.

Presença judaica

Embora erguida nos moldes de uma cidade helênica, havia em Cesaréia uma comunidade judaica grande e poderosa, que vivia lado a lado com pagãos helenizados, principalmente gregos. Desde a época dos macabeus, quando no ano 96 a.E.C., por um breve período, o porto fez parte do reino hasmoneu, um número crescente de judeus vivia na cidade.

As disputas entre a comunidade judaica e os pagãos helenizados eram freqüentes em Cesaréia, sendo que uma dessas deu início, no ano 66 desta Era, aos distúrbios que resultaram na 1a Grande Revolta Judaica (66-73). As grandes revoltas movidas pelos judeus da Judéia contra o Império Romano não devem ser encaradas apenas como sublevações por um povo colonizado. Eram também o resultado do confronto entre o judaísmo, seus valores e a cultura grega adotada pela grande maioria dos habitantes do Império Romano, principalmente no Oriente.

O distúrbio precursor da 1a Grande Revolta teve início quando alguns gregos realizaram uma cerimônia pagã, na entrada da sinagoga. Os judeus consideraram o ato um insulto e apelaram para as autoridades romanas. Adeptas da cultura grega, estas desprezavam o judaísmo e favoreciam os não judeus que viviam na Terra de Israel. Quando as autoridades se pronunciaram contra os judeus, a população grega da cidade celebrou a vitória entrando no bairro judaico e massacrando milhares de pessoas. A guarnição romana nada fez para impedir a violência.

Ao chegar a Jerusalém, as notícias das mortes causaram tumulto. Os ânimos se acenderam ainda mais quando Florus, o procurador romano, apoderou-se de uma grande quantidade de objetos de prata do Templo Sagrado. Enfurecidos e revoltados, milhares de judeus atacaram e destruíram uma pequena praça militar localizada em Jerusalém. Era o início da 1a Grande Revolta.

Para reprimi-la, Roma enviou à Judéia o general romano Vespasiano, que fez de Cesaréia o seu quartel-general, até ser empossado imperador, no ano 69. Seu filho, Tito, ficou encarregado de debelar a revolta na Judéia e foi ele quem liderou o ataque final a Jerusalém e ao Grande Templo. Ambos tombaram em Tisha B'Av do ano 70. Dezenas de milhares de judeus foram mortos e outros tantos levados pelos romanos como escravos.

A maioria da comunidade judaica de Cesaréia foi morta durante a guerra travada contra Roma e, no anfiteatro construído por Herodes, em comemoração ao aniversário de seu irmão, Domiciano, Tito obrigou cerca de 2.500 judeus a lutar contra animais selvagens.

Durante a 2a Revolta Judaica (132-135), mais uma vez a cidade foi palco de tortura e execução de milhares de judeus, entre os quais Rabi Akiva, um dos maiores e mais importantes sábios e líderes religiosos da história judaica, e todos os seus discípulos.

No século 2o desta Era, Cesaréia transforma-se em uma das mais importantes cidades da parte oriental do Império Romano e, a partir do início do século 3o, volta a crescer o número de judeus que viviam na cidade. É nesta época que Rabi Eleazar Ha-Kappar, conhecido como Bar Kappara, funda um centro de estudos talmúdicos que chegava a rivalizar com o de Séforis, encabeçado pelo Rabi Yehudah Ha-Nasi.

Com a divisão do Império Romano, Cesaréia passou a fazer parte do Império Bizantino. A Cesaréia bizantina, cuja população era composta por cristãos, samaritanos e judeus, era cercada por uma muralha de 2,5 quilômetros que servia de proteção aos bairros residenciais construídos fora da cidade de Herodes. No período, o porto interno foi bloqueado, sendo erguidos edifícios no local. O anfiteatro também perdeu sua função original e, em seu lugar, construíram um palácio de dois andares.

A vinda dos árabes

Cesaréia foi conquistada em 639 pelos exércitos árabes. Os 20 mil judeus que viviam na cidade, oprimidos e discriminados pelas autoridades cristãs bizantinas, receberam com alívio os conquistadores. Apesar de o porto ser totalmente abandonado, a fertilidade das áreas ao redor de Cesaréia fazia desta uma das mais prósperas cidades da região.

Em 1101 os exércitos cruzados liderados pelo rei Balduíno I, conquistam a cidade. Sob os cristãos, a vida dos judeus se torna muito difícil, o que fez com que em 1170 apenas 20 lá vivessem. Em 1187, após um cerco de curta duração, Cesaréia cai nas mãos de Saladino, Salah al-Din Yusuf bin Aiub, responsável por reconquistar os territórios perdidos pelo Islã, inclusive a maior parte do reino de Jerusalém. No entanto, a cidade ficaria em mãos islâmicas por poucos anos, sendo novamente reconquistada em 1191 por Ricardo Coração de Leão, rei da Inglaterra, que consegue expulsar os muçulmanos. Durante os séculos 12 e 13 o controle sob Cesaréia era exercido ora pelos cruzados ora pelos muçulmanos.

Na segunda metade do século 13, o rei francês Luís IX decidiu restaurar e fortificar a cidade. É desse período a impressionante fortaleza cruzada que até hoje pode ser vista, como lembrança de outros tempos. Mas, as fortificações não bastaram para resistir às forças islâmicas lideradas pelo sultão mameluco Baybars.

Em 1265, temendo um retorno dos cruzados, os conquistadores mamelucos derrubaram completamente as fortificações da cidade, deitando-as por terra. Entulhos bloquearam o escoamento das águas do aqueduto que, por mais de mil anos, abastecera a cidade. As águas não represadas espalham-se, transformando o norte de Cesaréia em pântano e formando enormes dunas, com o correr dos anos.

A cidade permaneceu abandonada até que, em 1878, os turcos otomanos lá assentaram refugiados muçulmanos vindos da Bósnia. O vilarejo foi abandonado durante a Guerra da Independência, em 1948.

Após 1948

Moderna e próspera, a Cesaréia de nossos dias abriga parques empresariais e tecnológicos. É também um dos principais pontos turísticos do país, com um majestoso sítio arqueológico. Escavações realizadas na década de 1950 e 1960 por arqueólogos israelenses e estrangeiros trouxeram à luz impressionantes vestígios da grandiosidade da cidade de Herodes e da época cruzada. A partir de 1990, duas novas expedições iniciaram trabalhos na região: uma dirigida pelo Departamento de Antiguidades de Israel e outra, a Expedição Conjunta de Cesaréia, um empreendimento do Centro de Estudos Marítimos da Universidade de Haifa em conjunto com a Universidade de Maryland e o Instituto de Arqueologia da Universidade de Haifa.

Em 2006, foi inaugurado na cidade o primeiro museu submerso do mundo. Desde então, os visitantes podem mergulhar e ver as ruínas do magnífico porto construído por Herodes.

Bibliografia:

Artigo de Richard Gottheil e Samuel Krauss, "Caesarea by the Sea", ? Enciclopédia Judaica

Artigo de Jacqueline Schaalje, "Caesarea, Archaeology in Israel", http://www.mfa.gov.il/MFA