Claude Lanzmann, cineasta francês, intelectual e jornalista, mais conhecido internacionalmente por seu documentário “Shoah” sobre o Holocausto, faleceu em 5 de julho de 2018, aos 92 anos. Judeu secular e sionista apaixonado, Lanzmann sempre esteve na linha de frente em defesa de Israel.

Como Claude Lanzmann se autodefinia? Em sua autobiografia, La Force des Choses (Força das Coisas, em português),Simone de Beauvoir relata que Lanzmann dizia: “Sou judeu (...) Quando, aos 13 anos de idade, descobri o antissemitismo, senti sacudir meu mundo, não ficando pedra sobre pedra (...)”.

Tendo lutado na La Résistance, a Resistência Francesa, ainda adolescente, durante a ocupação da França pela Alemanha, ele afirmava que sua experiência durante a 2ª Guerra Mundial lhe tinha revelado que a imagem dos judeus, como povo resignado, humilhado, perseguido, não refletia o que eles eram. O judeu, dizia, “(...) é um povo combatente”. “Os seis milhões de homens, mulheres e crianças exterminados pelos nazistas pertenciam a um grande povo, não predestinado ao martírio, mas vítima de barbárie gratuita(...)”.

Sua vida

Nascido numa família de judeus, em Paris, em 27 de novembro de 1925, Claude Lanzmann era o mais velho de três irmãos. Armand, o pai, era já nascido na França; sua mãe, Paulette, fugira dos pogroms russos com a família no início do século 20. Em 1934, Paulette abandonou marido e filhos, pondo um fim abrupto a seu casamento. Claude e seus dois irmãos passaram a viver com o pai em uma fazenda, em Brioude, até ir para o ginásio, em Clermont-Ferrand.

Claude vivenciou o antissemitismo, pela primeira vez, na década de 1930, no colégio. O evento vai marcá-lo profundamente. Em uma entrevista em 2013 à revista The New Yorker, relembrou: “Escondido atrás de uma coluna no playground do colégio, fiquei olhando, petrificado. Não tentei intervir, aterrorizado de poder ser descoberto. Assisti aos meus colegas de classe praticamente lincharem um garoto judeu magricela, ruivo, chamado Lévy, que tinha todas as feições das caricaturas antissemitas do pré-guerra. Eram 20 contra um – e bateram nele até sangrar”.

Em 1939, quando estoura a 2ª Guerra Mundial, Claude tinha 14 anos. Os nazistas ocuparam a França, e seu pai, preocupado com a segurança dos filhos, cavou um buraco, não maior do que um túmulo, no jardim da casa onde viviam, em Clermont-Ferrand, onde cabiam seus três filhos. Instruiu-os a se esconderem, rápida e silenciosamente, no buraco, que lhes serviria de esconderijo da Gestapo. Claude se recorda que, em 1941, eram 4 horas da madrugada quando soou a campainha. Poderia ter sido a SS. No mês anterior, todos os judeus da cidade tinham sido reunidos e despachados para “algum lugar”. Os três jovens tinham treinado inúmeras vezes para saber como agir caso as SS aparecessem em sua residência. Desceriam rapidamente as escadas, voando porta afora e de lá para o esconderijo. As dobradiças das portas tinham sido bem azeitadas para não fazer barulho. Escondidos no buraco, os três irmãos viram, de repente, uma figura escura acima deles. Mas não era a Gestapo, e sim seu pai testando-os uma vez mais. E os reprimiu dizendo, “Vocês fizeram barulho”. Claude se lembrava do fato nitidamente, apesar das várias décadas transcorridas.

Durante a ocupação, seu irmão menor, seu pai e ele lutaram na Resistência Francesa contra os nazistas. Aluno interno no Liceu Blaise-Pascal, em Clermont-Ferrand, Claude filiou-se à Jeunesses Communistes (Juventude Comunista). O partido forneceu armas e panfletos da Resistência a ele e seus camaradas. À noite, eles praticavam tiro nos depósitos do colégio. Claude ingressou nas fileiras da Resistência, em Auvergne, participando ativamente da luta contra a ocupação alemã. Contrabandeava armas e munição para o movimento. Seu pai era um dos líderes locais do Movimento Unificado da Resistência (MUR). No entanto, apenas em fevereiro de 1944, ele e o pai descobririam o que o outro estivera fazendo.

