Tishá b´Av – o nono dia do mês hebraico de Menachem Av – é o dia nacional de luto para o Povo Judeu. Nessa data, jejuamos durante mais de 24 horas e choramos a queda de Jerusalém e seu Templo Sagrado e os muitos outros episódios trágicos na História Judaica, vários dos quais ocorreram ou se iniciaram em Tishá b’Av.

Como tanto o primeiro quanto o segundo Templo Sagrado de Jerusalém tombaram em Tishá b’Av, esse dia simboliza o exílio do Povo Judeu  da Terra de Israel e todos os problemas e sofrimentos daí decorrentes. Milhões de judeus foram massacrados quando o antigo estado judeu desmoronou e outros milhões foram exterminados pouco antes do moderno Estado Judeu renascer. No meio tempo – quase 2.000 anos – o Povo Judeu continuamente sofreu horrores indescritíveis: discriminação e demonização, expulsão em massa e pogroms, conversões forçadas e Inquisições – tudo isso culminando no Holocausto.

Mesmo a fundação do Estado Judeu não significou um fim ao violento antissemitismo. Israel é o único  país no mundo cujos inimigos conclamam à sua aniquilação. Além de ter de lutar guerras por sua sobrevivência, o Estado de Israel sempre foi alvo de covardes atos terroristas, que visam a assassinar indiscriminadamente civis inocentes, inclusive bebês e crianças, mulheres e idosos. Mesmo após termos retornado à nossa Pátria ancestral, não encontramos paz.

Tishá b’Av é o dia mais triste no calendário judaico, mas não é o único dia de luto para o nosso povo. Em Israel, o Yom HaShoá – Dia da Recordação do Holocausto – ocorre no dia 27 de Nissan. Nessa data, recordamos os quase sete milhões de judeus (não seis milhões, como muitos pensam) exterminados pelos vilões mais diabólicos da história da humanidade. Alguns dias mais tarde, no quarto dia do mês de Iyar, Israel observa o Yom HaZikarón – Dia da Recordação. Este ano, o Estado Judeu recordou suas 23.169 vítimas de guerra e terrorismo.

Tishá b’Av não é um dia apenas de tristeza, mas também um dia em que devemos fazer um balanço em nossa consciência, um Cheshbon Ha’Nefesh. Além de jejuar e observar as restrições e costumes do dia, relatamos os pecados e erros que levaram à destruição e ao exílio – o ódio infundado entre os judeus e a guerra civil que eles enfrentaram mesmo quando lutavam contra Roma. No nono dia de Av, nós também recordamos os pecados que levaram à queda do Primeiro Templo: idolatria, violência, imoralidade e flagrante desrespeito pela Torá.

O processo de Cheshbon  Ha’Nefesh é sempre benéfico:  sempre podemos melhorar, individual e coletivamente. No entanto, uma autocondenação excessiva não o é. Não podemos culpar-nos por todas as tragédias que se abateram sobre o nosso povo. Não temos o direito de julgar-nos e a outros judeus  de forma tão desfavorável. Nossos antepassados que viveram no antigo Israel podem ter feito escolhas insensatas e erros graves – alguns cometeram mesmo pecados terríveis – mas nada justificou 2.000 anos de exílio e sofrimento. Nada do que eles fizeram justifica os pogroms, as humilhações e as expulsões em massa, as fogueiras da Inquisição, as câmaras de gás e os diabólicos experimentos médicos do Holocausto. Nada justifica o assassinato de sete milhões de pessoas, inclusive de quase dois milhões de crianças, durante a Shoá.

As inúmeras perguntas acerca da razão para os sofrimentos desproporcionais do Povo Judeu não são novidade, naturalmente. Estão bem além do escopo deste artigo. Talvez estejam além do escopo de todas as palavras que já foram pronunciadas por seres humanos.  A Torá, que é o projeto Divino  para o mundo e uma fonte pura e não adulterada da Sabedoria Divina, provê as respostas a todas as perguntas, exceto a uma – a questão do sofrimento humano. De fato, D’us não nos forneceu respostas a tais questões.

