Em 1932, foi o mais jovem deputado já eleito para a Assembléia Nacional. Em 1935 elegeu-se prefeito de Louviers. Foi também subsecretário do Tesouro do governo de Léon Blum, em 1938.

As inúmeras e extensas reportagens publicadas na França, um dia após a morte de Pierre Mendès-France, a 19 de outubro de 1982, confirmam um fato inquestionável: ele foi um homem considerado excepcional por seus contemporâneos. “Um lugar à parte na história política das três repúblicas” e “A Guerra, a prisão, a evasão, a volta ao combate Pierre Mendès-France, um personagem extraordinário” foram algumas das manchetes veiculadas.

A história deste judeu francês começou há séculos, marcada pelo anti-semitismo da Inquisição, que perseguiu um de seus antepassados, Luís de França, que então vivia em Portugal e que, por causa das posições do Santo Oficio, adotou o nome de Louis Mendés France e a religião cristã, fugindo então para Bordéus, na França, em 1684. Entretanto, o cristianismo de Louis Mendès-France não impediu que todos os seus filhos, por iniciativa própria, assumissem a sua condição de judeus. Assim, entre os anos de 1720 e 1725, o judaísmo dos Mendès-France tornou-se notório, sendo vivido abertamente em Bordéus, e passando de geração em geração.

Em 1874, na cidade de Limoges, nasceu Cerf David Mendès-France, pai de Pierre Mendès-France. Comerciante do setor têxtil no Sentier, foi a Estrasburgo a trabalho, onde conheceu Palmyre Cahn, filha de um importante comerciante local, seis anos mais jovem do que ele, com quem se casou. Cerf David não conseguiu despertar em seu filho Pierre muito interesse pela religião, mas este, estimulado pela avó materna Henriette Wolf, fez o bar-mitzvá em Estrasburgo.

No entanto, esta aparente falta de envolvimento com o judaísmo não impediu que a família ficasse profundamente chocada com o Caso Dreyfus, sob o comando de quem serviu Cerf David.

Pierre Mendès-France nasceu em 1907 em Paris, aluno brilhante destacou-se desde cedo pelas suas teorias econômicas.

Aos 16 anos filiou-se ao Partido Socialista Radical, tornando-se, em 1932, o mais jovem deputado já eleito para a Assembléia Nacional. Em 1935 elegeu-se prefeito de Louviers e em 1938 foi escolhido Subsecretário do Tesouro do governo Léon Blum.

Seus êxitos intelectuais e acadêmicos foram quase simultâneos à sua carreira política. Em 1922, aos 15 anos terminou seus estudos na escola comunitária e fez o segundo bacharelado no Lycée Louis Le Grand. Em 1923 inscreveu-se na Faculdade de Direito. Em 1924 ingressou na Escola de Ciências Políticas e criou a Liga de Ação Universitária Republicana e Socialista, LAURS, quando sentiu pela primeira vez os efeitos do anti-semitismo, combatendo-o profundamente. Aos 20 anos, defendeu sua tese sobre o governo de Poincarré, tornando-se o mais jovem Doutor em Direito na França. Em 1933 casou-se com a pintora Lily Cicurel, artista talentosa de origem egípcia que faleceu em 1967.

Dizem os estudiosos de sua personalidade que Pierre Mendès-France herdou da tradição do judaísmo francês o forte nacionalismo que marcou o início de sua carreira política e determinou o seu pensamento político e institucional. Ele aplicou este relacionamento em toda a sua atuação, combinado com um profundo desejo de justiça e com as novas teorias econômicas vindas dos Estados Unidos. Em seus dois livros publicados em 1928 e 1930, respectivamente, “L’Oeuvre Financière du Governement Poincarré” e “La Banque Internationale: Contribuition à l’Étude des Problemes des États-Unis e d’Europe”, Pierre Mendès-France criticou os privilégios econômicos de poucos e defendeu uma igualdade maior entre os países do mundo. Ao ocupar o cargo de Subsecretário do Tesouro de Blum, começou a implantar algumas idéias do pensamento Keynesiano.

Como fervoroso patriota, durante a Segunda Guerra Mundial, serviu na Força Aérea, partindo da França rumo ao norte da África. Foi preso acusado de traição em Rabat, julgado e condenado, sendo levado para a prisão de Clermont - Ferrand. Ao ouvir a sentença de seis anos de prisão, além da degradação militar, perda de seus direitos cívicos e familiares, afirmou: “Acabam de condenar um inocente por causa do ódio político”. Virando-se para o comissário de polícia gritou: “Você trabalhou muito bem por Hitler e seus avanços”.