Em entrevista ao Der Spiegel, em 2011, contou: “Estive envolvido em várias emboscadas, como artilheiro e carregador de metralhadoras (...). Certo dia, no verão de 1944, emboscamos um comboio alemão a caminho do front, na Normandia. Atirei e certamente matei alemães”. Seus pais e seus irmãos também sobreviveram à guerra

Mas a guerra nunca terminou, de verdade, para Lanzmann, como Beauvoir escreve em suas memórias, “(...) seu rancor contra os não-judeus nunca desapareceu, de verdade”.

Com o término da guerra, Lanzmann se mudou para Paris, onde cursou Filosofia, na Sorbonne. No final da década de 1940, lecionou Filosofia e Literatura, na então Alemanha Ocidental. Ao lhe perguntarem por que decidira lecionar na Alemanha, alegava que queria ver alemães à paisana. Numa certa ocasião, seus alunos pediram que desse um seminário sobre o antissemitismo. O adido militar francês em Berlim lhe ordenou que desistisse, em sinal de respeito às “sensibilidades políticas”.

Lanzmann irritara os funcionários da Chancelaria francesa por ter publicado um artigo sobre a declarada simpatia pelos nazistas por parte da administração da universidade. Mas, Lanzmann não desistiu e deu o seminário.

Ele acabou abraçando o jornalismo. Escreveu uma série de artigos para o jornal Le Monde enquanto viajava ilegalmente pela então recém-criada Alemanha Oriental. Muito provavelmente foi o primeiro jornalista ocidental a fazê-lo.

Lanzmann e Sartre

Seus artigos atraíram a atenção do filósofo existencialista, Jean-Paul Sartre (1905-1980), a quem admirava muito. Em 1946, lera a obra “Antissemita e Judeu”, de Sartre, logo ao ser publicada, escrevendo: “Ele entendeu-nos como ninguém mais”. Na obra, o autor atacava o antissemitismo, mal que havia tomado a França, tentando entendê-lo.

Entre outras, Sartre afirmava que alguns de seus compatriotas consideravam que ser antissemita era simplesmente “ter uma opinião”, como tantas outras. Para ele, qualquer ideia que negasse aos outros a sua própria humanidade não merecia ter o status de ser uma “opinião”. Afirmava, também, que o antissemitismo não era uma forma de pensar, mas uma paixão racista estruturada por uma forma específica de lógica: os judeus me deixam desconfortável, não confio neles, desprezo-os, portanto, isso com certeza significa que há algo de errado neles.

Em 1952, Sartre convidou Lanzmann para uma de suas soirées parisienses, e lá este último conhece Simone de Beauvoir, escritora e filósofa existencialista. Sartre de pronto convida-o para colaborar em sua revista de esquerda, Les Temps Modernes, fundada em 1945, da qual Simone também fazia parte.

Durante vários anos, Lanzmann manteve estreito relacionamento com Simone, 18 anos mais velha do que ele, e que se tornaria uma grande amizade. A experiência de guerra de Claude também muito a atraía, pois ela, como Sartre, pouco tinha feito para resistir aos nazistas. Foi dela que Claude recebeu grande parte do apoio financeiro para o documentário “Shoah”.

Les Temps Modernes costumava defender causas da esquerda francesa, tais como a independência da Argélia. Claude juntou-se a Sartre assinando um manifesto que conclamava os soldados franceses a se recusarem a lutar na Argélia, e foi, mais tarde, indiciado por apoiar a Revolução Argelina.

Passou os 15 anos seguintes como colaborador e, posteriormente, editor da revista. Escreveu longos artigos sobre Israel, a Coréia do Norte e o Tibete. Em 1986, quando da morte de Simone, Lanzmann passa a ser editor-chefe, posto em que continuou pelo resto de sua vida.

Lanzmann e Israel

Em 1952, quatro anos após a fundação de Israel, Lanzmann faz sua primeira viagem ao país; queria fazer uma série de reportagens sobre o jovem Estado. Apaixonou-se de imediato. No navio que o levou até lá conheceu alguns heróis da Guerra de Independência, como o general e comandante das Forças de Defesa de Israel (IDF), Ygal Allon.

Ao relembrar essa viagem, Claude costumava mencionar outro passageiro, Julius Ebenstein, musicólogo vienense que saiu da Áustria antes do Anschluss1, em 1938, e que se tornou um grande amigo. “Mesmo sem ser um homem de posses, convidou-me para ficar em sua casa se um dia passasse por Tel Aviv. E foi o que fiz. Acabei lá ficando por três meses. Eram tempos muito difíceis (...) os alimentos eram racionados e chegava-se a passar fome(...)”.