À luz do silêncio da Torá, como nós, judeus, podemos lidar com  as questões levantadas por  Tishá b’Av? O que dizer a nossos filhos quando eles nos perguntam sobre o Holocausto? O que dizer  a nós mesmos? Como continuar a  ser um judeu que tem confiança  em D’us e orgulho de seu povo, apesar dos dois milênios de sofrimento?  A resposta não reside, como muitos creem, na criação do Estado de Israel. Os triunfos militares do Estado Judeu não removem a dor inexorável do Holocausto. É por isso que o país inteiro para e observa dois minutos de silêncio em Yom HaShoá e discute, ano após ano, quais as lições que devemos aprender do Holocausto.

Não podemos reescrever a História. As palavras, por mais bonitas ou inspiradoras que sejam, não podem mudar o passado: elas servem de pouco conforto para aqueles que sofreram ou perderam entes queridos. Só se pode mudar o presente e o futuro. Há apenas uma coisa que podemos fazer acerca do passado: mudar a maneira como o percebemos. Não podemos desfazer as tragédias ocorridas em Tishá b’Av ou as que ocorreram em virtude de Tishá b’Av, mas podemos perceber a História Judaica de forma diferente. Não podemos trazer de volta à vida aqueles que morreram no Holocausto, mas podemos vê-los sob uma luz diferente.

Para manter nossa fé em D’us e nos orgulharmos com nossa história e herança, precisamos ver a História Judaica sob diferentes lentes. Precisamos entender que a história de nosso povo é feita de heroísmo e de martírio.

A história de Rabi Chanina ben Teradyon

Um dos maiores Sábios da História Judaica foi Rabi Chanina ben Teradyon, sogro de Rabi Meir – Rabi Meir Ba’al Haness (o Mestre do Milagres). Rabi Chanina viveu durante tempos muitos difíceis para o Povo Judeu. O Império Romano, que tinha ocupado a Terra de Israel e destruído o segundo Templo Sagrado de Jerusalém, desejava extirpar o judaísmo da face da Terra mediante a proibição, sob pena de morte, do ensino da Torá. Apesar do decreto romano, certos rabinos e líderes judeus, Rabi Chanina ben Teradyon entre eles, continuaram a estudar e ensinar a Torá. Eles perceberam – assim como o percebeu Roma – que a Torá é o sangue vital do Povo Judeu. Para difundir a Torá para o maior número possível de judeus, garantindo, assim, a sobrevivência de seu povo, Rabi Chanina dava aulas em público, apesar do perigo daí decorrente.

O Talmud nos conta o seguinte relato: Certa vez, Rabi Chanina ben Teradyon fez uma visita a seu colega e mestre, Rabi Yose ben Kisma, que estava enfermo. Este último, preocupado com a segurança do discípulo, volta-se para Rabi Chanina e diz: “Chanina, meu irmão, não sabes que dos Céus nos impuseram, como governantes, esta nação (Roma), que destruiu a Morada de D’us, queimou Seu Santuário, matou Seus filhos piedosos e fez com que perecessem seus nobres, e esse governante estrangeiro ainda vive... E, no entanto, contaram-me que você passa os dias dedicado ao estudo da Torá, e realiza encontros públicos, à luz do dia, para difundi-la, com um rolo da Torá abertamente em seu colo. Ficarei surpreso se eles não o queimarem vivo, junto com o rolo da Torá”.

Rabi Chanina ignora a advertência de seu mestre. Faz, então, uma pergunta a Rabi Yose ben Kisma, cuja resposta devia ser óbvia: “Rebe, merecerei um lugar no Mundo Vindouro?”. A resposta de Rabi Yose foi ainda mais desconcertante: “Eu não sei”, disse. “Diga-me uma ação positiva sua que justificasse o seu mérito de receber um lugar no Mundo Vindouro”.

