“Sou americano, sou judeu, minha família do lado de meu pai é sionista”. As palavras, pronunciadas sob a pressão vil do terrorismo, transformaram-se em um símbolo de um dos episódios mais nefastos da história do jornalismo: a morte de Daniel Pearl, o correspondente do Wall Street Journal seqüestrado e brutalmente assassinado por militantes islâmicos no Paquistão, em fevereiro de 2002.

Um ano depois da tragédia, a memória do repórter é homenageada nos quatro cantos do planeta. 

Nos Estados Unidos, a Fundação Daniel Pearl, o Centro Simon Wiesenthal, a Liga Anti-difamação, entre outras entidades, realizaram diversas cerimônias. A Fundação, criada pelos familiares do jornalista assassinado, definiu como seu objetivo a promoção do “entendimento transcultural através do jornalismo, da música e da comunicação inovadora”. Destacam-se entre os apoiadores e integrantes da organização o ex-presidente norte-americano Bill Clinton e o escritor Elie Wiesel, Prêmio Nobel da Paz.

Houve também eventos em Israel que homenagearam a memória de Pearl, como cerimônias religiosas e debates sobre os riscos envolvidos no trabalho de um correspondente internacional. O mundo jornalístico também se mobilizou. O Press Club de Los Angeles e a Associação de Jornalistas do Sul da Ásia instituíram prêmios anuais que levam o nome do correspondente do Wall Street Journal. 

No âmbito comunitário de diversos países também ocorreram homenagens a um profissional destacado por seu talento e brilho. Um exemplo: uma comunidade judaica de East Brunswick (Nova Jersey) resolveu colocar o nome do jornalista assassinado em seu centro educacional. O site britânico JewishComment elegeu Pearl a “personalidade do ano de 2002”. 

Escreveu a editora Carol Gould, do Jewish Comment, ao explicar a escolha: “Acima de tudo, escolhemos Danny porque ele não tinha medo de dizer ‘sou judeu’ com orgulho e com a antiga coragem de seus antepassados, num momento em que ele devia saber que estava enfrentando uma prematura jornada à Eternidade”. O texto prossegue: “Seus últimos dias devem ter sido insuportavelmente solitários e terríveis, mas a partir das poucas fotos que o mundo recebeu de seus captores, ele manteve sua dignidade e parecia tão merecedor de ser chamado de um homem de valor”.

Terroristas islâmicos seqüestraram Daniel Pearl a 23 de janeiro de 2002, na cidade paquistanesa de Karachi. O correspondente do Wall Street Journal havia abandonado sua base, em Bombaim, na Índia, para, em mais uma missão jornalística envolta em riscos, tentar repetir os passos de Richard Reid, o extremista que, levando explosivos em seu sapato, tentou explodir em dezembro de 2001 um avião que fazia o trajeto Paris-Miami. A reação rápida da tripulação impediu que ele acendesse o pavio.

Após contato com militantes islâmicos na portuária Karachi, Pearl desapareceu. Passaram-se várias semanas sem sinal do jornalista. Sua morte foi confirmada em 21 de fevereiro de 2002.

Quatro dos seqüestradores foram condenados, por assassinato, em 15 de julho, num tribunal paquistanês. O principal executor do plano, Omar Saedd Sheik, recebeu a pena de morte e seus asseclas, a prisão perpétua. O número 3 da organização terrorista Al Qaeda, Khalid Sheikh Mohammad, preso no Paquistão no começo de março, é tido como o responsável pelo golpe fatal que ceifou a vida de Daniel Pearl.

Em um dos depoimentos gravados em vídeo pelos terroristas e obtidos por autoridades norte-americanas, Pearl afirmava: “Minha família segue o judaísmo. Fizemos inúmeras visitas a Israel. Na localidade de Bnei Brak, existe uma rua que leva o nome de meu bisavô, Chaim Pearl, que foi um dos fundadores da cidade”. O antepassado do jornalista deixou Ostrowitz, na Polônia, e com mais de vinte famílias fundou, na década de 20, Bnei Brak.

O pai de Daniel, Yehuda, mudou-se de Israel para os Estados Unidos nos anos 60, a fim de empreender uma carreira acadêmica de sucesso e voltada ao estudo de inteligência artificial. Seu filho nasceu em Princeton, mas quando tinha dois anos de idade, a família se mudou para Los Angeles. O futuro correspondente do Wall Street Journal se graduou na Universidade de Stanford, em 1985, e foi, antes de tornar-se chefe do escritório na Índia do principal jornal de negócios do mundo, seu correspondente em Londres, Paris e no Oriente Médio.

Judeu e portador de dupla cidadania (norte-americana e israelense, por conta da origem de seus pais), Daniel Pearl nunca deixou de cumprir missões jornalísticas por temer riscos provocados por sua origem. Depois da tragédia, o correspondente brutalmente assassinado transformou-se num símbolo luminoso da luta contra a barbárie.