Enquanto permaneceu no país, o cineasta procurou absorver todos os aspectos da jovem nação e de sua população, que lutava para sobreviver. Lá, teve a oportunidade de confrontar sua relação com o judaísmo. E concluiu: “A existência de Israel jamais representou um risco ou incômodo para mim, como francês (...). Jamais me censurei pelos meus sentimentos como judeu”.

Ao retornar a Paris, escreveu mais de 100 páginas de reportagens. Após a visita a Israel, pareceu-lhe que o livro de Sartre, o “Antissemita e judeu” – em particular a sua tese de que “é o antissemita quem cria o judeu”, – necessitava de uma revisão.

Um de seus grandes projetos foi uma edição especial de mil páginas de Les Temps Modernes sobre o conflito árabe-israelense, editado e publicado por ele juntamente com Sartre. A edição, porém, concedeu mais de metade das páginas ao lado dos árabes. Aliás, começava com ataques a Israel. Lanzmann passou dois anos editando esse número, que foi publicado justamente no dia 5 de junho de 1967 – primeiro dia da Guerra dos Seis Dias. Como veremos mais adiante, a “resposta” de Lanzmann à edição especial do Les Temps Modernes sobre o conflito palestino-israelense seria seu primeiro documentário, “Pourquoi Israel”.

Apesar da esquerda se distanciar cada vez mais de Israel, Lanzmann mantinha sua posição de feroz defensor do país. Provavelmente, a única grande diferença entre Lanzmann e Sartre foi a questão do Oriente Médio. Durante visita a Israel, o filósofo recusou encontrar-se com qualquer pessoa em uniforme militar, levando ao que Lanzmann chamou de “uma visão drasticamente reduzida do país”. Sartre via Israel como nação imperialista.

Em 1967, quando de Gaulle anunciou um embargo de armas a Israel, no início de junho, Lanzmann pressionou Sartre a assinar uma petição pró-Israel; este último imediatamente lamentou o fato e o relacionamento entre ambos nunca voltou ao que era.

Numa manifestação em Paris, em 2 de junho daquele ano, Claude declarou que a destruição de Israel – “uma segunda aniquilação”, em suas palavras, – seria pior do que o Holocausto. “Israel é a minha liberdade. Sem Israel, sinto-me nu e vulnerável”. Ele não era uma voz solitária entre os intelectuais judeus franceses, que faziam coro a suas preocupações e compartilhavam sua opinião de que Israel enfrentava sua iminente destruição. Estes intelectuais rejubilaram-se com a rápida vitória de Israel e se sentiram traídos pela coletiva de imprensa feita por de Gaulle, em 27 de novembro de 1967, na qual, usando uma linguagem não ouvida em público desde a 2ª Guerra, ele descreveu os judeus como “um povo elitista, seguro de si e dominador”.

A atitude de Sartre em relação a Israel fica clara em artigo pouco conhecido, onde ele chega ao ponto de justificar o massacre dos atletas israelenses em Munique, nas Olimpíadas de 1972, pela Frente Popular pela Libertação da Palestina, com o argumento de que prevalecia um estado de guerra entre o “establishment” israelense e os palestinos. Em sua polêmica em defesa dos assassinos, comparava as forças revolucionárias que lutaram contra os franceses na Argélia com a luta palestina contra Israel. Não se podia apoiar os primeiros, dizia, sem apoiar os segundos.

Como jornalista, Lanzmann cobriu vários conflitos em Israel e no Oriente Médio. Após a Guerra dos Seis Dias, ele volta a Israel para fazer uma reportagem para a TV francesa sobre os combates no Canal do Suez. Teve, então, a oportunidade de passar muito tempo com as tropas na fronteira com o Egito durante a Guerra de Atrito. Foi nessa época que conheceu Ariel Sharon. Na mesma viagem, num restaurante, em Jerusalém, conhece Angelika Schrobsdorff, escritora e atriz judia que, em 1939, fugira de Berlim, com a mãe e a irmã, para Israel. Apaixonados, os dois se casam em 1974. Era o segundo casamento de Lanzmann; o primeiro tinha sido com Judith Magre. O casamento chegou ao fim em 1990. Cinco anos mais tarde, Lanzmann se casa com a médica Dominique Petithory, especialista em Nutrição e Epidemiologia, com quem teve dois filhos, Angélique e Felix.