Rabi Chanina conta a Rabi Yose acerca de um ato de caridade que ele realizou e, após ouvi-lo, Rabi Yose lhe diz que ele terá, sim, seu lugar assegurado no Mundo Vindouro.

Poucos dias depois, Rabi Yose ben Kisma deixa este mundo. Ele era  um homem tão proeminente que  até mesmo os dignitários romanos vão a seu funeral. Ao retornarem do cortejo fúnebre, encontram Rabi Chanina ensinando a Torá em público, com um rolo da Torá em seu colo.  Enrolaram-no nesse pergaminho da Torá e puseram fogo nele. Para prolongar seu sofrimento, os romanos trouxeram tufos de algodão, molhados n’água, colocando-os sobre seu coração, para que ele morresse lentamente. Enquanto o fogo cresce, os alunos perguntam a Rabi Chanina: “Mestre, o que vê?”. E ele responde: “O fogo está consumindo o pergaminho em branco da Torá, enquanto as letras estão subindo aos Céus”. 

Muitos comentários foram escritos sobre essa enigmática passagem talmúdica. Ela dá origem a muitas perguntas. Como pôde Rabi Chanina ben Teradyon, um Sábio que dedicou e arriscou sua vida para ensinar e difundir a Torá, duvidar que ele teria um lugar no Mundo Vindouro? Ainda mais perturbadora foi a resposta de Rabi Yose, de que não estava certo sobre o lugar de Rabi Chanina no Olam Habá.

A resposta não é que eles eram pessoas que duvidavam de seu valor. A resposta é que para homens da estirpe de Rabi Chanina ben Teradyon, morrer pela Torá era um privilégio e não um ato de sacrifício que requeria a recompensa de um lugar no Mundo Vindouro. Para um judeu como ele, o ensinamento, a divulgação e a preservação da Torá eram atos supremos: ele iria estudar e divulgar o judaísmo ainda que arriscasse a sua vida. Ele estava pronto a abrir mão de sua vida em prol da Torá, independentemente de receber como garantia uma recompensa em sua vida futura. 

Suas palavras finais a seus alunos refletem sua atitude frente a vida e a morte: a parte física do rolo da Torá – o pergaminho – está queimando, mas a parte espiritual – suas letras, que transmitem santidade ao rolo da Torá – estão subindo aos Céus, retornando à Fonte de toda a santidade. De modo semelhante, Roma e os outros inimigos do Povo Judeu podem queimar rolos de Torá e destruir corpos judeus, mas não conseguem tocar nossa alma e a luz do Judaísmo – pois esta eles não conseguem extinguir.

A história de Rabi Akiva

Ao longo de toda a História Judaica, houve vários Sábios, que, como Rabi Chanina ben Teradyon, abriram mão de sua vida para assegurar a eternidade do judaísmo. O mais famoso deles foi Rabi Akiva.

O Talmud narra o seguinte: quando Moshé subiu ao Monte Sinai para receber a Torá, D’us lhe revelou os feitos de Rabi Akiva, que iria viver muitas gerações mais tarde. Após ter uma visão da extraordinária sabedoria e erudição desse Sábio, Moshé perguntou a D’us:  “Mestre do Universo, tendo alguém como ele, é a mim que entregas a Tua Torá? Entrega-a através de  Rabi Akiva”. D’us lhe respondeu: “Cala-te! Foi assim que decidi e a ti não cabe opinar”. Moshé então pergunta a D’us: “Mestre do Universo, mostraste-me os ensinamentos de Torá de Rabi Akiva, agora mostra-me a sua recompensa”. “Vira-te”, D’us diz a Moshé. Ele assim o faz e o que vê o choca: ele vê o corpo mutilado de Rabi Akiva, após ser executado por Roma. “Mestre do Universo!”, Moshé protesta, “Esta é a Torá e esta é a sua recompensa?!”. D’us lhe responde, “Cala-te! Foi assim que decidi e a ti não cabe opinar”.