Pierre Mendès-France conseguiu escapar da prisão em 21 de junho de 1941, reunindo-se então com a “França Livre” em Londres, em 1942. Participou de incursões contra o território francês, ganhando cada vez mais a confiança do general Charles De Gaulle, que nomeou Comissário de Finanças da Argélia.

Em 1944 é nomeado Ministro da Economia do Governo Provisório, posto ao qual renuncia em 1945, por discordar da linha adotada. Passa então a representar a França em diferentes fóruns, como por exemplo o Fundo Monetário Internacional, e a Junta de Governadores das Nações Unidas para Reconstrução e Desenvolvimento. Tornou-se também professor da Escola Nacional de Administração, L’ENA. Pierre Mendès-France foi ainda responsável pela negociação do armistício com a Indochina e de seu maior desafio um plano econômico de longo alcance com a Tunísia.

Organizou uma reforma fiscal e atacou os privilégios dos “Bouilleus de Cru” - degustadores de vinho - e dos fabricantes de bebidas alcóolicas, lançando uma campanha em favor do leite e encorajando o seu consumo nas escolas. PMF, como era chamado, angariou cada vez mais simpatia e popularidade entre a população, graças também a suas conversas radiofônicas semanais, mantendo assim um clima de confiança.

O crescimento no poder de Pierre Mendès-France assinalou o ressurgimento do anti-semitismo na França, cujos representantes oficiais eram alguns jornais e os partidos de extrema direita, além de alguns representantes dos comunistas.
Foi novamente chamado para o governo como Vice Presidente de Guy Mollet, em 1956, após a vitória da Frente Republicana, mas renunciou em maio do mesmo ano, por discordar da política adotada por De Gaulle em relação à Argélia. Entra, então, definitivamente, para a oposição, denunciando a política gaullista para a região. Mesmo após o seu afastamento, Pierre Mendès-France continuou a ser bode expiatório da imprensa de direita. Os reacionários denunciavam as posições “radicais” dos líderes políticos judeus e faziam política anti-semita disfarçada, capitalizando o descontentamento da pequena burguesia. Os dois maiores defensores de Pierre Mendès-France na imprensa foram Jean Jacques Servan-Shreiber e Georges Boris, que foram denunciados como instrumento de um brain trust para os judeus.

Visitou o Estado de Israel em 1959. Ao voltar, envolvido com o novo país, estimulou o diálogo entre os israelenses e seus vizinhos árabes, principalmente entre os anos de 1968 a 1973.

Casou-se novamente em 1971, viajando para a Ásia, onde escreveu o livro “Dialogues avec l’Asie d’aujoiurd’hui”. Um ano depois, ficou gravemente doente, retirando-se da vida pública, à qual retornou em 1976, para novamente promover o diálogo entre Israel e os palestinos. Declarou no programa “Douze heures pour Israel”: “Temos algo em comum: tornar públicos os nossos sentimentos pela sobrevivência de uma nação à qual todos os democratas são apegados. Sendo amigos de Israel, podemos criticar alguns aspectos de sua política”. Por um acaso do destino, estava em Jerusalém em 1977, quando o então presidente egípcio Anuar Sabat visitou a cidade. Durante a Guerra do Líbano em 1982, aproximou-se de Nahum Goldman, ex-presidente do Congresso Judaico Mundial, apelando por negociações de paz entre Israel e os palestinos.

A vitória de M. Miterrand, levando o Partido Socialista ao poder na França, foi saudada por Pierre Mendès-France. No dia de sua posse, o novo presidente declarou: “Se estou aqui, é graças a você. Esta vitória é a justificação para tantos anos de lutas instigados por você”. Após proferir estas palavras, Mitterand abraçou o antigo companheiro.

Apesar de doente, Pierre Mendès-France continuou lúcido e defensor da paz, até o fim de seus dias. Na última quarta-feira de outubro de 1982, cinco dias antes de sua morte, foi ao Palácio de Luxemburgo, onde foi homenageado pela sessão francesa do Congresso Judaico Mundial por sua atuação em favor da paz.


Bibliografia

Richard Ayoun e Haim Vidal Séphiha, Séfarades d’hier e d ‘aujourd’hui, Liana Levi, 1992
The Blackwell Companhion to Jewish Culture, editado por Glenda Abramson