Ser judeu no mundo contemporâneo

Considerado um inovador da linguagem do cinema, suas três principais obras “Por que Israel”,de 1973;Shoah”, de 1985, e “Tzahal”, de 1994, sobre as Forças de Defesa de Israel, lidam essencialmente com a mesma temática: o ser judeu no mundo contemporâneo. São diferentes facetas de um mesmo tema e revelam os fortes vínculos de Lanzmann com o judaísmo. Sua trilogia também mudou a estrutura tradicional dos documentários em termos de filmagem, estilo e sistemática.

Com três horas de duração, “Pourquoi Israel” foi lançado em 1973. Lanzmann trabalhou cerca de três anos no documentário, que apresenta entrevistas com israelenses de todos os tipos e origens – intelectuais e operários, asquenazitas e sefarditas, religiosos e seculares, judeus do kibutz e judeus chassídicos. No documentário, ele procura retratar os conflitos sociopolíticos, a questão das imigrações e problemas de adaptação dos recém-chegados. Passa-se no início da década de 1970, época da primeira onda de imigração dos judeus russos.

Além de atender seus anseios pessoais, “Por que Israel” é, também, uma resposta à esquerda francesa e aos que lutaram com ele contra o colonialismo francês, na Argélia. Queria deixar patente a diferença entre a luta justificada do Estado Judeu pela sobrevivência e o colonialismo europeu, na África e na Ásia. O trabalho foi selecionado pelo Festival de Nova York e exibido no Lincoln Center, em outubro de 1973, no primeiro dia da Guerra de Yom Kipur. No circuito de Paris, o filme estreou com uma crítica triunfal.

Sobre Israel, Lanzmann costumava afirmar: “Até hoje, não há soluções fáceis. Conheci o antissemitismo do pré-guerra, aterrorizante para uma criança. Tentem imaginar o desaparecimento de Israel(...). Ser judeu é uma condição com a qual se nasce, mas é também uma conquista. E o Estado de Israel foi fundamental para a conseguirmos”.

“Pourquoi Israel” se inicia e termina no Yad Va’shem, memorial ao Holocausto, em Jerusalém. Ao assisti-lo, alguns de seus amigos israelenses sugeriram que ele fizesse também um documentário sobre os campos de morte. Foi o que ele fez. “Shoah” seria seu segundo documentário.

Com a duração de mais de 9 horas, “Shoah” é um testemunho do Holocausto através de uma angustiante seleção de entrevistas. As gravações e filmagens do documentário começaram em 1974. Foi inicialmente encomendado por Aluf Hareven, um de seus amigos no Ministério de Relações Exteriores de Israel, que queria um filme de duas horas sobre o Holocausto, contado “a partir da perspectiva judaica” e sugeriu que ele fizesse um filme não “sobre a Shoá, mas que fosse a própria Shoá”.

Lanzmann passou 11 anos lendo sobre o assunto; entrou em contato com historiadores especializados no Holocausto, entrevistou e filmou mais de 350 horas. Dedicou mais de cinco anos apenas à edição do material bruto. As entrevistas que ele não incluiu no filme, totalizando 220 horas, foram adquiridas pelo Museu Memorial do Holocausto, de Washington, em 1996.

Em sua autobiografia, “The Patagonian Hare” (A Lebre da Patagônia, em tradução livre), de 2009, ele escreveu: “Durante 12 anos tentei fixar meu olhar, implacavelmente, no sol negro da Shoá”. Falando ao The Arts Fuse, em 2012, declarou: “Se eu tivesse estado em um dos campos, jamais poderia ter feito esse filme. “Shoah” não trata de sobrevivência. Nem de sobreviventes. Trata da morte”. O documentário não contém imagens de arquivos, tampouco trilha musical. Apenas depoimentos e entrevistas – arrepiantes e inesquecíveis. Uma testemunha atrás da outra revive sua parte naquele horror. Intercaladas nas entrevistas há paisagens, locais onde os nazistas haviam erguido os campos de morte – e tomadas de trens percorrendo os mesmos trilhos que, outrora, levaram às câmaras de gás.

Quando “Shoah” estreou em 1985, Claude Lanzmann tinha 59 anos. Considerado uma obra prima, recebeu muitos prêmios, inclusive um Oscar na categoria Melhor Documentário.

Em seus demais filmes, ele usou o mesmo método de exaustivas entrevistas. “Tzahal” (1994) foi feito em conjunto com as FDI, de quem obteve acesso pleno e irrestrito. O filme é constituído por uma série de entrevistas com soldados e civis sobre o exército israelense.