Para apreciar quão significativa e quão enigmática é essa passagem do Talmud, precisamos entender quem foi Rabi Akiva. Em toda a História Judaica, ele foi o único a ser comparado a Moshé Rabenu. Segundo algumas opiniões, ele até superou o nível espiritual do maior profeta judeu de todos os tempos. Rabi Akiva foi o maior mestre do Talmud – pilar da Lei, Tradição e Sabedoria Judaicas.  Ademais, ele, sozinho, salvou o judaísmo.  Moshé Rabenu trouxe a Torá dos Céus à Terra, mas foi  Rabi Akiva quem assegurou que não fosse perdida. O judaísmo existe hoje graças a Rabi Akiva. 

Como Rabi Chanina ben Teradyon, Rabi Akiva também viveu na Terra de Israel durante tempos muito difíceis, quando o Império Romano fez de tudo para extirpar o judaísmo da face da Terra. Percebendo que a Torá corria o risco de se perder, Rabi Akiva organizou e sistematizou seus ensinamentos para que fossem adequadamente transmitidos de uma geração a outra. 

Ensinam nossos Sábios que  “Toda a Torá está de acordo com os ensinamentos de Rabi Akiva”. Isto porque graças ao seu trabalho incessante em prol do judaísmo e graças aos ensinamentos que transmitiu a seus discípulos principais – entre eles, Rabi Shimon bar Yochai – autor do Zohar –  e Rabi Meir Ba’al HaNess –  o Mestre dos Milagres – a Torá não se perdeu.

Por ter ensinado a Torá em público, Rabi Akiva foi preso e encarcerado pelas autoridades romanas, que o sentenciaram à morte. O governador romano na Terra de Israel não se contentou com meramente executar o maior Sábio judeu. Por ter frustrado os malignos planos de Roma, por ter salvo o judaísmo e, assim, assegurado a sobrevivência do Povo Judeu, Akiva seria torturado até a morte. Roma escolheu para ele a forma mais excruciante de execução: ele seria rasgado, pedaço por pedaço, até morrer, com rastelos de ferro. 

Como Rabi Akiva reagiu à sua morte? Protestou ao Mestre do Universo, como Moshé havia feito por ele?   Vejamos este relato talmúdico sobre sua execução. Enquanto o carrasco romano realizava a pavorosa execução – e seu corpo era rasgado, em pedaços – Rabi Akiva sorria – quase rindo, mesmo. Ninguém entendia o que se passava. O governador romano, não acreditando no que via, virou-se para ele e disse: “Você deve ser um demônio! Não é possível que um ser humano possa suportar tanto sofrimento e fique sorrindo!”. Os alunos de Akiva, chocados com o que viam, perguntaram-lhe: “Rebe, o que está acontecendo? Como pode sorrir num momento destes?”.

Prestemos atenção às palavras finais de Rabi Akiva – dirigidas tanto a seus carrascos quanto a seus alunos. “Este é o momento mais glorioso de minha vida!”, declarou. “Todos os dias, de manhã e à noite, recito o Shemá: proclamo minha fé em D’us, proclamo a unicidade de D’us, proclamo como devemos amar a D’us, assim como está escrito:  ‘E amarás o Eterno, teu D’us, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua força’. Sempre entendi a parte ‘com toda a tua alma’ como sendo ‘às custas de tua alma’, e sempre me perguntei quando teria a oportunidade de cumprir este mandamento – sacrificar minha alma em favor de D’us”.

“Hoje isso está acontecendo”, Rabi Akiva concluiu. “Hoje estou sendo morto por ser judeu. Hoje estou sendo morto por minha fé em D’us e por fortalecer esta fé entre os demais. Não é, então, este, o grande momento de minha vida – quando posso renunciar à minha vida em favor de D’us?”.

