Um jovem ortodoxo parte de Jerusalém para promover o judaísmo e os ensinamentos da Torá entre os turistas judeus que visitam a Índia. Cabalat Shabat e Seder de Pessach são algumas das atividades desenvolvidas.

Noite de sexta-feira. Os judeus estão reunidos, mais uma vez, para celebrar o Shabat, como manda a tradição de seus ancestrais. Este fato rotineiro na vida de qualquer família judia não chamaria a atenção de ninguém, não fosse o local onde está acontecendo: o povoado de Dharamsala, na Índia, local escolhido pelos tibetanos budistas para ser a sua capital, no exílio, desde que fugiram das perseguições na China, em 1960. Atualmente, cerca de dez mil tibetanos budistas vivem em Dharamsala, mas ninguém sabe ao certo qual o número de judeus que lá se encontram. Sabe-se, no entanto, que vieram em grande parte de Israel, da Europa e dos Estados Unidos.

Por trás deste Cabalat Shabat está Azriel Cohen, um judeu ortodoxo que inicialmente veio de Israel para tentar descobrir o que tem atraído tantos judeus - principalmente israelenses - para Dharamsala. Fundador da organização Or Olam, lá sediada, cujo objetivo é promover o encontro entre judeus de diferentes correntes, Cohen chegou à Índia depois de ter visitado o Nepal juntamente com uma missão do movimento Chabad, em 1997. Desde então, retornou várias vezes tendo sido responsável pela estruturação da comunidade judaica em Dharamsala.

Cohen nasceu em Jerusalém e sua família vive no bairro religioso de Mea Shearim. Descendente de uma geração de estudiosos do judaísmo - seu bisavô, avô, pai e irmão foram rabinos - Cohen estudou quatro anos em uma ieshivá em Jerusalém, após ter terminado o segundo grau em Toronto, Canadá. Retornou então, a esse país, instalando-se em seguida em Nova York, onde se formou em Psicologia na Yeshivah University, obtendo o mestrado em Belas Artes na Escola de Artes Visuais da cidade. Ainda em Nova York, formou um grupo de artistas judeus no qual discutia-se a relação entre arte e judaísmo.

De volta a Israel, percebeu que era um dos poucos artistas do país que jamais havia visitado a Índia. Interessado em saber o que tanto atraía as pessoas para esse país, resolveu aceitar o convite do Chabad. "Eu sempre achei que quem ia à Índia era, de certa maneira, um pouco louco. Bastaram, porém, alguns dias em Dharamsala para que eu descobrisse que a espiritualidade vigente no local era a razão pela qual os israelenses e os judeus em geral para lá se dirigiam. Não eram loucos ou visionários, mas sim pessoas com uma vida espiritual rica e, em sua maioria, identificados com a sua religião. Foi a partir desta descoberta que surgiu a idéia de organizar programas para turistas judeus na Índia".

Cohen inspirou-se também na obra Os judeus no Lótus, de Roger Kamenetz, que narra em detalhes a visita de oito líderes judeus norte-americanos, que foram a Dharamsala a convite do Dalai Lama, em 1990. Contando com o apoio de entidades judaicas dos Estados Unidos, o jovem deu início à sua jornada, atraindo adeptos ao longo do caminho.

Desde a primeira visita de Cohen ao povoado, a vida dos judeus da região modificou-se. Além dos serviços tradicionais de Cabalat Shabat, Dharamsala possui uma biblioteca com mais de 200 obras sobre judaísmo, em hebraico e em inglês, e são comemoradas todas as datas festivas do calendário judaico através de programas especialmente elaborados para turistas. No ano passado, foram organizados um Seder de Pessach e serviços religiosos de Rosh Hashaná, que incluiram o toque de shofar. "Nós sabemos, atualmente, que 80% dos visitantes ocidentais que chegam a Dharamsala são judeus e, acima de tudo, interessados em conhecer mais sobre a sua religião. O mundo das ieshivot possui um conhecimento imenso, mas as pessoas em geral não sabem como ter acesso a tais informações. Assim, o trabalho que realizamos funciona como uma ponte".

Quando Cohen não está na Índia, conta com um casal de americanos - Mark e Dara - para dar continuidade ao seu trabalho. As atividades organizadas por Cohen e sua equipe já foram incluídas no guia de viagens Let's Go. Além dos Cabalat Shabat, são ministrados cursos sobre vários temas judaicos, como o uso do tzitzit, no Khana Nirvana, um restaurante vegetariano muito popular da cidade e para o qual Cohen está tentando obter um certificado de cashrut junto a um rabino dos EUA.

Antes da criação da comunidade, Cohen encontrou-se com o Dalai Lama em Dharamsala, quando lhe pediu permissão para organizar uma comunidade judaica no povoado. Em resposta a seu pedido, ouviu a seguinte resposta: "Será uma honra. Vocês são o povo escolhido, não é verdade?".