Outros

Lanzmann utilizou várias entrevistas que faziam parte do material bruto de “Shoah” na produção de outros documentários. “A Visitor from the Living” (Um Visitante do Mundo dos Vivos), de 1999, trata de um funcionário da Cruz Vermelha que fez um relatório favorável sobre o Gueto de Theresienstadt. Em 2001, é a vez de “Sobibor: October 14, 1943, 4 p.m.” – uma entrevista com Yehuda Lerner, participante do bem-sucedido levante no campo de extermínio de Sobibor.

Em 2010, ele lançaria “The Karski Report” (Relatório Karski). Em 1978, após um silêncio de mais de 30 anos, Jan Karski concordou em ser filmado em sua casa durante dois dias. Mas no filme “Shoah”, Lanzmann usaria apenas 39 minutos do perturbador testemunho. Membro da resistência polonesa, Karski foi contatado em 1942 por líderes do Gueto de Varsóvia para ver, com seus próprios olhos, os horrores do Holocausto e, a seguir, levar as informações aos líderes aliados, pedindo ajuda.

Lançado em 2013, “The Last of the Unjust” (O Último dos Injustos) é uma entrevista com Benjamin Murmelstein (1905-89), líder judeu no campo de Theresienstadt, “parada intermediária” para os judeus que acabariam sendo enviados aos campos de extermínio. Theresienstadt pretendia ser um “gueto modelo” aos olhos do mundo e, como líder do Conselho Judaico, cabia a Murmelstein garantir a fachada de “saúde e felicidade” dos judeus presos no gueto.

Em 2017, com “Napalm” (2017), Lanzmann redireciona suas lentes para a Coreia do Norte, visitando esse recluso país e recontando suas impressões de uma visita anterior, durante o final da década de 1950, após a Guerra da Coreia.

Depois disso, Lanzmann dirigiu o seriado para a televisão lançado em 2018, “The Four Sisters”, (As Quatro Irmãs). O seriado, em quatro episódios, volta a examinar as experiências dos sobreviventes do Holocausto. O seriado apresenta entrevistas com quatro sobreviventes que haviam sido cortadas do filme “Shoah”.

Uma história de vida única e multifacetada

No início de sua autobiografia, “The Patagonian Hare”, ele declara que se tratava de uma “história única e multifacetada”. “Quando vejo o que fiz na minha vida”, afirmava, “acredito que tenha vindo ao mundo para representar a verdade; nunca brinquei com ela”.

Lanzmann foi um homem que viveu intensamente, apaixonadamente. Defendia abertamente seu povo, em todas as ocasiões. Era um homem de ação, combatente corajoso de la Résistance, esquiava destemidamente, escalava montanhas como poucos, era um piloto nato, um intelectual e autor de um jornalismo visionário. E triunfou como escritor e cineasta graças ao seu talento de, em suas palavras, “entrar na razão e na loucura, nas mentiras e nos silêncios daqueles a quem eu quis retratar (...). Considero-me um vidente”. Até os filmes que ele apenas esboçou e não realizou são obras de arte.

Como cineasta, acumulou vários prêmios, entre os quais o do Círculo da Crítica de Nova York (1985); da Crítica de Cinema de Los Angeles, 1985; e o Prêmio Peabody de Jornalismo, 1987, pelo documentário “Shoah”. Em 2004, recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Escola Graduada Europeia, na Suíça.

Lanzmann sofreu algumas tragédias em sua vida. Em 1966, sua irmã, Évelyne, cometeu suicídio e, em 2017, seu filho Félix, de 23 anos, morreu de câncer. Lanzmann morreria um ano depois, sem nunca parar trabalhar... até a sua morte.

1 Anexação da Áustria à Alemanha, em 1938.

BIBLIOGRAFIA

Lanzmann, Claude,The Patagonian Hare:
A Memoir
. eBook Kindle

Entrevista de Ed Vulliamy “Claude Lanzmann: the man who stood witness for the world”. Publicado no The Guardian, março de 2012 https://www.theguardian.com

Artigo de David H. Van Biema “Filmmaker Claude Lanzmann Devotes 11 Years of His Life to a Biography of Death”, publicado em 10 fevereiro de 1986, , People Magazine , https://people.com/archive/

Artigo de Richard Brody “Witness, Claude Lanzmann and the making of “Shoah”. Publicado no The New Yorker, 19 de março de 2012 https://www.newyorker.com/