A seguir, Rabi Akiva recitou o verso inicial do Shemá: “Escuta, ó Israel, o Eterno é nosso D’us, o Eterno é Um”, e sua alma ascendeu à Eternidade.

Assim ensina o Talmud: no ponto mais alto dos Céus reside a alma de Rabi Akiva, bem como as almas de todos os judeus de todas as gerações que foram mortos pelo simples fato de serem judeus.

Uma nação de mártires

A história de Rabi Akiva não é apenas a história de um único homem, mas de uma nação. O maior de nossos Sábios personificou seu povo. Através de nossa história, mas especialmente durante o Holocausto, muitos caminharam para a morte com o Shemá em seus lábios. Muitos caminharam para as câmaras de gás não apenas rezando, mas cantando. No Holocausto, quase sete milhões de judeus foram assassinados,  morreram Al Kidush Hashem – pela santificação do Nome de D’us.  Eles pagaram o preço supremo por serem judeus. Eles foram submetidos a um teste ainda mais difícil do que o de Avraham e Itzhak.

Diz-se que “morre Al Kidush Hashem” um judeu morto pelo simples fato de ser judeu. Tal morte significa a maior das elevações espirituais. No entanto, nem o judaísmo nem o Povo Judeu glorificam o martírio e a morte. Valorizamos a vida acima de quase tudo. Grande parte do destino de nosso povo não foi escolhido por nós. Não buscamos nem provocamos um ataque a nosso povo e a nosso estilo de vida. O Povo Judeu nunca constituiu ameaça aos países onde viveu.

A grande maioria dos judeus assassinados no Holocausto eram pobres e religiosos. Não eram ameaça para ninguém – política ou economicamente, muito menos em aspecto belicoso. Eles não esperavam nem provocaram uma confrontação com o mal. Mas, diz-se que a verdadeira medida da força de um povo é como eles se alçam para dominar o momento quando  surge a confrontação. Apesar de  seu indescritível sofrimento,  o Povo Judeu manteve-se judeu durante os 2.000 anos de sua Diáspora, e, mais notadamente, durante o Holocausto.
 
Há inúmeras histórias de judeus que deram sua vida para salvar a de outros. Apesar de viverem à sombra de seus carrascos, eles não perderam a coragem nem a dignidade. Havia judeus nos campos de morte que colocavam diariamente os Tefilin, que comiam Matzá em Pessach, que acendiam velas de Shabat. Havia judeus famintos – verdadeiros esqueletos humanos – que se recusavam a comer em Yom Kipur; outros que abriam mão da ração semanal para conseguir emprestado um livro de orações, para poderem recitar algumas rezas. Havia judeus que dançavam em Simchat Torá enquanto eram conduzidos à morte, o que levou seus carrascos nazistas a comentarem, entre si, o que o carrasco romano disse à Rabi Akiva: “Não podem ser seres humanos. É impossível que um ser humano aguente tanto sofrimento e se alegre desta forma...”

Durante o Holocausto, quando a escuridão caía sobre o mundo e nosso povo era consumido em chamas, os Céus estavam lotados com milhões de judeus que chegavam. Quando pensamos naquela geração de judeus – no que passaram e sobreviveram e como foram capazes de reconstruir o Povo Judeu e restabelecer a Pátria Judaica na Terra de Israel e revigorar o Judaísmo – torna-se claro que a capacidade de nosso povo é praticamente ilimitada. 

A era do Holocausto foi uma era de heróis e mártires judeus e eles se alçaram mais alto do que as estrelas – eles ascenderam à Eternidade. Eles fizeram o impossível. Eles conseguiram o impensável. E se alguém se perguntar como o Estado de Israel pôde vencer a Guerra da Independência – como os judeus de Israel venceram contra grandes adversidades – foi porque eles não lutaram sozinhos: lutaram ao lado de uma legião Celestial de quase sete milhões de judeus.

O Legado de Joseph Trumpeldor

Através da História Judaica, muitos judeus renunciaram à sua vida em favor de D’us e do Judaísmo. Mas sempre houve judeus que arriscaram e até renunciaram à vida pelo Povo Judeu e por nosso direito de viver em liberdade e dignidade. Um dos maiores mártires modernos do nosso povo foi Joseph Trumpeldor.  Nascido em 1880, ele era um judeu russo destemido – um socialista ardente e precursor do sionismo – que perdeu um braço no cerco de Port Arthur durante a guerra russo-japonesa. Trumpeldor mudou-se para a Terra de Israel, tornando-se líder da Legião Judaica – precursora das Forças de Defesa de Israel. Em 1o de março de 1920, centenas de árabes atacaram o assentamento de Tel Hai, na Alta Galileia. Trumpeldor foi seriamente ferido na sangrenta batalha que se seguiu. Quando chegou um médico, era muito tarde. Trumpeldor, ciente que estava prestes a deixar este mundo, confortava o médico e seus irmãos-em-armas dizendo: “Ein davar, tov lamut be’ad artzeinu” (Não faz mal, é bom morrer por nossa terra).

As palavras finais de Joseph Trumpeldor se tornaram o lema oficioso do Estado de Israel. Mas não visavam a promover a morte para a Pátria. Ele estava dizendo a seus irmãos-em-armas que não chorassem pela forma de sua morte: ele lhes reassegurava que aceitava sua morte com bravura. Trumpeldor entendeu que seu sacrifício contribuiria, ao menos em parte, para o restabelecimento de uma Pátria judaica, e, portanto, para a salvação do Povo Judeu. Em seus últimos momentos de vida, esse herói judeu percebeu que sua vida e sua morte não tinham sido em vão: seu legado contribuiria para a eternidade de seu povo. De fato, ele foi saudado como herói nacional por todos os lados do espectro político antes e após a criação do Estado Judeu.

Como Rabi Chanina ben Teradyon e Rabi Akiva, Joseph Trumpeldor teve uma morte famosa. Milhões de judeus na Diáspora e mais de 20.000 judeus no Estado de Israel também deram sua vida pelo judaísmo e pelo seu povo, mas suas mortes não foram famosas e seus nomes não são encontrados no Talmud nem nos livros-texto das escolas de Israel. 

O tema do último Yom HaShoá em Israel foi, “Toda pessoa tem um nome”.  De fato, cada um deles teve seu nome. Eram filhos e filhas, pais e mães, irmãos e irmãs, maridos e mulheres, professores e amigos.  O fato de seus nomes não se terem tornado famosos torna seu martírio ainda mais significativo. Talvez não saibamos seus nomes, mas jamais os esqueceremos.

Neste Tishá b’Av, o Povo Judeu, a mais antiga nação que vive na face da Terra, se prostrará de luto e recitará a Meguilat Eichá – as Lamentações de Jeremias. Jejuaremos e rezaremos, e, ao lembrarmos os sofrimentos de nosso povo, lamentaremos e choraremos – abertamente ou em nosso coração.  Mas ao fazê-lo, também devemos sentir-nos abençoados por pertencer a uma nação de heróis e mártires – do passado e do presente. Neste último Yom HaZikarón, o Primeiro Ministro Binyamin Netanyahu fez uma declaração sobre os 23.169 mártires do Estado de Israel que se aplica também a todos os judeus de todas as gerações que morreram por serem judeus. “Não estaríamos aqui se não fosse pelo seu sacrifício. Não estaríamos aqui não fosse por sua disposição em entregar sua vida para que pudéssemos estar aqui”.  D’us abençoe sua memória. D’us abençoe o Povo Judeu, e D’us abençoe o Estado de Israel.

Tishá b’Av: O Dia da Redenção

Agora concluiremos com uma história do Talmud sobre Rabi Akiva, que sempre insistiu que tudo que D’us faz é para o bem e que foi aquele que enfrentou sua morte com júbilo e orações.

Após a destruição do segundo Templo Sagrado, quatro Sábios – Rabban Gamliel, Rabi Elazar ben Azariá, Rabi Yeshoshua e Rabi Akiva – estavam a caminho de Jerusalém. Quando chegaram a Har HaTzofim e viram a cidade de Jerusalém destruída, rasgaram suas vestes em sinal de luto. Chegando ao Monte do Templo, viram uma raposa surgir do local onde era o Kodesh HaKodashim. Este era o local mais sagrado do Templo, onde apenas o homem mais santo de Israel, o Cohen Gadol, podia entrar, e apenas no dia mais sagrado do ano – Yom Kipur. Ao presenciar essa cena, Rabban Gamliel, Rabi Elazar e Rabi Yeshoshua começaram a chorar, mas Rabi Akiva pôs-se a sorrir. Eles então lhe disseram: “Por que sorris?” Ao que ele respondeu: “Por que estão a chorar?” E eles disseram: “É um local sobre o qual está escrito: ‘o não-Cohen que se aproximar, morrerá’ (Números 1:51) e agora ‘raposas vagueiam por lá’ (Lamentações 5:18). Não é para chorarmos?”

Rabi Akiva replicou: “Por essa exata razão, estou sorrindo. Pois está escrito: ´Buscarei para Mim testemunhas confiáveis, Uriah, o Cohen, e Zechariahu ben Yeverechiahu´ (Isaías 8:2). Qual a ligação entre Uriah e Zechariah? Uriah profetizou na época do Primeiro Templo, enquanto Zechariah o fez durante o Segundo Templo. Por que, então, são mencionados junto?”. Rabi Akiva, então, explica: “Ao mencionar os dois profetas junto, as Escrituras tornam a profecia de Zechariah dependente da de Uriah. Na profecia deste último, está escrito: ‘Portanto, por sua causa, Tzion será arado como um campo’. Na profecia de Zechariah está escrito: ‘Os idosos e as idosas sentar-se-ão, novamente, nas ruas de Jerusalém’.

Rabi Akiva conclui, então: “Enquanto a profecia de Uriah não tinha sido realizada, eu temia que a de Zechariah tampouco o seria. Agora que a de Uriah foi realizada – e Jerusalém e o Monte de Templo estão totalmente devastados – é certo que a profecia de Zechariah – a construção do Terceiro Templo – será realizada”. Então os Sábios lhe disseram: “Akiva, tu nos confortaste. Akiva, tu nos confortaste”. 

Há dois milênios, em Tishá b’Av, caiu o segundo Templo de Jerusalém. Fomos exilados de nossa Pátria. Quatro milhões de judeus foram massacrados apenas na cidade de Bethar. A profecia de Uriah de fato se cumpriu. E agora esperamos o cumprimento da profecia de Zechariah. Há uma tradição de que Tishá b’Av é a data de nascimento do Mashiach e a data na qual ocorrerá a Redenção Messiânica. E quando isso ocorrer, o 9 de Av se transformará do dia mais triste para o mais jubiloso do nosso calendário.

Ainda não há paz em Jerusalém nem no restante do mundo, mas está prestes a vir. Todos os judeus se reunirão na Terra de Israel, o Terceiro e eterno Templo será construído e o sofrimento e a morte serão varridos da face da Terra. Mais milagroso ainda: todos os mortos retornarão à vida – todos os entes queridos que perdemos retornarão a nós.

Que seja a Vontade de D’us que esse dia ocorra muito em breve, em nossos dias – Bekarov BeYamenu MamashAmén, ken yehi ratsón.

BIbliografia:
Talmud Bavli: Tratados Berachot, Menachot, Avodá Zará, Makot
Talmud Yerushalmi: Tratado Berachot
Palestra do Rabi Dr. Schochet, Jacob Immanuel, Judaism: Discourse - Questions and answers with Immanuel Schochet - www.youtube.com
Blum, Ruthie, Trumpledor Revisited
www.israelhayom.com